Quantos “sírios” vale um “francês”?

No título falei em sírios, mas poderia estar a falar de quenianos, etíopes, libaneses, liberianos, e muitos outros residentes de outros tantos países do 3º mundo. Tal como, falei em franceses, mas poderia falar em portugueses, dinamarqueses, alemães, e todos os Países que compõem a nossa casa ocidental. A questão no final de contas resume-se a geografia.

Dito isto, continua a pergunta, qual é a taxa de câmbio actual da vida a ocidente? Não sei, mas que nós demonstramos com as bandeiras na cara, as bandeiras nos monumentos, as bandeiras em tudo que tivesse uma superfície para as suster, que uma vida francesa tem uma taxa tremendamente superior à vida fora da nossa caixa de segurança, isso parece ser uma evidência.

Alguns dirão, que não será verdade, a perda de qualquer vida tem que ser sempre lamentada de igual forma, independentemente da área geográfica onde o seu corpo viveu ou se despediu dela. Porém, nunca testemunhámos uma reação deste género antes, não, enquanto a ação do EI não importunou a nossa maneira de viver, enquanto os refugiados não invadiram o nosso mundo, não vimos caras no facebook com as centenas de milhares de pessoas que foram torturadas, mortas, roubadas, pelo mesmo “Estado”.

É normal, diria até humano, pois a vida dum filho para um pai, terá uma taxa de câmbio superior a sete biliões de vidas, um verdadeiro amigo terá, por certo, o valor duma cidade inteira de vidas desconhecidas, e como é óbvio, a vida ocidental, a vida com que nós temos empatia óbvia, valerá mais do que a vida que nós não conhecemos.

O que não é normal, é sucumbirmos ao desejo, também ele humano, de ver nestes acontecimentos, uma oportunidade de reafirmarmos o altruísmo que julgamos ser a massa de que somos feitos, quando a nossa consternação, pelo menos neste caso, é baseada no mais puro dos egocentrismos individuais e ocidentais.

Este medo que todos nós sentimos, que nos faz agir da forma justa como atuámos nesta particular situação, tem toda a razão de ser, e não deve ser confundido com algo nobre, mas ser reconhecido como algo necessário à nossa sobrevivência. É o mesmo medo que nos ajudou a evoluir enquanto sociedade, é o mesmo medo que nos fez criar religiões e Deuses para não lidarmos com a morte absoluta, é o medo do nosso mundo ruir, o medo do finito.

Sim, porque é disso que estamos a falar, que o mundo lá fora esteja um caos, nós convivemos bem com isso, podemos não gostar, mas estamos habituados, como o nosso comportamento indicia. No entanto, quando atacam um de nós, além da empatia, existe um aviso, um aviso de guerra ao nosso mundo, ao mundo que conhecemos, e é aqui, na morte dos nossos, na morte dos nossos no nosso território, que a nossa consternação ganha alma, e não no nosso altruísmo.