Rainha D. Amélia – A Rainha do Povo

O dia 1 de Fevereiro de 1908 foi um dia marcante para a historiografia portuguesa, dado que assinalou o assassinato bárbaro de D. Carlos I e, também, do príncipe varão D. Luís Fíilipe. