A Propósito da recente vaga de calor …

Previa-se que no domingo começasse a chover e só parasse no sábado da semana seguinte.

O verão havia sido quente e seco e, excecionalmente, prolongara-se pelo outono adentro, no qual, tinham sido poucos os dias com chuva e, raras, as noites de ventania que o costumam caracterizar.

Subitamente, tínhamos entrado no outono e agora estávamos a encaminhar-nos para inverno e felizmente, devo confessá-lo, porque já estava farto do calor que torna o verão insuportável, apesar de dar às mulheres deselegantes um tom de pele que as torna atraentes. Estava saturado dele a bater-me na cabeça destapada, porque sou careca, até do peso ligeiro da roupa que carregava e só me apetecia despir, dos passeios que dava a pé e, noutras circunstâncias, com menos calor, no final me faziam sentir mais leve, farto do nível de humidade relativa do ar e até do meu próprio cheiro a suor, que era absolutamente insuportável se o não tentasse mascarar recorrendo a um desodorizante à base de aromas campestres.

Houve dias, em que desejei ser uma mosca para poder ir a todo o lado e, num cantinho enfiado à sombra, não podendo ser visto por ninguém, ficar sossegadinho sem ninguém a chatear-me. Neste momento, se não fosse um pedido exagerado, escolheria ser uma andorinha para, logo no final do verão ter voado daqui para fora, e só pensar em voltar na primavera seguinte, após ter passado umas longas férias num país distante onde o clima, mais adequado à minha natureza delicada, fosse menos hostil, tanto no verão como  no inverno.

Apenas conheço uma maneira de escapar ao calor, e não consiste em correr para fugir dele, mas em ir para a beira-mar e parado ou pisando a areia fina de uma qualquer praia de uma ilha semideserta, ir saboreando a ventania no rosto, estando sobretudo rodeado, por todos os lados, de belíssimas mulheres capazes de nos fazer crescer água na boca, nem que seja de coco servida num copo com gelo, de olhar pousado na linha projetada pelo horizonte, de preferência numa espreguiçadeira pousada na linha projetada pela sombra de um coqueiro, ao som das ondas batidas pelo vento ou das baladas de Toquinho e Vinícius de Moraes ou de Erasmo e Roberto Carlos ou de Chico Buarque, mesmo sem ser em parceria com nenhum dos seus habituais parceiros.

Nessa lassidão, se deve ficar, em minha opinião, durante o tempo que for permitido. E no meu caso seria até vir a minha mãe com um safanão despertar-me do sonho, acordando-me de manhã para ir trabalhar.

A chuva faz falta para tornar a terra mais fértil.

Eu posso rezar todas as noites para que ela venha depressa e ponha termo ao regime de seca.

Quando chover essa terra precisa de ser lavrada. É necessário vender o que ela produz.

Eu posso passar a ir mais vezes às compras e escolher exclusivamente artigos nacionais.

Para aumentar a produção é preciso recrutar mais gente para trabalhar.

Posteriormente, talvez eu venha a mudar de ideias e queira, quando passar a chover, que o calor regresse urgentemente e vice-versa.

Prevejo que isso possa suceder apesar de nem todas as previsões se concretizarem.

É o caso da previsão feita pelo Instituto do Mar e da Atmosfera deste final de semana, que anunciava chuva para todo o país

Hoje é segunda-feira e, do céu, onde não se veem quaisquer nuvens, ainda não caiu nem uma gota de água.