O Nos Alive 2015, regressou mais uma vez ao Passeio Marítimo de Algés, para aquela que foi a nona edição. Decorreu no dias 9, 10 e 11 de Julho e contou com alguns nomes muito conhecidos do grande público tais como Muse, The Prodigy, Mumford & Sons e Sam Smith, no entanto como vem sendo habitual não são descurados alguns nomes consagrados e emergentes da música alternativa dos quais destaco Future Islands, Metronomy, The Wombats, Django Django, Alt-J, James Blake, Bleachers, The Jesus & Mary Chain e Mogway. Realizando-se em Portugal e assumindo-se como o maior festival urbano do nosso país, as bandas portuguesas não são esquecidas, pude assim assistir a concertos de Dead Combo, Les Crazy Coconuts, Blasted Mechanism e X-Wife, entre outros.
De todos os concertos que assisti, elaborei uma lista com os que mais se destacaram e se assumiram como os melhores concertos do Nos Alive 2015. Como é sabido, a minha tendência natural prende-se com a música alternativa, o que não me impede contudo de saber avaliar um grande concerto por si só mesmo que não se enquadre no meu género musical predilecto, assim o destaque vai para as seguintes actuações, sem qualquer ordem específica:
Muse – 9 de Julho: aproximadamente 5 minutos após a hora marcada subiam ao palco os tão aguardados Muse, e a abrir o single do último disco Drones, “Psycho” e logo ali mostraram ao que vinham: rock épico e o regresso às origens após alguns devaneios de aproximação à electrónica. Os Muse são uma máquina bem oleada, continuam a ter a alegria e a vontade de estarem juntos em palco e isso nota-se do primeiro ao último acorde. São sem sombra de dúvidas uma das melhores bandas ao vivo do mundo e no Passeio Marítimo de Algés voltaram a demonstrá-lo. Muito mais que um concerto é um espectáculo visualmente impressionante, apesar disso não se esquecem do que é importante, a música, e nisso são excelentes executantes, o que fica bem patente nos inúmeros solos instrumentais. A voz de Matt é impressionante ao vivo, parece que estamos a ouvir um disco no conforto do lar. Entre bolas gigantes e chuvas de serpentinas, passaram pelos grandes êxitos, e defenderam com mestria o mais recente disco. Houve tempo até para uma versão mais lamechas de “Madness”, tema que admito não nutrir especial apreço. “Time Is Running Out”, “Starlight”, “Plug In Baby”, não faltaram, e do novo disco destacamos a brilhante “Reapers” que ao vivo assume contornos de hard rock. Finalizaram com “Mercy”, mas voltaram para um encore revivalista ao som de “Uprising” e despediram-se novamente com o hino “Knights of Cydonia”. Admitem regressar em 2016 para um concerto em nome próprio, desde que voltem assim, são sempre bem-vindos.
Bleachers – 10 de Julho: uma estreia no nosso país e que estreia… Poucos poderia imaginar que antes das 20 horas já teria iniciado um dos melhores concertos do dia se não mesmo o melhor. Os Bleachers são americanos e praticam um indie pop descomprometido, mas que ao vivo assumiu contornos memoráveis. A comunhão foi perfeita: a banda, o público e o ambiente. A banda foi explosiva, descontrolando-se inúmeras vezes numa alienação que foi conquistando aos poucos cada membro do público ali presente. Com apenas um disco editado, Strange Desire, que apesar de ser bom não é brilhante, nada disso importou para Jack Antonoff e companhia que conseguiram elevar a mais simples das músicas a um patamar quase épico. Para isso toda a banda contribuiu em igual medida desde um baterista energético, a um baixista louco, passando por um saxofonista com uns pulmões que não devem ser humanos e terminando no vocalista que se transformou num autêntico animal de palco. Relembro que, para os mais atentos, o vocalista Jack Antonoff tem uma cara familiar, talvez por ser o guitarrista dos Fun.
O seu debut foi revisitado com mestria e não se esqueceram de “Like a River Runs”, “Rollercoaster”, “Shadow” e a orelhuda “I Wanna Get Better” e ainda tiveram tempo para relembrar os Fleetwood Mac com “Go Your Own Way”. O momento alto: todo o concerto. A banda estava a ter tamanha recepção e fez por merecer todo o carinho transmitido pelo público, conquistaram os fãs e deixaram os que desconheciam a sua música, absolutamente rendidos. Repetiram vezes sem conta que este foi o melhor concerto de toda a tour e sem dúvida o melhor público, e se normalmente desconfio de tal afirmação, aqui não tenho a menor das dúvidas. Para os presentes fica a sensação que estiveram perante um daqueles momentos raros de perfeita sintonia entre banda e público que resulta em algo mágico. Voltem depressa, após este concerto inesquecível!
