Morte aos “cravas”!

(Eu peço imensa desculpa pelo título agressivo que escolhi para esta crónica, mas trata-se da minha mais sincera opinião: os “cravas” deviam ser todos erradicados deste mundo.)

As pessoas, habitualmente, queixam-se da existência de certas pragas que surgem na nossa sociedade, mas nunca dão realmente importância àquele tipo de pragas que deviam, de facto, desaparecer deste planeta. Por exemplo: os arrumadores de carros são, efetivamente, uma praga. Uma pessoa sabe estacionar o carro e não precisa da ajuda de um tipo com a barba por fazer, cabelo seboso, os braços todos picados – não por causa das melgas, obviamente – e segurando a Dica da Semana enrolada numa mão, para o fazer. Mas as pessoas começaram lentamente a perder a paciência com os arrumadores de carros, e acabaram por permitir a sua entrada na sociedade em que todos vivemos – acabando por lhes dar uma moedinha mesmo que não se tenha usufruído da sua perícia em manobras dentro de um parque de estacionamento público.

Mas existe uma outra praga que, lamento, mas desperta-me um ódio interior tal, que não consigo parar de pensar em mil e uma maneiras de a erradicar deste planeta. Falo, obviamente, dos “cravas”!

“Mas, Ricardito, diz-nos: o que são ‘cravas’?”, perguntam os meus caros amigos.

Meus queridos, os “cravas “ estão espalhados e tão enraizados na nossa sociedade, que podemos estar sob o efeito do seu poder, sem sequer nos apercebemos de tal facto.

Quantos de nós não temos amigos que, volta e meia, nos pedem algo sem dar nada em troca? Todos, certo? Quantas vezes é que um amigo nosso chega à nossa beira e profere, com o ar mais natural do mundo, as seguintes palavras: “Olha lá, tens aí uma pastilha que me arranjes?”

E nós, com o ar mais pacato do mundo, simplesmente damos a pastilha…

E, no dia seguinte, o mesmo amigo volta a aproximar-se e volta a pedir uma pastilha. E nós damos. E no dia a seguir novamente a mesma coisa. E no dia a seguir, e no outro, e no outro, até se criar uma espécie de rotina diária. E, depois, quando num desses dias nós não temos pastilhas para partilhar, esse amigo fica amuado connosco. Como se, o acto de lhe dar uma pastilha todos os dias, tivesse passado a ser uma obrigação nossa. E se não temos, estamos a falhar com o nosso compromisso.

Quem diz pastilhas, diz cigarros. O “crava” começa por, inocentemente, pedir um cigarro porque ficou sem tabaco e não teve tempo para ir comprar. Nós damos o cigarro. No dia a seguir, ele volta a cravar mais um cigarro, usando uma nova desculpa. E nos dias seguintes passa-se a mesma coisa, até se tornar numa espécie de rotina mensal. E quando finalmente chega o dia em que somos nós que não temos tabaco e lhe pedimos um cigarro, ele manda-nos ir bugiar porque não tem tabaco.

E quem fala em pastilhas e tabaco, fala igualmente dos “trocos” para o café. E quem fala dos trocos para o café, fala obviamente do açúcar, sal, ou outras especiarias quaisquer – e no caso do açúcar, sal ou outras especiarias quaisquer, refiro-me ao “universo” da vizinhança. Torna-se de tal forma numa rotina mensal, que no princípio de cada mês os vizinhos “cravas” adoptam a seguinte posição:

— Filho, temos de ir às compras.
— Que compras, Maria?
— Precisamos de Sal.
— Ah, isso pedes ao vizinho. Ele não vai dizer-te que não…
— Oh, mas não é só o sal…
— Então? O que é mais?!
— É o açúcar. Precisamos de comprar açúcar…
— Ah, isso o vizinho também tem. Pedes a ele… Tenho a certeza que ele não vai dizer-te que não…
— Oh, mas também precisamos de um raminho de salsa, filho…
— Ah, isso também pedes ao…
— Vizinho! Pois, já sei, já sei…

A pratica da “cravisse” anda tão em voga, que qualquer dia o facto de o “cravas” pedir-nos a mulher emprestada para uma noite de forrobodó, irá parecer a coisa mais natural do mundo…

Os “cravas”? Esses era matá-los a todos!

Ai, ai… Isto é que é uma “Vida de Cão”, hem…