Movidos pela Fé: Fátima um caminho desde 1917

As peregrinações fazem parte da experiência humana de todos os povos e religiões, ainda hoje, por exemplo os muçulmanos se dirigem a Meca. Por todo o mundo existem lugares sagrados, lugares de culto em que o ser humano, doravante denominado peregrino, se desloca movido pela Fé a esse mesmo local.

As peregrinações cristãs têm a sua fonte de inspiração no Antigo Testamento, mencionadas sobretudo na história de Abraão e na libertação do povo de Israel do Egipto, iniciam-se entre os séculos III a IV e primariamente os povos dirigiam-se para a Palestina, com vista a visitarem a Terra Santa e os locais da vida terrena de Jesus. Em seguida, as peregrinações começaram a ser também a túmulos dos que tinham sido testemunhas de Jesus, como as romarias a Roma, aos túmulos dos Apóstolos Pedro e Paulo, a Santiago de Compostela ao túmulo de S. Tiago e ainda ao santuário de S. Miguel em Itália, entre outros.

Em portugal, as peregrinações ao santuário Mariano de Nossa Senhora de Fátima, remontam ao ano de 1917, crê-se que as romarias a este local se iniciaram logo após as aparições, por milhares de devotos de todas as classes sociais, pois contam os livros que os peregrinos deslocavam-se a pé, mas os que eram mais abastados iam de carroça a cavalo ou de burro. No local da Cova da Iria, três crianças apascentavam um rebanho quando a 13 de Maio de 1917, após terem visto um forte clarão que julgavam ser um relâmpago, decidiram ir embora, quando lhes apareceu uma imagem de senhora vestida de branco que lhes pediu que rezassem muito e convidou-os a voltar nos cinco meses seguintes. Com excepção do mês de Agosto em que as crianças foram presas e submetidas a um interrogatório, a mesma imagem apareceu apenas a 19 de Agosto na localidade de Valinhos e pediu-lhes que continuassem a dirigir-se para a Cova da Iria a cada dia 13 dos meses seguintes até Outubro, onde iria acontecer um milagre para que todos acreditassem neles. Em Outubro de 1917, o Jornal o Século descreve o seguinte :

“Vê-se toda a imensa multidão voltar-se para o sol, que se mostra liberto de nuvens, no zenit. O astro lembra uma placa de prata fosca e é possível fitar-lhe o disco sem o mínimo esforço. Não queima, não cega. Dir-se-ia estar-se realizando um eclipse. Mas eis que um alarido colossal se levanta, e aos espectadores que se encontram mais perto se ouve gritar: – Milagre, milagre! Maravilha, maravilha! (…)”

Em torno da mensagem e dos mistérios de Fátima, desde então e até aos dias que correm são milhares os que se dirigem a este local em Peregrinação, após ler uma crónica que se intitula “Fátima: a enganar pessoas desde 1917” in DN, questionei-me, Será que estes milagres sempre foram consensuais mesmo dentro da igreja? O que será que leva milhares de pessoas de todo o mundo a deslocarem-se a este local? Seremos então todos (os crentes) desprovidos de racionalidade?

A verdade é que mesmo dentro da igreja católica as opiniões relativamente a Fátima divergem e nem sempre foram as mais consensuais, sobretudo quando se fala do negócio que se foi instalando ali à volta , em torno da Fé de cada um. Mas será isso que importa a quem lá se desloca? As razões pelas quais as pessoas se deslocam a um santuário Mariano na maioria das vezes são para solicitar a intercessão de Nossa Senhora numa determinada ocasião das suas vidas, por outro lado podem ser também peregrinações em acção de graças, em que o peregrino apenas agradece a sua vida, no entanto também sei de casos em que as pessoas se deslocam apenas para se libertarem da sua vida mundana, stressante, consumista e procuram sobretudo a Paz. As peregrinações a Fátima não são excepção, as pessoas deslocam-se em peregrinação a este local pelas mais diversas razões, mas julgo que raras são as que se deslocam pelas mensagens e milagres que outrora aconteceram. Em conversa com uma peregrina de nacionalidade inglesa que comigo caminhou até ao altar do mundo, constatei que a mesma desconhecia a mensagem e os mistérios de Fátima, sabia vagamente o que tinha acontecido mas não tinha a certeza do que eram esses mistérios, sendo que o que a levava lá há dois anos eram as suas intenções e devoção a Nossa Senhora, mas sobretudo a Paz e a leveza que sentia ao peregrinar. De facto, ao entrar naquele local sente-se uma Paz indescritível e a libertação durante o caminho que percorremos é fenomenal. Mas não precisamos de estar naquele local para sentir a Paz que vem de Deus. Agora convido todos, de todas as religiões, agnósticos e ateus a realizarem uma visita a este local ou a outro Santuário, onde por detrás do mesmo existe uma história de devoção, a sentir a presença de Deus, a sentir a Paz que os envolve, a sentir que Deus não é, como diz na crónica:

