A opinar com…Florentina Neves

Este mês tenho o prazer de fazer a entrevista mais pessoal da minha vida. Pela primeira vez na minha vida entrevisto a minha mãe. Não foi uma entrevista, mas sim uma conversa. E como devem imaginar poderia durar horas infinitas. Mas tendo em conta a filosofia deste espaço no Magazine Mais Opinião tal não seria exequível. Apresento-vos a senhora minha mãe. A luz dos meus olhos. A mulher da minha vida.

Desde há cerca de dois anos a esta parte que, infelizmente, te encontras desempregada. Antes desta infelicidade nunca tinhas estado tanto tempo sem emprego. Como é que se encara o desemprego quando já se viveu tanto e existe uma família que, de certa forma, em parte depende de nós?

É completamente desesperante dia após dia, currículo após currículo a resposta ser sempre a mesma: não. O tempo vai passando, a idade vai aumentando e a probabilidade de encontrar emprego diminui. Na fase em que actualmente me encontro, casada e com um filho, acabo por sentir uma pressão enorme para encontrar emprego (algo que infelizmente ainda não consegui). Tudo aumenta dia após dia elevando as despesas para valores incomportáveis enquanto que o subsídio de desemprego tem sempre tendência para diminuir. Fazendo assim de cada família autênticos ginastas olímpicos na arte de gerir as despesas mensais. Noto também que actualmente as empresas preferem contratar jovens inexperientes em vez de pessoas que, apesar de terem mais alguns anos de vida, possuem também mais experiência nas funções e que, obviamente, poderiam representar uma mais-valia para a empresa. Claro que não quero com isto dizer que os jovens não devam de ser contratados pelas empresas, muito pelo contrário, o futuro passa sempre pelos mais jovens. A questão é que as empresas pensam sempre primeiro no factor económico e não na experiência e nas reais capacidades do candidato. E sejamos sinceros: para qualquer empresa somos considerados “velhos” a partir dos 35 anos de idade. Ou seja, a esmagadora maioria das pessoas que, hoje em dia, procura emprego tem mais idade do que aquela que é pretendida pelas empresas. Existe assim uma grande disparidade entre a oferta e a procura no actual mercado de trabalho.

A actual crise económica e o desemprego por períodos de tempo mais elevados teve como consequência o aumento do número de adultos que voltaram a estudar a fim de elevar as suas competências. Tu também sentiste esta necessidade, não foi assim?

Exactamente. Eu tinha apenas o 9º de escolaridade incompleto dado que na altura comecei a trabalhar e acabei por não continuar a estudar. Agora que me vi desempregada e a “concorrer” contra pessoas mais novas e com mais habilitações do que eu, percebi que era tempo de tentar “equilibrar a balança”. Ou seja, só voltando á escola e completando os estudos poderia aumentar as probabilidades de encontrar emprego. Dediquei-me então aos estudos: primeiro completei o 9º ano, e de seguida tirei o 10º, o 11º e o 12º ano. Graças ao programa “Novas Oportunidades” refresquei muitos dos conhecimentos que detinha e adquiri novas competências que antes não possuía. Hoje tenho o Ensino Secundário completo, algo que é imprescindível para qualquer trabalho, seja ele em que área for. Para além disto frequentei também vários cursos, entre eles, o de informática. Esta era uma área na qual não possuía quaisquer conhecimentos e hoje, graças a esse mesmo curso, consigo desempenhar as tarefas mínimas exigidas por qualquer entidade patronal.

Falemos agora do programa “Novas Oportunidades”. Foi uma das bandeiras do anterior Governo, chegou a ser cancelado pelo actual Governo, mas acabou por continuar a existir. Tu, que o frequentaste e pudeste assistir ao seu funcionamento, com que ideia ficaste deste programa de ensino para adultos?

Considero que é algo de positivo pois veio dar uma nova oportunidade a pessoas como eu (e até com mais idade) a refrescar e aumentar os seus conhecimentos, melhorando assim o seu currículo. Mas o mesmo é válido para os mais jovens dado que, por exemplo, na minha turma não havia apenas pessoas de meia-idade ou idosos mas também alguns jovens que, por várias razões, abandonaram os seus estudos. Este programa é realmente uma segunda oportunidade! Sinto-me também na obrigação de falar do outro lado do programa. Primeiro, apesar de ser uma excelente iniciativa não me permite concorrer ao Ensino Superior. E se para mim isto não é propriamente um problema (visto que não tenho esse objectivo), para os mais jovens acaba por simultaneamente ser uma oportunidade e um entrave. Na minha opinião ainda não existe um número suficiente de professores totalmente preparado para o ensino de adultos, ou seja, leccionam as matérias mas é notório que não é a sua especialidade. E ao dizer isto não estou a “atacar” os professores, muito pelo contrário, visto que fizeram um excelente trabalho mesmo tendo uma carga horária excessiva (muitos deles davam aulas das 8h ás 24h, dado que apenas tínhamos aulas em regime pós-laboral). Mas isto apenas acontece por o ensino de adultos ser algo muito recente no nosso país. Estou convicta que com o passar do tempo esta debilidade será, facilmente, ultrapassada.

Que mensagem gostarias de deixar a todas as pessoas que estão numa situação semelhante à tua?

A melhor mensagem que posso deixar é dar o meu exemplo pessoal. Vi-me desempregada numa idade em que não pensava que tal me fosse acontecer. Encontrei um mercado de trabalho que nos coloca o rótulo de “velhos” a partir dos 35 anos e que parece não dar a devida importância á experiência que temos. Mas não desisti. Não baixei os braços. Não cedi á pressão que tenho sobre os meus ombros. Voltei aos estudos. Revi matérias que dei há quase trinta anos e aprendi outras sobre as quais tinha apenas ouvido o meu filho falar. Tirei um curso de informática e hoje domino consideravelmente bem o computador e a internet (algo impensável para mim até há bem pouco tempo atrás). Ainda me encontro desempregada, é verdade, mas não desisti. Nem vou desistir. Acredito profundamente que o trabalho e o empenho mais cedo ou mais tarde serão reconhecidos pelo destino. E é assim que todos aqueles que se encontram na mesma situação do que eu devem estar: positivos e fieis num amanhã melhor e num futuro mais risonho.

No próximo mês não podem perder mais uma entrevista, aqui no Magazine Mais Opinião!

A Opinar com foi produzido por Bruno Neves
O nosso agradecimento à entrevistada.