Não gostar de futebol, não faz de ti intelectual

Vejo muito boa gente utilizar o futebol para enaltecer implicitamente a sua superioridade intelectual, e por conseguinte, menorizando aqueles que o adoram. Pois bem, este artigo é para esse intelectual, o mesmo que habita nessas mentes “superiores”.

O futebol não é barómetro de intelectualidade, o futebol é apenas um desporto, que para uns será uma paixão, para outros um hobby, e para alguns, a própria vida. E nenhum deles é menos intelectual por viver esta paixão. O contrário também é verdade, não existe qualquer razão para criticar quem não a tem.

Como se diz, gostos não se discutem. Ok, a expressão é muito geral, claro que gostos se discutem, mas dar o poder a um deles para decidir a capacidade intelectual de quem o possui ou não, será uma demonstração, essa sim, de inferioridade intelectual.

Mas o síndrome existe, a arrogância também, talvez se achem especiais por serem menos, talvez por existir um largo espectro de pessoas de todas as classes, com predominância nas menos favorecidas, que partilham a mesma paixão, ou até talvez, por não a compreenderem, por não perceberem o que é uma saudável loucura, uma alegria despropositada ou uma tristeza inusitada. E tudo isto, leva-os a ostentar a sua condição de não adepto como motivo do maior dos orgulhos.

Os argumentos são vários, a violência, embora ela esteja em todo o lado, os exageros, embora em todo o lado eles estejam, a estupidez, embora em lado nenhum ela esteja ausente. Tudo serve para atacarem o futebol, na verdade, tudo serve para enaltecerem o intelectual que tentam encontrar quando se olham ao espelho.

Pois é, tenho novidades, se precisam do futebol para verem esse intelectual… então ele não existe.

Porque o futebol não é culpado da nossa inércia, das injustiças com que somos confrontados diariamente, nem tão pouco, da tão famosa e eterna crise. Mais, futebol não é sinónimo de ignorância, isso é tão rebuscado como confundir a “estrada da Beira” com a “beira da estrada”.

Se querem saber, futebol é vida. Sim, vida, melhor, uma verdadeira definição do ser-humano. Nele encontramos o mesmo paradoxo em que a maior complexidade coabita na mais plena simplicidade. Um bocado exagerado, afinal, é só um jogo… será?

Se o definirmos como um conjunto de 11 jogadores de cada lado com o objectivo de colocar um objecto esférico numa área de 7,32 por 2,44 metros, tolhidos por um conjunto de regras, sim, será só um jogo. Tal como podemos definir o ser-humano dessa forma simplista, como indivíduos de altura variável entre 1 e 2 metros com o objectivo de colocar energia em forma de alimento nas suas bocas para sobreviverem, tolhidos por um conjunto de regras.

Uma definição demasiado simplista do ser-humano, não é verdade? Concordo, tal como, do futebol.

Isto, porque podemos encontrar nele a mesma complexidade que encontramos no ser-humano. O paradoxo do adepto que conta com a desumanização do avançado em frente à baliza para exponenciar a sua humanidade em festejos exacerbados, a contraditória visão do defesa destruidor e do dez criador, no fundo, a tristeza duns, a alegria dos outros, tudo isto é futebol, tudo isto é humanidade.

Não, não estou a tentar convencer ninguém. Cada um gosta, melhor, apaixona-se por aquilo que se adequa melhor à sua personalidade, ao seu gosto pessoal, resumindo, àquilo que lhe der “na telha”. Apenas aponto que existe muito mais no futebol do que 22 jogadores atrás duma bola, dependendo das perspectivas.

Enfim, as paixões não diminuem o homem, elas são parte constituinte do ser-humano, e o futebol é apenas mais uma, nada corrosiva ao intelectual, que o continuará a ser vivendo ou não esta paixão, tal como o ignorante não o deixará de ser por detestar o jogo.

Repetindo-me para rematar: meu caro, se precisas do futebol para afirmares o intelectual que pensas existir em ti, então, atira-te aos livros, bem precisas!!!!