A paciência que é preciso ter!

Caçado por uma jornalista à saída da reunião em que foi formalizada a entrada da Guiné Equatorial na Comunidade dos Países de Língua oficial Portuguesa (CPLP), o chefe de Governo português, Pedro Passos Coelho é abordado no sentido de responder a algumas perguntas. Esta é a hipotética conversa entre ambos, na qual ele, em passo de corrida, se mostra desagradado e quase por obrigação lá vai respondendo com ar cansado, como um atleta dos 100 metros que acabasse de correr uma dupla maratona.

JORNALISTA (J) – Senhor 1º Ministro!

PEDRO PASSOS COELHO (PPC) – Minha senhora, tenha paciência, falamos mais tarde…

J – Senhor 1º Ministro, não lhe tomo muito tempo. É para os nossos telespetadores em Portugal. A Guiné Equatorial é agora um membro de plenos direitos da CPLP. Vi alguma insatisfação na sua cara quando foi feito o anúncio oficial. Concorda com a entrada do pequeno Estado africano na comunidade dos países lusófonos?

PPC – Evidentemente que concordo. Isso só traz vantagens para Portugal. À medida que mais países pequenos como aquele entrarem, aumentam as nossas probabilidades de passarmos a ser vistos como um grande Estado e, por conseguinte, de passarmos a integrar o grupo dos países de maiores dimensões.

J – E não acha estranho que num país que faça parte da CPLP apenas uma franja considerada irrisória da população fale o Português?

PPC – Considero isso ótimo! Assim, daqui para a frente vão todos aprender a falar e a escrever corretamente segundo as regras do novo Acordo Ortográfico e dessa maneira acabam-se as confusões!

J – Mas se Portugal aprova a entrada da Guiné Equatorial, não acha no mínimo estranho que nem o presidente português tenha aplaudido a intervenção de Xanana Gusmão na apresentação que fez aos outros membros?

PPC – Não, porque eu próprio fiquei quieto com receio de que algum membro das delegações dos outros países, e que estivesse presente na mesa, em oposição a essa declaração, se levantasse nesse instante e isso pudesse ser confundido com um ato hostil da nossa parte. Foi só por precaução que não aplaudimos, foi uma medida politicamente correta.

J – Não considera que antes do anúncio oficial, dever-se-ia ter ido a votos? Ou seja, que devia ter havido uma votação antecipada?

PPC (Irritado) – Lá vêm vocês, senhores jornalistas, com essa conversa das eleições antecipadas! Também é da opinião de que tal como em Portugal isso ia resolver alguma coisa aqui? Em minha opinião, nenhuma eleição contribuiria em nada para pôr toda a gente de acordo em relação fosse ao que fosse.

J – Mas essa quebra de protocolo deixou algumas pessoas incomodadas.

PPC – Só alguns dos próprios guine-equatorienses presentes, que estavam à espera de que essa declaração fosse mais solene, e de acordo com a importância que acham que o país tem. Felizmente são poucos e representam uma classe minoritária ignorante.

J – Pensa convidar o presidente da Guiné Equatorial a visitar oficialmente Portugal?

PPC – Sim, pela Páscoa, porque é quando recebemos mais turistas espanhóis, e nas ruas mais se ouve falar castelhano. Queremos que ele se sinta verdadeiramente em casa.

J – Se for convidado, aceitará ir àquele país numa visita de Estado?

PPC – Claro, disponibilizo-me para ir em qualquer altura do ano, porque se estiver à espera de uma altura específica em que um grande de portugueses lá vá de visita, para ser eu a sentir-me em casa, pode ser que essa oportunidade nunca venha a surgir.

J – Esse problema não se põe, porque o senhor 1º Ministro leva sempre uma grande comitiva atrás. Não é segredo para ninguém que nas suas deslocações ao estrangeiro costuma incluir um vasto leque de personalidades.

PPC – É verdade, costumo convidar figuras públicas: alguns políticos em representação dos grupos parlamentares; empresários destacados nos vários ramos de atividade, e até artistas.

J – Sabe se já alguém lá se deslocou? Ficava a conhecer a realidade que lá ia encontrar.

PPC – Não creio que nenhum político ou empresário já tenha sido convidado, mas vou tentar chegar à fala, através do meu assessor para a comunicação, com alguns artistas dos mais conceituados das telenovelas da TVI ou da RTP Internacional caso transmitam para lá. Esses sim, é que têm o hábito de entrar em nossas casas sem serem convidados e pode ser que saibam alguma coisa.

J – O senhor 1º Ministro também vê telenovelas?!

PPC – Vejo, mas só aquelas em que há finais felizes. Daquelas em que há os bons em oposição aos maus, daquelas em que mesmo os vilões que andam 4 anos a praticar más ações chegam ao fim e veem o seu trabalho reconhecido, e por fim são recompensados.

J – Depois disto a que assistimos, acha que mais países vão querer entrar para a CPLP? E quais são eles?

PPC – Senhora jornalista, se for por causa da quebra de protocolo que houve, esqueça! Nenhum governante deve estar interessado em que, depois de ser aceite por todos os Estados, venha alguém para aqui dar entrevistas dizendo mal dos seus cidadãos, chamando-lhes ignorantes.

J – Quer revelar um pouco da conversa privada que teve com o senhor Presidente da República?

PPC – Como disse, tratou-se de uma conversa privada e por isso não estou autorizado a revelá-la. Contudo, pode perguntar-lhe a ele, embora eu ache que as nossas conversas devam permanecer em segredo.

J – E acha que ele o faria sabendo que era contra a sua vontade?

PPC – Bem, já por diversas vezes ele enviou diplomas meus para serem avaliados no Supremo Tribunal constitucional…

J – Foi porque lhe suscitaram dúvidas acerca da constitucionalidade. No lugar dele não faria o mesmo?

PPC – Sim, mas só aos que ele na condição de 1º Ministro alterasse para calar os líderes da Oposição.

J – Só para terminar: senhor 1º Ministro regressa ainda hoje a Lisboa?

PPC – Sim.

J – E vai reunir-se com algum membro do Governo?

PPC – Mas espere lá! Era o que faltava estar agora aqui a revelar-lhe pormenores da minha agenda! E fique sabendo que esta conversa é privada.

J – Quer dizer que estou proibida de revelar o que conversámos?

PPC – Exatamente. Se o fizer serei obrigado a negar.

J – Tudo o que dissemos?

PPC – Não. Só aquela parte ao princípio, quando eu lhe disse que falávamos mais tarde. Minha senhora, olhe o respeito! Do que é que acha que as pessoas iriam pensar que nós estaríamos “a falar”, se soubessem, depois de já termos falado aqui de todos os assuntos possíveis e imaginários?!