O dia em que decidi fazer uma tatuagem.

Foi num solarengo dia de Verão que decidi ir fazer uma tatuagem. Ou terá sido num chuvoso dia de Inverno? Hum… Talvez até tenha sido num ventoso dia de Outono. Mas isso agora também não interessa para nada. Vamos partir do princípio que era Verão, porque eu tenho ideia de ter levado uma ‘camisola-à-parte-os-cornos’ (que é como quem diz uma t-shirt de alças).

Estava muito empolgado. Este seria o meu segundo acto de rebeldia. O primeiro tinha sido alguns anos antes quando decidi furar a orelha. Lembro-me de me ter ficado deveras frustrado por os meus pais não terem reparado quando cheguei a casa. Como é que um miúdo põe um brinco na orelha e os pais não notam, hum?! Como?! Que raio de pais são estes?! Até que, passado 3 dias, eles notaram. E rapidamente essa frustração foi substituída por dor. A dor de um valente par de estalos nas ventas!

Mas desta vez seria diferente… Eu estava maluco! Iria tatuar o meu corpo! O lugar já estava escolhido: o braço. Agora o importante era decidir o que tatuar…
– Um boneco? Nã… Demasiado infantil.
– Umas letras chinesas? Nã… Demasiado arriscado, facilmente poderia acabar com “chop-suey de gambas” escrito no braço…
– Um desenho tribal, ultra fixe, que me fizesse parecer um mauzão?! Até que não era má ideia mas isso teria de ser uma coisa em grande e eu estava um pouco apreensivo quanto à dor que isso me causaria.
– Escrever algo, tipo: “Amor de Mãe”,ou “Comandos”,ou “GUINÉ 15-11-69”?! Que excelente ideia! O único problema é que no meu caso teria de ser: “E. S. Augusto Cabrita, classe de ’99”, ou “10º B, Curso Informática”… Não ia funcionar.

O que marcar no meu corpo?! Que imagem é que me simboliza? Por que momentos marcantes é que eu já passei, na minha curta vida?? Será que «Goleada por 7-0 do Silveirense contra o Sacavenense», seria uma boa tatuagem? Não, muito comprida.
AH! Já sei: “1º beijo – 1988 – Isa… Iri… Io…” AH! Raios, como raio é que a miúda se chamava?! Não me lembro. Também não ia dar…

Dúvidas… Indecisões… Até que finalmente me lembrei que as miúdas levam a vida a dizer que eu sou uma brasa! (O que é verdade, diga-se de passagem…) Porque não tatuar algo que simbolize isso mesmo, que sou uma brasa! Agora o quê? Umas pedras de carvão? Umas labaredas? Uma fogueira? Não! Um Sol! Isso mesmo, vou colocar um Sol no meu bíceps… Assim quando me perguntarem o que significa a minha tatuagem, eu respondo: “É porque eu sou um brasa…Cuidado miúda, não te aproximes muito, olha que te queimas!” Uiii… Perfeito! Isso mesmo. Siga para bingo… “Ó amigo, desenhe-me lá aqui um Sol, todo catita, no meu braço.”

VZIIIINHEUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU…
(barulho do Sr. a tatuar o Sol no meu braço)

E já está! Aguentei-me como um herói de guerra, subjugado às tropas inimigas. Não gritei uma única vez. Não verti uma só lágrima. E a única pinga de chichi, que apareceu misteriosamente nas minhas cuecas, deveu-se ao facto de já não ir ao WC há 2h e estar muito aflito… Só por isso, mais nada! A tatuagem ficou linda! Bem melhor do que estava à espera. Um Sol preto, com laivos vermelhos, desenhado em relevo no braço. Um espectáculo. Mais tarde vim a descobrir que o vermelho era sangue pisado e o relevo era apenas por causa do inchaço, mas estava bonito na mesma. A dor veio depois…

“São €100.00!” – disse-me a senhora simpática, com ar de quadro impressionista, que estava na recepção. “FOD…NIXXX” – respondi eu. Não pela dor que sentia no braço mas pela que tinha acabado de sentir na carteira. O que é que eu tinha feito, meu Deus?! Onde é que eu tinha a cabeça?! €100 por um minúsculo Sol, do tamanho de um boneco do Bollycao, que nem a cores era? Antes tivesse colado aqui um daqueles autocolantes das batatas fritas, ou feito a tatuagem com tinta-da-china… O resultado era mais ou menos o mesmo e a dor seria bem menor…Raios me partam!

Mas já não havia volta a dar. Paguei pelo trabalho e fui para casa todo contente. Escusado será dizer que os meus pais só descobriram uma semana depois e nem foi por terem reparado naquela obra de arte espectacular. Foi mesmo porque todas as minhas camisolas estavam cheias de Bepanthene e a minha mãe não percebia de onde vinham as nódoas…

Posto isto, resta-me apenas referir que foi uma experiência incrível e que espero vir repetir um dia. Talvez com mais juízo, com uma ideia mais definida do que tatuar e, acima de tudo, numa casa onde a recepcionista não esteja a comer iscas por detrás do balcão. Mariquices, sei lá…