Para os braços da tua mãe

Não consigo entrar no teu quarto, está vazio, vazio de ti. Olho para os brinquedos cheios de pó, para a cama imaculada, para as roupas que vais deixando de cada vez que regressas a Portugal. A bola de futebol meia gasta, as primeiras botas que usaste que não consegui dar, aquele fatinho que vestiste no teu baptizado, as medalhas de campeonatos ganhos com amor e sacrifício. Ai esta saudade que me tortura, que me tira o chão. Filho, tenho tantas saudades tuas, volta para os braços da tua mãe. Eu sabia que este dia ia chegar, eu temi este dia todos os dias da nossa vida, eu via-te crescer, ganhar asas, quereres altos voos, eu apoiei-te em todos os momentos da tua vida. Sou a tua maior fá sabias? És o meu maior orgulho! Cresceste, estudaste, licenciatura, mestrado e depois nada…enviar currículos, bater às portas de amigos, procurar emprego em todos os cantos de Portugal, pesquisar diariamente na Internet à espera do tal anuncio…começou o teu desespero e a minha frustração de mãe, 23 anos, uma vida pela frente e sem trabalho. Surgiu a oportunidade de trabalhares fora do teu país, um bom emprego e um bom salário na área para a qual tanto estudaste.

Faz hoje dois anos e quatro meses que saíste do teu país, faz hoje dois anos e quatro meses que deixaste a tua casa, o teu lar, o teu conforto, a tua língua, a comida que tanto gostas, os teus amigos, a tua família, os teus pais, foste em rumo a uma vida que o teu país não te podia proporcionar. Como pode um governo criar autenticas relíquias nacionais, pessoal jovem com vontade de trabalhar, especializados nas mais diversas áreas, e depois manda-los embora? Erro colossal que num futuro próximo trará consequências negativas, económicas e sociais.

Olho para os retratos espalhados pelas paredes de casa e caem as lágrimas sem parar, soluço uma e outra vez, como pode o tempo ser tão ingrato e passar tão rápido? Ainda ontem ias para a primeira classe e hoje já não estás aqui! Filho, tenho tantas saudades tuas, volta para os braços da tua mãe. Se eu pudesse voltar atrás, só um pouquinho, só para poder sentir aquele cheirinho de bebé, de ajudar-te a escrever o teu nome, de amparar as tuas lágrimas quando fazias doí doí, só para poder dar-te colo, é isso filho, tenho tantas saudades de quando te dava colinho. Pedias sempre para te contar uma historia, para brincar contigo, para te fazer o avião e as cambalhotas…tantas vezes te disse não, o ritmo diário era tão grande, a preocupação em que não te faltasse nada era tão forte…agora olho para o fogão que tanto limpei, para o chão que tanto esfreguei, para a louça que diariamente lavei e só penso: trocava todos estes minutos desperdiçados para poder dizer-te que sim, que te vou contar uma historia, que vou adormecer a teu lado, que vou brincar contigo…mas o tempo não volta atrás, nunca mais! Agora olho para a nossa casa, antes tão pequena e agora demasiado grande. Está vazia, vazia de ti. E eu, outrora tão completa quando te tinha debaixo das minhas asas de mãe, e agora assim vazia, vazia de ti. Sei que estás bem, que estas feliz, não quero que passes frio, nem que passes fome, nem te sintas só, nem que te sintas humilhado ou sofras algum tipo de descriminação por seres imigrante, não quero sentir a tua voz triste quando falamos ao telefone. No Natal vou-te ver meu filho, a ansiedade já é muita, vou cozinhar o bacalhau que tanto gostas, o leite-creme que adoras… filho, tenho tantas saudades tuas, volta para os braços da tua mãe.

Crónica dedicada a todas as mães de filhos emigrantes. Hoje são vocês, amanhã seremos nós, mães desta geração.