Porque é que o meu parto não foi igual ao da princesa?

Kate Middleton, princesa recém-mama, deu entrada no hospital às seis da manhã e duas horas e meia depois a Charlotte nascia. Fantástico, maravilhoso, esplêndido! Em 100 mulheres quantas têm um parto rápido? Hum…talvez dez. Sortudas! O meu parto durou mais de 24 horas e só me apetecia gritar à enfermeira: vou-me pirar daqui para fora, vocês encheram-me de drogas  para não terem de me aturar, mas eu vou para casa, a cambalear mas vou, tenho o meu filho na rua como as gatas, c…!

Além de um parto rápido, Kate não quis epidural! Ai, não brinquem! Homens, não queiram saber o que é uma contracção, são tão picuinhas com as doenças e com as dores, que eu desconfio que morriam na primeira contracção! Sabem o que é uma dor aguda, do género, não conseguimos sairda sanita, mas cem vezes pior? É…é mais ou menos isso! Bendita sois vós, epidural, ámen! Eu quis epidural nos dois partos, e se tivesse mais dez filhos, eu ia querer mais dez epidurais se faz favor! No momento da contracção só nos apetece ganir, rais parta o marido, rais parta a keka que deu origem a tudo, rais parta a pílula que me esqueci de tomar nesse dia, rais parta a gaja que está aos berros ao meu lado, mas dez minutos depois da epidural eis que a magia acontece, já não sentimos a maldita!

Obviamente que uma princesa a parir no Hospital St Mary, em Londres, com duas parteiras de sua confiança e totalmente ao seu dispor, num quarto com todas as condições e comodidades, não é a mesma coisa que eu, Sandra Castro, pobre e remediada, a parir na Maternidade, com duas parteiras mal-humoradas que estavam ao meus dispor, e ao dispor de mais trinta mulheres quase a dar à luz, numa sala de parto que ainda mal tinha arrefecido do parto anterior.

E lá estava eu, pernas abertas, com um cateter enfiado na veia, com um monitor sempre a zumbir, ora vem uma enfermeira calça uma luva e mete os dedos para ver a dilatação não, ainda falta, está com três dedos, ora vem a parteira, calça uma luva e mete os dedos para ver a dilatação ainda está atrasado cinco dedos, ora vem o médico, o estagiário, a enfermeira chefe, a enfermeira de troca de turnos, outro estagiário…puta que pariu, nunca tanta gente viu a minha pachacha! Chega a hora do parto: puxe menina puxe, vê-se mesmo que é mimalha e novinha, na altura do bem bom não se queixava…calem-se por favor e tirem-me a criança que eu já nem vos posso ver nem ouvir!

E dez horas depois do parto, aparentemente angelical, a Duquesa de Cambridge surge, perfeita, P E R F E I T A, na porta do hospital, com Charlotte ao colo e acompanhada do seu marido, o príncipe William, para cumprimentar os seus súbditos e os jornalistas. Sobriamente maquilhada, cabelo bem penteado, num vestido elegante e que a favorecia e pasmem-se, de saltos altos.

Comigo aconteceu-me exactamente a mesma coisa, no pós-parto eu estava uma beleza: toda inchada, cara inchada e pálida, os cabelos oleosos, cheia de calor, de fome, de sede e de sono, a cambalear da cama para a casa de banho, não conseguia sentar-me numa simples cadeira, com uma camisa que pedi emprestada à minha mãe porque não conseguia vestir as minhas calças de ganga, mamas gigantes a brotar leite a toda a hora…o meu filho com ar sereno e pacifico e eu com ar de quem tinha sido esgazeada por uma lula gigante!

Dez horas depois do parto, eu também era para me deslocar para a minha casa de campo, para descontrair uns dias em família, tal como fez a princesa, mas descobri que não tenho nenhuma casa no campo, e também não saí da maternidade dez horas depois, nem vinte e quatro horas depois, nem quarenta e oito horas depois…não gosto de parir, ponto!

Obviamente que agora as inglesas vão querer copiar a Duquesa, o que já tem sido habitual, tanto nas suas roupas como nas roupas dos seus rebentos (que esgotam em poucas horas nas lojas, gente maluca), esta noticia têm sido muito comentada nas redes sociais e noticiada na imprensa, chegando ao exagero (que também já era de esperar), de que a princesa nunca esteve gravida, ou que teve a filha dias antes de se apresentar ao público que a esperava, tal era o seu aspecto imaculado. A mim tanto me faz, desejo as maiores felicidades para a princesa e para todas as mães remediadas deste Mundo, para terminar, um excerto de um texto de Miguel Torga ( Diário, 1947 )

É curioso como é difícil ser natural. Como a gente está sempre pronta a vestir a casaca das ideias, sem a humildade de se mostrar em camisa, na intimidade simples e humana da estupidez ou mesmo da indiferença.