A Problemática da Dívida

Ultimamente, devido à vitória do Syriza na Grécia, tem-se falado muito sobre a dívida: pública, das empresas e das famílias. Pois bem, passemos então a uma breve abordagem sobre a problemática da dívida, para que todos nós nos esclareçamos melhor sobre este assunto.

Ora, então, se eu tiver um empréstimo de, suponhamos, 3.000€, para pagar em 36 meses, obviamente que não pago apenas 3.000 a dividir por 36, que seriam 83,33, mas provavelmente, cerca de 100,00 (pelo que a minha dívida deixa de ser apenas de 3.000€, mas passa a ser de 3.600€). O remanescente é o chamado “serviço da dívida”, ou seja, juros, comissões e impostos (e eventualmente, seguros de proteção de crédito).

O facto de eu pagar a minha prestação mensalmente, isso não significa portanto que a minha dívida se reduza na mesma proporção, uma vez que apenas parte dessa prestação corresponde a amortização de capital e a outra parte, para pagamento do serviço da dívida.

Imaginemos que eu deixei de conseguir pagar esses 100€ mensais e fui ao meu banco ou a outro, tentar “renegociar a dívida” ou procurar uma solução de forma que pague menos em cada mês. Negociada a dívida com o banco, consegui que este me fizesse outro contrato de crédito com um prazo mais dilatado, para o pagar o valor do empréstimo anterior e ficando com uma prestação mais baixa, nos seguintes termos: prazo de pagamento a 60 meses, dívida de 3.600€ (e não de 3.000€ como era no início). Se não houvesse serviço da dívida, aprestação seria de 3.600 a dividir por 60, total mensal de 60€, mas que provavelmente ascenderá a cerca de 80€, devido a juros e encargos com o novo empréstimo. Fico a dever ao banco 80€ x 60 meses, ou seja, 4.800€. De uma dívida que inicialmente era apenas de 3.000€! Embora eu pague menos mensalmente, já “inflacionei” a minha dívida em mais de 50%.

Ora, isto é o que se passa com a dívida públicam ou seja a dívida do Estado. Este pede financiamento para pagar dívida, dilatando prazos, mas fazendo a sua dívida aumentar.

O chamado “memorando de entendimento” safou o país de uma bancarrota, ou seja, fez entrar dinheiro no Estado periodicamente e durante cerca de 3 anos, sabendo que o juro seria muito inferior ao que pagaria nesse período por empréstimos externos à troika e sabendo ainda que não faltaria dinheiro para o funcionamento geral do Estado durante esse período.

Como sabemos, o Estado não gera lucros, nem tem que gerar, mas tem obrigações a cumprir, que vão desde os custos com o pessoal, com o funcionamento das instituições democráticas, com a saúde, com a educação, com as prestações sociais, com os gastos correntes e ainda com o pagamento do serviço da dívida e, eventualmente, se conseguir, amortização de dívida, autarquias locais, dívida das empresas públicas, etc.

No entanto, não nos podemos esquecer que, todos os anos, se as suas receitas não forem maiores que as despesas, há défice e esse défice é mais dívida para o estado pagar. A esse aumento de dívida, acresce mais serviço da dívida e por aí fora. Por exemplo, em 2014, o défice ficou (números redondos) em cerca de 1.800 milhões de euros (em cerca de 60.000 milhões de euros que o Estado tem de receitas anuais). Por isso, a única forma de o Estado aumentar as suas receitas sem aumentar os impostos é que haja crescimento económico, ou seja, aumento do PIB. Porque com o aumento do PIB, isso quer dizer que houve mais atividade económica e por isso o Estado recebe mais impostos em valor bruto, sem que os tenha de aumentar em termos relativos.

Estamos aqui a falar num cenário em que o Estado faz 0€ de investimento. Porque se o Estado investir em equipamentos, obras ou construções, terá que se endividar ainda mais. Por isso é que cada euro investido pelo Estado, tem que ser gerido com muito rigor e ponderada a sustentabilidade desses investimentos – situação não foi tida em linha de conta nos últimos anos anteriores à troika, nos quais o investimento em obras, muitas delas bastante questionáveis, vieram a verificar-se não sustentáveis, antes pelo contrário, vieram honerar as contas do Estado e endividá-lo ainda mais para as gerações futuras.

A outra solução para amortizar dívida ou pagar obrigações é vender património. O que tem sido feito até à exautão, uma vez que o Estado português já quase não tem nada para vender, senão alguns imóveis, a TAP, empresas de transportes – que ninguém quer – e mais nada.

Daí falar-se tanto neste processo de ajustamento que temos vivido, mas que tem sido muito mais duro do lado das famílias e das empresas, do que do lado do Estado, que permanece ainda mais gordo o que deveria, eventualmente. Onde se cortou nos últimos anos, foi em quase tudo, mas permanecem algumas mordomias que permanecem que, apesar de não representarem valores significativos, capazes de fazer notar-se na descida do défice, elas são essencialmente negativas em termos morais e éticos, perante uma população pobre e que sofre diariamente na cintura o aperto do cinto.

Por isto tudo é que o governo português não quer renegociar a dívida, uma vez que essa renegociação “em bloco” iria provocar – como na Grécia – um aumento exponencial na dívida e um hipotecar ainda mais gerações no futuro.

Por isso, om objetivo de cada estado não deveria ser apenas um défice de 3% (de máximo) mas sim trabalhar para que houvesse um superávite, ou seja, sobresse dinheiro. Porque só sobrando dinheiro (fazendo a diferença entre o que recebe e o que gasta) é que consegue verdadeiramente pagar a dívida.

Nós, nas nossas casas, no nosso orçamento familiar, o que fazemos quando estamos “apertados”? Primeiro, tentamos cortar nas despesas e controlá-las ao máximo, exatamente. E depois, se mesmo assim isso não chegar? Temos que aumentar a receita, certo! Como? Ou temos um aumento de ordenado, ou mudamos de emprego para um no qual ganhemos mais ou procuramos um segundo emprego, um biscate ou um rendimento extra numa atividade paralela. O Estado pode fazer isso para aumentar a receita? Não, não pode! Então? E quando vender tudo o que pode, onde vai buscar mais dinheiro para pagar a dívida? Só através do crescimento da economia ou do aumento de impostos. Se não quiser aumentar mais os impostos, então terá que criar condições para que aumentem as exportações, o investimento interno dos particulares e empresas ou do investimento estrangeiro e fomentar um saudável consumo interno das famílias e das empresas.

Porém, para que haja aumento do consumo interno, as famílias e as empresas têm que possuir rendimento disponível para investir ou para gastar em bens e serviços, por isso, o Estado não as pode sobrecarregar com impostos, senão não há dinheiro para gastar ou investir. Por outro lado, o consumo excessivo também não é benéfico para a economia, pois esse fator pode fazer aumentar as importações e isso não é benéfico para a economia ne para a balança comercial.

E isto é assim, a Economia funciona num ciclo, que pode ser virtuoso, se as apostas forem certeiras e as continhas muito bem feitas, mas pode também entrar em “expiral recessiva”, se houver exageros da parte de algum dos fatores. O melhor sempre é tentar o equilíbrio, assim como na nossa vida financeira pessoal.