É fácil acusar os Zés, os Paulos e todos os Manéis da política de serem os pais da corrupção nacional. Mas na verdade, é exactamente o contrário, eles são apenas filhos, filhos da nossa sociedade, no fundo, filhos de todos nós. E nós somos corruptos.
Claro que isto é uma revelação de complicada assimilação, como pode a Maria, o Manel, neste caso, o Pedro ser culpado do que esta quadrilha anda a fazer?
Pensando bem, diretamente, nada. Pensando melhor, indiretamente, tudo.
Vamos ao significado da palavra corrupção – promete-vos que isto tem uma lógica argumentativa com consequente conclusão -, aposto que muitos de vocês falam nela sem nunca terem ido ver o real significado da mesma. Eu admito que o fiz.
Corrupção: é o efeito ou acto de corromper alguém ou algo, com a finalidade de obter vantagens em relação aos outros por meios considerados ilegais ou ilícitos.
Então vamos lá fazer um teste de paternidade sobre a corrupção a nós mesmos.
Faço-vos duas simples questões: Nunca meteram ou pediram uma “cunha” por vocês ou por alguém? Nunca pediram um favor para contornar o sistema?
Pensem bem, lembrem-se daquela “cunhazita” para assegurarem um trabalho para o vosso filho, fosse ou não ele o candidato em melhores condições. Ou aquela vez em que precisaram de cuidados de saúde, e quase como um reflexo, telefonaram de imediato para o vosso médico da família – atenção, médico DA família, não médico DE família, que isso é uma espécie em vias de extinção por estes dias – para ele se assegurar que vocês ou a vossa família seriam atendidos mais depressa e pelo melhor médico disponível.
Pois é, tudo isto é aceite com normalidade na nossa sociedade, quase que se tornou numa rotina óbvia e permanente no nosso dia a dia. E a aceitação destes nepotismos caseiros e amigáveis, destes favores porreiros, não são mais que o teste positivo à nossa paternidade sobre a corrupção.
Sim, corrupção, porque se formos analisar estes pequenos fenómenos tão enraizados na nossa cultura à lupa, veremos que isto é mesmo corrupção.
Senão vejamos, na cunha, existe um acto que corrompe o facilitador, este agirá em favor de alguém, nós ou por quem estamos a pedir, que garantirá uma vantagem em relação aos outros, um emprego ou melhor e mais rápido atendimento público em detrimento de outrém, que respetivamente, ficará no desemprego, quando era o candidato mais capaz, ou à espera de melhor atendimento, quando era a sua vez. E tudo isto, envolto na mais completa ilegalidade.
Esta é a nossa sociedade, perdão, estes somos nós, nós, que nos queixamos dos “jobs for the boys”, nós, que nos queixamos do tráfico de influências que mais não é do que pedir favores ao amigo ou familiar, nós, que nos queixamos que os políticos corrompem o sistema e o fazemos de forma instintiva.
Aí está, o nosso instinto é este, não é o instinto do político, os políticos não são uma ilha separada da sociedade, eles são produto da mesma, produto da pequena corrupção. Serão, por ventura, a face mais visível da nossa personalidade pela magnitude que as suas acções atingem.
Quando nos queixamos da corrupção no sistema político, não estamos a fazer mais que olhar-nos ao espelho a detestarmos o nosso próprio reflexo!!!
Gostei particularmente da forma como terminas, sintetizando muitíssimo bem este fenómeno instiucionalizado! E, claro, escreves muito bem, mas isso já sabes 🙂 HUgs
Gostei …
Muito bom…
…eu fui corruptor, mas prezo-me de nunca ter sido corrompido!!!
Muito interessante! Como diria Jesus Cristo: antes de apontares o cisco no olho do próximo repara na trave que tens no teu próprio olho…