Panorama – Caixinha Sem Magia

Eis que somos chegados a 2012, um novo ano que se avizinha complicado para todos os cidadãos europeus e principalmente para nós portugueses. O que está pela frente não será fácil certamente fácil mas tenho esperança que, pelo menos, as coisas não piorem ainda mais.

A tradicional passagem de ano para muitos é cada vez mais feita junto dos amigos. Se o Natal é a festa em que toda a família se reúne, a passagem de ano é o equivalente para todos os amigos. Para alguns jovens a passagem de ano é feita em festas em discotecas e bares que nesse dia aproveitam para carregar especialmente nos preços. Outros há que participam em eventos e festas populares, normalmente organizados pelos próprios municípios ou associações locais. Há até quem se desloque para bem longe com o intuito de ver as tradicionais celebrações com fogo-de-artifício. Para muitos, incluindo os bem mais velhos e as crianças, a passagem de ano é feita na companhia da televisão, a famosa caixinha mágica que sempre permite visitar e marcar presença em locais onde não é possível estarem fisicamente.

A passagem de ano sempre foi para as televisões uma altura marcante e em que todos faziam jus aos seus talentos, colocando os profissionais das próprias estações em galas e cerimónias de final de ano. Recordo-me de quando era mais novo muitos desses programas serem conduzidos pelo Herman José que, ainda que ultimamente se encontre perdido, é considerado por muitos o melhor humorista português. Lembro-me especialmente da passagem de ano de 1990 para 1991 em que o seu programa de passagem de ano: Crime na Pensão Estrelinha foi considerado como um dos melhores de sempre. Talvez por isso tenha sido, em 2007, o primeiro programa de Herman José a ser lançado em DVD e posteriormente, em 2008, exibido como programa de passagem de ano pela RTP Memória.

O Herman José continua e será para sempre, na minha memória, o melhor humorista deste país, no entanto, nestes últimos anos encontra-se a tentar fazer algo na televisão portuguesa que já há muito queria fazer, os talk-shows à americana com celebridades portuguesas.
Estas suas tentativas já remontam a 1993, altura em que estreou o Parabéns, programa que foi aliás nesse ano exibido também na passagem de ano da RTP. O Parabéns era um concurso com vários sketches de humorísticos e entrevistas a personalidades da televisão portuguesa e algumas figuras de renome internacional como a cantora Cher e o famoso actor de 007, Roger Moore. O concurso Parabéns acabou por ser um misto de variedades algo surpreendente dentro da caixinha mágica que temos em nossas casas.
Mais recentemente foram muitos os programas em que Herman José convida e entrevista personalidades portuguesas, nos quais procura imitar os talk-shows americanos, procurando tornar-se o Jay Leno ou Conan O’Brien português. Ainda que muitos considerem que estes programas são flops devido ao facto de o nosso país ser relativamente pequeno e que, como tal, não existem personalidades públicas suficientes para suster e manter no ar um destes programas com qualidade e regularidade.

 Ainda que em parte possa concordar não posso deixar de mencionar os talk-shows emitidos pela RTP 2, Cinco para a Meia-Noite, nos quais vários apresentadores (a maior parte humoristas). Gravados num pequeno estúdio e com condições bem menores que os programas de horário nobre, estes talk-shows mostraram que é possível fazer um programa com convidados famosos de qualidade e com regularidade.

Quanto à questão do número de personalidades conhecidas ser reduzida, a verdade é que a nível de quantidade as pessoas famosas portuguesas não assim tantas, mas o problema nem passa por aí, até porque temos muito bons actores, músicos e outros artistas a precisar de divulgação. O problema reside no facto de as estações procurarem convidar pessoas que são celebridades instantâneas e que, como tal, irão trazer mais audiência ao programa, sendo que o custo é a perda de qualidade do programa e consequente desgaste do próprio formato. Até porque de certeza que figuras marcantes da vida pública, como o Presidente da República ou o Primeiro-Ministro, não se sentarão nas mesmas cadeiras em que personagens de reality shows. Talvez a verdadeira falha destes programas em Portugal seja mesmo essa, em vez de vermos entrevistas com pessoas marcantes da nossa sociedade, acabamos por ver novas figuras feitas à pressão a exibirem o seu (baixo) nível de cultura e vedetismo.

É por isso que a qualidade de programas de passagem de ano diminuiu e que já não se fazem programas como os da televisão com que eu cresci, onde pessoas como o Herman José eram reis e senhores das passagens de ano. Hoje em dia vemos uma série de cromos enfiados numa casa durante vários dias a fazer coisas comuns e a dizerem as maiores barbaridades e ficamos todos contentes…

 Estava previsto pelo governo o corte das emissões televisivas através de ondas hertzianas analógicas para o dia 12 deste mês, no entanto, e devido à falta de informação e preparação desta mudança o prazo para este apagão foi adiado para uma data que ainda não foi dada a conhecer. Portanto no futuro (próximo ?) quem quiser ver televisão vai ter de comprar um recetor digital ou contratar um serviço de televisão por cabo.

Bem, se é para ver as emissoras nacionais e a degradante qualidade da grande maioria dos programas que exibem, prefiro poupar o meu dinheiro e não me sujeitar a ver a continua degradação da caixinha mágica em Portugal. Na verdade a televisão já nada tem de mágica, recentemente tornou-se uma caixa sem magia e com cada vez menos sentido; se é para pagar prefiro pagar por canais com conteúdos que eu queira ver ou, ainda melhor, que eu possa escolher por mim.

Crónica de Celso Silva
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