Future Islands – 10 de Julho: MAGNÍFIC! Um dos concertos mais aguardados da noite, o regresso da banda americana de rock alternativo/synthpop, que apesar de existirem quase há 10 anos, passaram do anonimato para o sucesso planetário graças ao último e extraordinário disco “Singles” editado pela prestigiada 4AD. Há ainda um momento marcante na carreira dos Future Islands, e que contribuiu para atingirem o grande público: uma actuação memorável, e a habitual irreverência, do vocalista em directo na televisão americana no programa de David Letterman. O palco Heineken registou mais uma enchente e desta vez foram atacados pelo carismático vocalista, autêntico bombardeiro, Samuel Herring. É impossível falar dos Future Islands sem destacar o seu frontman, ele é explosivo, excêntrico, incendiário, provocatório, teatral e além disso ainda canta e dança como se a sua vida dependesse disso. O público foi levado ao rubro e o concerto foi um dos melhores do dia, mas isso já seria de esperar, pelo menos para quem conhecia a banda (e os que desconheciam de certeza não voltarão a esquecer o nome de Future Islands). Os momentos altos foram “The Chase” e como é óbvio “Seasons (Wainting on You)”, uma das melhores músicas dos últimos anos. Fiquei com vontade de vê-los novamente, e a avaliar pela reacção que tiveram (e pelo facto de acreditar que o palco Heineken deve ter ficado abalado nas suas estruturas), o regresso não há-de tardar.
James Blake – 10 de Julho: terceiro grande concerto do dia, o músico, compositor e produtor inglês regressou ao passeio marítimo de Algés e voltou a ser brilhante, conseguiu silenciar o ruído que à distância advinha do concerto dos The Prodigy. Plateia numerosa, entusiasmada e silenciosa quando necessário, ouviram, sonharam e ficaram com a alma cheia, com a electrónica misturada com a soul da sua belíssima voz. Ao vivo James Blake é calmo, tranquilo, mas de uma intensidade indescritível, há algo de mágico e belo na sua música. Usou e abusou com mestria dos loops e dominou na perfeição a electrónica mais experimental, fez-se acompanhar por dois músicos não menos brilhantes (na bateria Ben Assiter e nos sintetizadores o produtor e DJ Rob McAndrews, conhecido como Airhead). Dois discos memoráveis, são o seu repertório e revistou-os com a sua genialidade, “Limit To Your Love” (cover de Feist), “Overgrown”, “Retrogade”, “Voyeur” e “The Wilhelm Scream”, foram recebidas com o entusiasmo e a excitação que James Blake merece. Foi lindo, e etéreo. Aproveito só para fazer um apelo: quero urgentemente assistir a um concerto de James Blake em nome próprio numa sala fechada!
Dead Combo – 11 de Julho: muito bom este concerto. Bem se calhar muito bom é pouco. Excelente se calhar não é suficiente. Terá sido o melhor do dia? Sem dúvida, mas mesmo assim não acho suficiente para descrever o quão magnífica e genial foi esta apresentação dos portugueses Dead Combo. Tó Trips e Pedro Gonçalves apresentaram-se num formato mais rock que o habitual e para isso contaram com a colaboração do músico Isaac Achega e Sérgio Nascimento (bateria). Pedro Gonçalves desta vez não se limitou à sua guitarra e ainda navegou por diversos instrumentos: contrabaixo, piano, percussão e escaleta, mas é na guitarra que ele se transforma e em conjunto com Tó Trips levam o público à loucura e ao êxtase. Ao vivo nunca desiludem, já os tinha visto em duas ocasiões anteriores e parece que cada vez são mais intensos, viajaram pelo rock, pelo fado, pelo jazz, pelos blues e pelos clássicos westerns americanos, não se esqueceram de “Povo que Vais Descalço”, incendiaram o palco Heineken com “A Bunch of Meninos” e despediram-se, com uma dedicatória à Grécia, com a sua bandeira sob pano de fundo. O público venerou-os no seu “altar” e elevou-os à categoria de “deuses”, com certeza converteram mais alguns infiéis à religião Dead Combo.
