O maior poder de todos é por nós desaproveitado

Esta semana proponho que o caro leitor reflicta comigo acerca do poder que detém nas suas mãos. Não, não falo do poder que detém no local de trabalho, no seio da família ou na associação recreativa de que faz parte. Ou melhor não falo só desse poder, mas de algo maior, de algo que ultrapassa todas as barreiras e que não pode ser contabilizado. Confuso? Não esteja, não é caso para tanto. Quantas vezes ouviu aqueles que o rodeiam dizer (ou disse você mesmo): “Sou apenas um, estou sozinho, que poder possuo eu?”

E já parou para pensar que tal pergunta não faz qualquer sentido? O maior poder que detemos é a capacidade de influenciar (positivamente ou negativamente) os que nos rodeiam. E nem sempre esse poder está directamente relacionado com o outro poder, o efectivo, aquele que a sociedade nos reconhece. Sermos bons cidadãos é algo maior do que o cargo que ocupamos na empresa onde trabalhamos. O chefe tem mais poder efectivo do que o empregado de limpeza, certo? Claro que sim, é algo óbvio para todos: um é o chefe supremo que toma todas as decisões importantes enquanto o outro é apenas o empregado de limpeza. Mas será que o chefe é melhor cidadão só por ser chefe? Obviamente que não. Assim como o empregado de limpeza não é pior cidadão só por estar no extremo oposto do chefe na hierarquia de poder da empresa.

Serve o exemplo acima para demonstrar que o verdadeiro poder que todos nós temos é aquele que menos aproveitamos. Transportem agora isto para o vosso dia-a-dia. Este poder de que vos falo é muito difícil de quantificar ou de avaliar. Porquê? Porque tanto é expresso através daquela idosa que ajudou a atravessar a rua como daquele sorriso sincero, e sem segundas intenções, que deu aquela adolescente no supermercado. Custa-lhe muito abrir a porta e ceder a passagem à senhora que está ao seu lado? Claro que não, até porque quanto muito “perderá” alguns segundos. Eu sei que quando estamos com pressa até alguns segundos podem fazer a diferença entre chegar a horas ou chegar atrasado. Mas na maior parte das vezes não estará com pressa logo poderá cumprir as regras da boa educação.

A verdade é que o “segredo” deste poder está, na esmagadora maioria dos casos, relacionado com as regras de educação, com o bom senso e com a simples simpatia e cordialidade. Basta que nos transportes públicos sorria a quem passa por si em vez de se mostrar zangado com todo o mundo e arredores. Ou que ao passar a estrada na passadeira estenda a mão em sinal de agradecimento ao condutor que parou deixando-o passar.

Sim, somos apenas um e o nosso poder é limitado. Mas mesmo sendo limitado pode ter um grande alcance. Acompanhe o seguinte exemplo: imagine que vai na rua, em plena cidade de Lisboa, e que decide segurar a porta para que uma idosa (carregada com vários sacos de compras) passe mais facilmente pela porta. Essa idosa, imbuída do espírito, quando atravessar a estrada vai estender a mão, agradecendo assim ao condutor que amavelmente a deixou passar na passadeira. Esse condutor vai ficar preso por aquele gesto tão simples quanto significativo e ao chegar a casa vai cumprimentar a sua esposa com um beijo ainda mais apaixonado do que nos restantes dias. O exemplo pode parecer descabido e desprovido de sentido, mas é mais real do que pensa. No fundo trata-se apenas de espalhar amor e carinho através de gestos simples e despreocupados.

Mas este é o poder que possuímos sobre aqueles que desconhecemos. Outra vertente deste poder aplica-se aos nossos familiares e amigos. Grande parte daquilo que somos e da personalidade que temos é da responsabilidade dos nossos familiares e amigos. Porque contactamos diariamente e porque, por vezes, os conhecemos melhor do que eles próprios. Eu, por exemplo, não consigo quantificar a importância dos meus pais, dos meus avós ou dos meus primos no desenvolvimento da minha personalidade. Se hoje sou a pessoa que sou também o devo a eles. Devo-o a mim próprio e ao caminho que percorri, mas também a eles.

Lembra-se daquela rapariga que conheceu por acaso e que se tornou namorada em menos de nada? Lembra-se do impacto que ela teve na sua vida? Da ligação especial que criaram e do amor que partilharam? Agora pense em tudo aquilo que aprendeu, que viveu, que sentiu com essa pessoa. Percebeu agora o poder que alguém pode ter sobre quem o rodeia?

Ok, se calhar não percebeu porque não se identificou com o exemplo. Então e aquele primo afastado que apenas via nas reuniões de família? Ao início não tinham grande relação, mas quando o conheceu verdadeiramente desejou tê-lo feito muito tempo antes, não foi? Percebeu nesse momento que os conselhos e a experiência desse familiar lhe teriam dado muito jeito ao longo da sua vida. Essa pessoa conseguiu marcá-lo para sempre, mesmo tendo chegado à sua vida mais tarde do que seria de esperar.

Foram apenas dois exemplos. Exemplos que dirão muito a certos leitores, e que estarão distantes da realidade de tantos outros. Troque os graus de parentesco, os nomes, os locais, o que quiser. Mas certamente que é capaz de se lembrar de alguém que tenha sido (ou que é actualmente) um exemplo para si. Alguém com quem aprendeu muito e a quem também pôde ensinar umas quantas coisas. Essa pessoa aproveitou o maior poder que lhe foi concedido. E você também o pode aproveitar, basta querer e fazer por isso.

Lembre-se: são os pequenos gestos que mais marcam. Um sorriso sincero. Um beijo roubado. Uma festinha no cabelo que surgiu de forma inesperada. O que conta é a intenção, e o sentimento com que o faz e diz. Mas faça. Seja feliz e torne os que o rodeiam felizes também.

Boa semana.
Boas leituras.