“(…)um deus que ralha e castiga e exige.”

É verdade que ao longo da nossa história, sempre fomos ouvindo: “Olha que Deus castiga”, mas esta ideia de Deus é mal concebida ainda nos dias de hoje até por alguns Cristãos, Deus não é nada disto, Deus é Pai e como todos os Pais educa, dá-nos liberdade de escolha e as nossas escolhas levam-nos às nossas alegrias, tristezas e sofrimentos. Pode ler-se posteriormente :

“Virei pedir a consagração da Rússia. (…) (porque não contra o fascismo ou o nazismo ou os padres que abusaram de crianças na Irlanda?)”

Continua a tocar-se nos podres da Igreja, mas será que existem apenas podres dentro desta, ou será que a sociedade é feita destes e muitos outros podres? Antes de sermos o que quer que seja dentro da Igreja, somos seres humanos e deste modo, fazemos parte de uma sociedade que está cheia de pecados, de vícios, de corrupção, de pedofilia, negócios em volta da Fé de cada um seja Cristã ou outra qualquer, não devemos é generalizar o podre de cada um para a totalidade dos seres humanos e deste modo extrapolar tudo isto para a Fé Cristã. Fátima não será excepção, nem todos estão de acordo com toda a envolvência de negócio e de outras situações que ao longo dos anos ali se vão acumulando, mas não é isso que leva milhares de peregrinos até lá. Devemos também, pensar e tentar perceber que nem tudo é mau quando pensamos no que envolve todo aquele sitio, de certa forma foi contributivo para o desenvolvimento local e pessoal daquela altura e ainda dos dias de hoje. É óbvio que se cometem excessos, é óbvio que não somos modelo, o único que foi, deverá e será sempre um modelo é Jesus Cristo.

Relembro que no passado dia 13 de Maio, podia ver-se um mar de luz junto à capelinha das aparições e volto a questionar, “Seremos então todos desprovidos de racionalidade?”, por último nesta crónica pode ler-se:

“Perante tudo isto, os fiéis de Fátima dirão, tal e qual os crentes em thethans, “é o mistério da fé. Não se questiona a fé”, como se fossem crianças, que pastavam o gado, na Cova da Iria, em 1917.”

Não se questiona a Fé? Como seres racionais que somos é óbvio que questionamos.  A maioria dos que são crentes muitas vezes questionam a fé, será que existe mesmo? Meu Deus se existes porque não te manifestas? Estas e outras questões fazem parte do dia dos crentes e agora perguntam os que não acreditam: “Então mas se existem dúvidas, porque continuais a acreditar?” , porque de alguma forma encontramos o que procuramos, as intercessões, as graças, a Paz, o Amor, a libertação, seja o que for e no local onde for porque Deus está sempre presente e ama-nos da maneira como somos. Afirmo ainda, que muitos crentes tentam perceber aquilo que envolve e move tantos outros em outras crenças e religiões, o que importa é que um dia todos nós consigamos viver em unidade e respeito mutuo, o que é tantas vezes ainda difícil de encontrar. Apesar de terem passado vinte e um séculos depois de Cristo, continuamos num mundo, que na minha opinião, é dominado pela indiferença e hostilidade a Deus.

Por último, defendo que a relação que temos com Deus não deverá ser uma relação pagã, em que apenas nos lembramos de pedir e prometer alguma coisa quando tememos o pior, a minha opinião pessoal é que quando assim o é então não somos crentes mas sim tementes. Esta relação deve ser uma relação de respeito, de amor, de amizade, em que nos lembramos de rezar diariamente por todas as razões, sejam elas boas ou más.

Fica o meu desejo de um dia viver num mundo onde todos tenhamos opiniões diferentes mas nos encontremos de alguma forma no amor e no respeito.