Política externa portuguesa: a necessária gestão de equilíbrios

A Diplomacia Portuguesa tem-se mostrado forte. Conseguiu trabalhar bem por forma a conseguir eleger António Guterres enquanto Secretário-Geral das Nações Unidas (ONU), num trabalho que levou anos a ser construído. Também foi conseguido o feito ímpar de eleger o Ministro das Finanças, Mário Centeno, enquanto líder do Eurogrupo, afamado pelo bom desempenho na gestão do erário público de Lisboa e crescimento da economia portuguesa. Há, porém, desafios de grande escala, mormente nos países de língua oficial portuguesa (PLOP): a normalização das relações com Angola (após o aparente encerramento do “irritante” judicial que todos nós conhecemos); o acompanhamento eficaz das alterações no Governo da República da Guiné-Bissau; a parceria técnico-jurídica com o novo Governo de Timor-Leste. Convém também não esquecer que as eleições no Brasil serão já no final deste ano de 2018 e poderão não decorrer de forma ordeira, pois o ex-presidente Lula da Silva está preso, mas o seu Partido dos Trabalhadores fará dele um mártir e promete agitar das mais variadas formas esse escrutínio.

O desafio mais importante da Diplomacia Portuguesa, quiçá, é a forma como lidar em relação à política externa assumida pelo Presidente dos Estados Unidos da América (EUA), Donald Trump. Os EUA “rasgaram” a sua parte quanto ao acordo nuclear assinado com a República Islâmica do Irão, durante o anterior mandato presidencial, de Barack Obama, em que havia o compromisso da Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA) monitorizar o processo iraniano de transferir o enriquecimento de urânio para a Federação Russa. Tero Varjoranta, o chefe da AIEA, demitiu-se dois dias após essa decisão de Trump, tendo fonte da mesma agência garantido antes dessa demissão que o Irão tinha vindo a cumprir integralmente os propósitos do acordo.

Trump insiste em fazer exatamente o contrário daquilo que Obama fez, não importando tanto a matéria em questão, mas sim a assinatura de quem elaborou o despacho governamental em causa. O atual presidente dos EUA tem tido uma linguagem política ligada à “alt-right” (uma variação semântica de extrema-direita): “with us or against us” (connosco ou contra nós). Portugal é aliado dos EUA na Nato, mas nunca deverá fazer parte do clube de fãs de Trump (como o primeiro-ministro António Costa escreveu em entrevista ao Diário de Notícias, publicada este Domingo)…

Perante este contexto muito delicado, em que convém não esquecer a troca de agressões militares entre Israel e Irão, em solo sírio, nem as alegadas  estratégias russas de manipulação de informação, Portugal tem de ser um gestor de equilíbrios: na NATO, o Governo de Lisboa tem de cumprir com os seus compromissos; na ONU, tem de mostrar “inteligência emocional” pois deve assumir isenção na análise aos argumentos russos e norte americanos. Só com essa posição conseguirá manter António Guterres à frente da ONU, e com consequente relevância internacional.

Mas uma coisa é a diplomacia, outra é a política externa portuguesa. Apesar de serem matérias que cruzam em diversos contextos, tratam-se de circunstâncias distintas: a diplomacia age na negociação e não deve definir políticas decisórias, enquanto que a política externa se rege pela elaboração de estratégias de governança e definição de prioridades, como por exemplo, nas relações bilaterais. Portugal terá de lidar nos próximos meses com uma negociação árdua quanto ao orçamento comunitário, pois o ponto de partida para essas conversações já delineou que Portugal deverá perder em média cerca de 10% do valor de fundos comunitários de que era beneficiário até este presente momento. O “Brexit” leva a uma redução das verbas disponíveis para financiamento dos países com mais necessidade de apoio, e Portugal será aparentemente penalizado por isso, tanto no acesso aos fundos estruturais para a diversificação da economia, como para o apoio às zonas urbanas de grande densidade populacional, sem esquecer o “terramoto” inevitável no corte ao financiamento ao sector da produção agropecuária.

Portugal tem uma série de outros aspetos difíceis com que lidar: um deles tem a ver com perigosa perda de volume de negócios no turismo, que gerará menos “income ” financeiro para os cofres portugueses, o que levará a dificuldades acrescidas na gestão corrente dos negócios do Estado. Um outro dossier difícil terá a ver com a relação mais “fria” tida com países como a Suécia, em que Portugal deverá ter de rever a sua posição atractiva (sexy!) em termos fiscais para os reformados que decidam viver ou comprar casa em terras camonianas: o Governo de Costa e Centeno terá de escolher manter essa atitude “sexy” para com os reformados endinheirados da Europa, ou perder amizades dentro da União Europeia (UE), ainda sejam vizinhos distantes….

Portugal terá de fazer contas à vida: o que gerará mais dinheiro? Receber reformados da UE ou obter apoio desses países para perder o menos possível em fundos comunitários de coesão?