Notas para uma apologia da bestialidade

Que se dane a civilização moderna, a civilização pós moderna, ultra moderna, ou um não sei o quê de moderna, se os seus ideais não passam de um arrepipe celibatário da alma murcha que a governa.

Que se dane a civilização do primeiro mundo.

O primeiro mundo é o último mundo onde eu quero viver.

O primeiro mundo é um mundo sem consciência histórica.

O primeiro mundo é um mundo de beatos e beatas,

E por isso o primeiro mundo nem sequer chega a ser um mundo;

Mas é, isso sim, um lugarejo funesto.

Com que então consideram ser civilizado proibir a zoofilia?

Depois de séculos e séculos de ruminação o melhor que se lembraram foi proibir a prática da sexualização entre humanos e animais de outra espécie?

Pois bem, pergunto-vos eu: não vos considerais vós os dignos herdeiros culturais da Grécia Antiga? E desconheceis, por acaso, que Zeus, tantas e tantas vezes, assumindo a forma de distintos animais, se apossou e desflorou incontáveis virgens? Ah mas Zeus era um deus, e por isso Zeus podia.

Mais: no vosso calendário, dizei-me, os dias, as semanas, os messes, os anos e os séculos como se contam? Isto é: não dizeis vós que viveis no século XXI depois d’Ele. Desconheceis por acaso que esse Ele, que assim nomeais, Ele, que assim homenageais, Ele, que vos redimiu de todos os pecados mundo, pergunto-vos, não sabeis vós que Ele é fruto da relação zoófila entre uma mulher e uma pomba? Que o Vaticano, verdadeiro primeiro mundo, condene a zoofilia, tudo bem; mas não me culpem a mim pela hipocrisia.

Confesso: não sou um seguidor de Zeus.

Tampouco sou um seguidor d’Ele.

Mas é bom de ver que grandes momentos histórico-civilizacionais estiveram associados à prática de actos bestiais, isto é, zoófilos.

No entanto, esqueçamos a História, pois não me parece justo exigir de vós uma capacidade que talvez não tenhais.

Concentremo-nos somente no presente. Naquilo que nos é mais próximo: o nosso apetite sexual. E então dizei-me: quem de vós, no mais íntimo dos vossos desejos, não sonhou, fantasiou, ou desejou sexualizar com uma porquita, ou com uma vaquita,  com uma cabra tetuda, um macho, uma mula, and so on, and so on? Ah, não tendes de responder.

Pois eu digo-vos.

Há dias em que nenhuma moderna e civilizada senhorita, ou senhorito, consolaria a minha líbido. Há dias em que o único verdadeiro prazer que retiro da vida consiste em, ao caminhar pela rua, dar-se o feliz caso de eu tropeçar numa gata, numa gata linda de morrer, numa gata que se deixa livremente apanhar para eu a levar para casa, numa gata que eu deito na minha cama, ou que me deita na minha cama, e que repentinamente se mostra assanhada e se transforma, assim num repente, numa cabra maravilhosa, numa cabra que livremente me oferece as suas tetas para eu matar a minha sede de sexualização, numa cabra que ao rolar o seu corpo sobre o meu corpo grunhe entusiasticamente para mim, e por isso já não é uma cabra, mas é, isso sim, uma porquita, uma reca que me oferece os seus presuntos enquanto eu a vou enchouriçando, e a mula grunhe, zurra, ronca, até que os nossos corpos cansados devolvem a paz ao nosso espírito. Sim, porque as bestas também têm espírito. Na verdade talvez só as bestas tenham verdadeiramente espírito.

Sim, há dias.

Há dias em que vejo homens esperar no altar por verdadeiras vacas.

Há dias em que vejo respeitosas donzelas perseguirem com cio verdadeiros camelos.

Há dias em que o senhor António se perde horas a fio a apreciar as mulas que passam.

Há dias em que a única humanidade está em passar os dias assim:

Bestialmente satisfeito.

Por isso não me venham agora dizer que é coisa feia a bestialidade.

Pois a bestialidade é a grande festa do corpo.

E de bom grado eu troco o primeiro mundo, que não durará uma geração talvez, pelo mundo clássico. De bom grado eu troco a humanidade bacoca e rançosa, pela humanidade bestial.

A bestialidade é a grande medicina do espírito.

É a única estrada para o grande Futuro.

E o grande Futuro é como o grande Passado: assim mesmo, simplesmente, absolutamente, absurdamente… Bestial.

E tu que me leste, mas não me leste, porque afinal não enxergas senão aquilo que as tuas palas te deixam enxergar, poupa-me ao menos o fastio de ter de te ouvir dizer que eu sou é uma grande Besta.

Por ora, lembra-te apenas que na minha cama há sempre espaço para mais uma Espécie qualquer.