Sam Smith – 11 de Julho: após a cirurgia a que foi submetido às cordas vocais Sam Smith regressou ao passeio marítimo de Algés e receava pela qualidade vocal. Há certos fenómenos que não precisam de fazer muito para terem direito a uma recepção entusiasmada e por vezes histérica (como foi o caso dos Kodaline, dia 11 de Julho) percebi que há fenómenos musicais que têm uma claro justificação e razão de ser. Samuel Frederick Smith de apenas 23 anos, entrou em palco, visivelmente mais magro, e cedo fez questão de relembrar que no ano transacto tinha actuado no palco Heineken perante uma multidão, (também lá estive) e reconheceu ainda o nervosismo que sentiu antes de entrar em palco nesse dia 11 de Julho de 2014. Desta vez teve direito a palco principal, uma multidão muito mais numerosa e justificou plenamente a promoção. Em palco apresentou-se com uma banda competente e três backing vocalists, cantou e encantou com as canções do seu único álbum “In the Lonely Hour”, de onde não faltaram os êxitos “Like I Can”, “Money on My Mind”, “I’m Not the Only One” e “Lay Me Down”. Apesar de ser um disco deprimente, como o próprio assumiu, Sam Smith mostrou-se simpático, apesar de algo tímido, comunicativo, e visivelmente emocionado quando cantou “I’ve Told You Now”. Ainda teve tempo para revistar duas versões de Amy Winehouse “Tear Dry On Their Own” e de Elvis Presley “I Can’t Help Falling In Love With You”, não se esqueceu de “Latch”, canção dos Disclosure que tornou a sua voz mundialmente conhecida e terminou ao som do seu mega-êxito “Stay With Me”. A sua voz é impressionante, não falha nem por um segundo, recheada de soul, agudos perfeitos, usa e abusa dos falsetes e passa com distinção e nota máxima. Apesar de não ser o maior apreciador da sua música é impossível não reconhecer que o êxito que tem, é de todo merecido e justificado. Caso alguns cépticos tivessem dúvidas, Sam Smith dissipou-as todas. Refiro ainda que além de todas as qualidades que apresenta, nota-se uma enorme humildade, o espectáculo é seu e o público está lá unicamente para o ouvir, mas não se inibe a passar esporadicamente para segundo plano para deixar a sua banda e fundamentalmente os seus cantores de suporte (duas mulheres e um homem) brilharem e demonstrarem as suas poderosas vozes. Acredito que voltará em breve para um concerto em nome próprio.
The Jesus & Mary Chain – 11 de Julho: apesar de serem cabeças de cartaz em alguns dos festivais europeus, no Nos Alive tiveram apenas direito ao palco secundário, no entanto não se fizeram rogados e provaram que se mantêm em excelente forma. Este concerto era comemorativo e marcava o trigésimo aniversário da edição do extraordinário disco de estreia “Psychocandy”. Sem direito a ecrãs gigantes ligados, possível exigência da banda, os The Jesus and Mary Chain, mostraram o seu rock alternativo que influenciou gerações, e deram um concerto arrebatador, com a sua sonoridade a remeter-nos para os anos 80 e 90, e que saudades tenho desses tempos, em que se fazia música sem recurso a artefactos, fogo de artifício, confetis, e afins. Eles valem pela música que fazem e nisso são dos melhores, excelentes executantes, sem serem expansivos ou muito comunicativos, mas também ninguém esperava isso deles, esperavam rock puro e duro com um toque de punk e muito revivalismo e foi isso mesmo a que tiveram direito. Começaram o concerto com a incrível “Just Like Honey” primeira faixa do disco e terminaram com a última canção de Psychocandy, “It’s So Hard”, quatorze canções sem mácula. Mas para surpresa não ficaram por aí e ofereceram, três prendas aos fãs “Head On” de “Automatic”, “Some Candy Talking” extraída do EP homónimo e “Reverence” de “Honey’s Dead”.
Nesta edição do Nos Alive 2015 pude assistir a alguns belos concertos, mas notou-se claramente que este foi um dos anos em que o festival apresentou o cartaz mais heterogéneo, o que permitiu a junção num só espaço de amantes de música de diversos sectores. Se isso é bom? Deixo que cada um decida por si, eu tenho a minha opinião bem formada. Termino com um desabafo: os festivais de música estão-se a tornar festivais de muita coisa mas cada vez menos festivais de música, felizmente não são todos.
Até ao próximo mês, até lá não se esqueçam de ouvir boa música…
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