O princípio do fim

Existe apenas uma indubitável certeza nesta vida: ninguém vive para todo o sempre. Alguns conseguem verdadeiras proezas ao conseguirem uma vida longa que, por vezes, chega a ultrapassar os 100 anos de idade. Sempre me interroguei como será viver assim tantos anos. Será agradável ou apenas algo que, ali a partir dos 85 anos, começa a ser um pouco enfadonho porque, de 2 horas em 2 horas, há a necessidade de alguém vir trocar a fralda. Ou mesmo pelo simples facto de ter de aturar a humanidade durante tanto tempo. Eu, com 38 anos de idade, já estou a chegar a um ponto de ruptura no que a aturar a humanidade diz respeito, quanto mais com 85 anos de idade. Pelo caminho que a minha vida está a tomar, parece-me que não tenho de me preocupar muito com o que vai ser a minha vida aos 85 anos de idade, porque não me parece que vá lá chegar.

Sempre ouvi dizer que, aos 40, é que a vida começa a fazer realmente sentido. E confesso que sempre tive curiosidade em lá chegar para ver o que raio irá fazer sentido, visto que aos 40 anos de idade é quando se dá início à dura batalha do “princípio do fim”. Principia-se logo com a malfadada história do exame à próstata. Leva-se uma vida inteira a afirmar a pés juntos que esse dia está longe de chegar e, num ápice, eis que os 40 estão aí à porta. Interrogo-me se, de facto, será pelo facto de fazer o exame da próstata que a vida começa realmente a fazer sentido. O que torna ainda mais assustador o facto desse dia estar a aproximar-se a um ritmo alucinante e, muito provavelmente, igualmente a resposta ao porquê de muitos heterossexuais, depois dos 40, finalmente conseguirem escutar o seu corpo e perceberem que, afinal, não são heterossexuais, mas sim homossexuais.

Exames e esfíncteres à parte, parece-me que escutar o nosso corpo é o mais essencial nesta fase da vida. E é o que eu tenho optado por fazer no último ano. E o feedback que ele me tem dado é muito simples: parece-me que, afinal, eu sou muito precoce. Não, não percebi que, afinal, sou homossexual, mas percebi perfeitamente que o meu nível de precocidade está mais relacionado com o facto de eu não ter ainda atingido os — supostamente — loucos e insaciáveis 40 anos de idade, mas já estar a sofrer de todas as maleitas que essa idade acarreta. Como, por exemplo, o facto de não conseguir levantar-me da cama muito cedo de manhã, como acontecia quando era “jovem”. Desde que comecei a escutar o meu corpo, a mensagem que ele mais me tem transmitido é que devo aproveitar mais tempo na cama. Por outro lado — e atribuindo negativamente as culpas ao facto de passar mais tempo na cama —, todos os dias acordo com uma dor nova. Ora nas costas, ora na anca, ora nos joelhos e, invariavelmente, com dores de cabeça por ter dormido demais. É certo e sabido que os velhinhos dormem poucas horas. Trata-se de algo que tenho de melhorar. Acho que ando a abusar. A minha precocidade leva-me igualmente à certeza que as coisas estão a encaminhar para o fim. Antigamente, qualquer maleita que surgisse no meu corpo estava convalescida em 2/3 dias. Agora levo 2/3 meses a restabelecer-me de uma maleita. Por outro lado, os 40 é uma idade que nos dá o direito de afirmar que somos pessoas experientes, mais sábias e verdadeiros gurus no que ao amorrrrrr diz respeito. E essa é uma das desvantagens de ainda só ter 38 anos de idade — ninguém me dá crédito nesses três pontos. Mas a humanidade que se prepare, pois estou quase lá a chegar. Mas, primeiro que tudo, há que fazer o exame da próstata. Uma coisa de cada vez…