Os Treinadores e a Dança das Cadeiras

“Em equipa que ganha não se mexe”. Esta frase já foi ouvida ou debitada por qualquer pessoa que acompanhe futebol. É um verdadeiro clássico da gíria futebolística, repete-se ao longo do tempo e faz todo o sentido. Faz sentido mas teima em acontecer precisamente o contrário. Cada vez que o mercado de transferências abre, como é agora o caso, assistimos a este fenómeno, de saídas e entradas de jogadores, mas também de mudanças de quem os comanda a partir do banco. Olhemos, então, para a realidade portuguesa.

O Benfica venceu a Taça da Liga e sagrou-se bicampeão aos comandos de Jorge Jesus e quando podia entrar numa nova época com total estabilidade, vê o seu treinador dos últimos 6 anos mudar-se para o grande rival do outro lado da 2ª circular: o Sporting. Se equipa que vence não deve ser mexida, treinador que leva a equipa a vencer também não deveria ser.

O outro troféu em disputa a nível nacional, a Taça de Portugal, foi levado para o museu do Sporting numa final emocionante contra o Braga. Poucos dias depois, Marco Silva, aquele que também terminou a época como um treinador ganhador e nas boas graças dos adeptos leoninos, é afastado para dar lugar a Jorge Jesus. Mais uma vez, numa equipa que ganhou decidiu mexer-se. Neste caso, a aposta foi mexer e trocar para um treinador com mais provas dadas que Marco Silva. Uma verdadeira aposta para atacar o título e para trazer estabilidade a longo prazo. Uma verdadeira jogada de génio por parte de Bruno de Carvalho e uma das contratações de treinadores mais sonantes (se não mesmo a mais sonante de sempre) no nosso país. Isto por tudo aquilo que engloba a contratação, primeiro, é um treinador bicampeão, segundo é um treinador que esteve na casa do maior rival por seis temporadas e conhece como poucos o interior da Luz, terceiro porque poucos esperavam que o Sporting tivesse capacidade financeira para pagar o elevado salário de Jorge Jesus. A verdade é que aconteceu e Marco Silva parece ter sido um pouco desrespeitado também.

Curiosamente, mais a Norte do país, a outra equipa candidata a troféus, o Futebol Clube do Porto, que nada ganhou, decidiu dar a Julen Lopetegui uma segunda, e talvez derradeira, oportunidade. Em treinador que perde não se mexe, diria eu. Talvez não seja bem assim, até porque sou daqueles que acha que para haver resultados importa haver estabilidade, seja qual for o cargo que se ocupe e seja ele no futebol ou noutra área qualquer. Essa estabilidade só vem com o tempo. A maioria dos dirigentes desportivos deve pensar de forma diferente, porque grande parte dos clubes da 1ª Liga irá iniciar a próxima temporada com novos treinadores nos respectivos bancos.

Rui Vitória é o novo treinador dos campeões nacionais depois de quatro temporadas nos comandos do Vitória de Guimarães. Do treinador de 45 anos espera-se que continue o trabalho feito por Jorge Jesus e que haja também um maior aproveitamento de jovens jogadores saídos do Seixal, uma alegada vontade de Luís Filipe Vieira. Para colmatar a saída de Rui Vitória, o Guimarães encontrou uma solução interna e apostou num homem da casa, Armando Evangelista, anterior treinador da equipa B.

Também no Minho, Sérgio Conceição deixou de ser treinador do Braga para dar lugar a Paulo Fonseca que na época que passada treinou o Paços de Ferreira. Na equipa da Capital do Móvel quem manda agora é Jorge Simão, treinador que fez um bom trabalho à frente do Belenenses, conseguindo um importante, e histórico, acesso à Europa. Já em Belém, o novo homem forte do futebol é Ricardo Sá Pinto, que terá a difícil tarefa de comandar o Belenenses na Europa, vários anos depois da última ida do clube a estes palcos.

José Viterbo, da Académica, Fabiano Soares, do Estoril, e Ivo Vieira, do Marítimo, que aparentemente seriam treinadores a prazo, viram o seu trabalho ser reconhecido pelos dirigentes dos respectivos clubes, garantindo assim a continuidade enquanto treinadores dos mesmos clubes que assumiram já no decorrer da época transacta.

Os poucos treinadores que se mantêm nos cargos, pelo menos, desde o inicio do ano passado são aqueles que atingiram os objectivos dos seus clubes. Manuel Machado, do Nacional da Madeira, conseguiu um interessante 7º lugar para a equipa insular, Miguel Leal, do Moreirense, o 11º lugar e a manutenção e Petit, do Boavista, um heróico 13º lugar, atendendo que a equipa veio do Campeonato Nacional de Seniores e era apontada por muitos como uma candidata a descer.

Depois de um campeonato na chamada corda bamba, embora com a manutenção conseguida, Pedro Emanuel e Bruno Ribeiro, treinadores de Arouca e Vitória de Setúbal, respectivamente, não viram os seus contractos serem renovados no final da época. Foram agora substituídos por Lito Vidigal, anteriormente despedido do Belenenses, e por Quim Machado, técnico que trouxe o Tondela ao primeiro escalão do futebol nacional.

Dos clubes que ascenderam à 1ª Divisão, importa também referir que tanto o Tondela como a União da Madeira, mudaram os respectivos técnicos, mesmo apesar do excelente trabalho realizado na 2ª Divisão e do cumprimento dos objectivos a que estavam propostos. A saída aqui, de Quim Machado e Vítor Oliveira, fez-se por opção própria, à semelhança do que aconteceu com Jorge Jesus.

Parece que para quem treina em Portugal, atingir os objectivos mínimos, obter bons resultados e até mesmo exceder as expectativas, já não é sinónimo de manutenção do emprego. Por outro lado, às vezes falhar até pode ser sinónimo de segundas oportunidades. Tempos confusos num país onde o desporto, e sobretudo, o futebol ainda tem de evoluir para um dia poder ombrear com outros países, onde os treinadores são muito mais respeitados por adeptos e dirigentes e onde lhes é dado tempo para atingir estabilidade e consequentemente, melhores resultados.

Aqui, mais do que se treinar um clube de futebol, brinca-se à dança das cadeiras.