Pluralidades – Cuidado: a bomba pode rebentar-nos nas mãos

          No decorrer desta semana, o país soube das declarações “bombásticas” de Pedro Nuno Santos. Ele é um dirigente socialista, e vice-presidente da Bancada Parlamentar do PS. Coisa pouca, portanto. Digamos que APENAS representa o povo português e dá voz aos seus interesses na Assembleia da República, o espaço primeiro de discussão e actividade política.

          Há dias atrás, proferiu o seguinte: “Ou os senhores se põem finos, ou nós não pagamos. (…) Não tenho qualquer problema, enquanto político, de o dizer, enquanto deputado, de o dizer. Porque em primeiro lugar, primeiro do que os banqueiros alemães ou os banqueiros franceses, estão os portugueses. Estou-me marimbando para o banco alemão que emprestou dinheiro a Portugal nas condições em que emprestou. Estou-me marimbando que nos chamem irresponsáveis. E se nós não pagarmos a dívida e se lhes dissermos, as pernas dos banqueiros alemães até tremem”.

          Bem, vamos por partes:

  1. O tom moralista com que este deputado se dirige aos mercados internacionais é revelador de um populismo inflacionado, de uma paroquialidade que nem um analfabeto numa conversa de café ousaria ter. Como diz o ditado, “se não podes derrota-los, junta-te a eles”. Portugal não está em posição de exigir o que quer que seja. Não que eu defenda uma subserviência cega aos caprichos internacionais (não mesmo!), mas de facto temos que entender de uma vez por todas que já não dependemos só de nós.

  2.  O facto de referir “não tenho qualquer problema enquanto político de o dizer” ilustra bem o desprezo a que está votada a actividade política, o envenenamento do meio, e a superficialidade que motiva as pessoas a serem cada vez mais descrentes num dos principais alicerces da democracia. Aliás, em circunstância alguma pode Pedro Nuno Santos imiscuir-se do seu papel de deputado, devendo ter a consciência do efeito das suas palavras, e do eventual (e severo) impacto que a sua irresponsabilidade pode acarretar para Portugal. O PS não é certamente isto, nem pode ser isto.
  3. O facto de se estar a “marimbar” mostra bem que é apologista de uma filosofia em que o Partido Socialista lava as mãos, como Pilatos, e rejeita qualquer responsabilidade, tanto na dívida que contraiu, como no Acordo que votou com as instâncias internacionais. O Partido que desde 2008 diz que “não vira a cara às dificuldades” mudou o slogan para “estou a marimbar-me para tudo”. Obviamente que tais afirmações incautas deveriam ser motivo para que António José Seguro retirasse a confiança política a este deputado, ou pelo menos o repreendesse. Mas não, fechou-se em copas. Pior: algumas personalidades (como Manuel Alegre) até ecoam estas barbaridades. Creio que não tarda o PS torna-se num apêndice do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista, que já se regozijaram com tal posição.

  4. Mais tarde, o mesmo iluminado, Pedro Nuno Santos, admitiu que, afinal, a bomba atómica era apenas uma “arma negocial”. Trocando por miúdos: era chantagem, bluff puro. Porque o que nós necessitamos mesmo é de tensão e falta de transparência. Bem, alguém terá de o informar que ele não é o inventor da ideia, e que a Grécia tentou o mesmo não há muito tempo, quando sugeriu um referendo para a permanência no Euro e na União Europeia. Ora, o resultado foi simples: a Grécia colocou o rabinho entre as pernas, porque é a parte mais fraca. E quando se é a parte mais fraca, não se confronta: desvia-se. A Grécia desviou-se para o caminho da sobrevivência, ou enfrentaria o caos, a revolta, e o sangue.

  5. Para finalizar, convém dizer que todos os empréstimos contraídos por nós e respectivas condições foram negociados pelo Estado português. Ninguém apontou uma arma à cabeça dos governantes e os obrigou a pedir dinheiro aos bancos. Nós, voluntariamente, fomos ao mercado financeiro e dissemos: “emprestem-nos dinheiro para investir e gerar riqueza no nosso país”. Em prol do PIB, endividamo-nos. Mas o PIB decaiu, e os juros subiram. Os “bancos franceses e alemães” até podem tremer, mas ao mesmo tempo têm economias mais fortes, capazes de alguma regeneração. Já a nossa, em contrapartida, é como um doente terminal à espera de um milagre para se levantar.

          Por conseguinte, reflictamos: quereremos nós ser responsáveis pela capitulação da Europa, da Moeda Única e de todo um aprofundamento de décadas? Quereremos nós cuspir na mão que ainda nos alimenta? (é tão fácil criticar o empréstimo concedido pela troika, mas sabem lá as pessoas que defendem o não pagamento, o que significa um país falido, isolado). Quereremos honrar os nossos compromissos como uma nação que não perde a verticalidade, independentemente das condições difíceis, ou quereremos então que a bomba nos rebente nas mãos? Pelo menos aqui, podemos escolher.

Crónica de Joaquim Ferreira
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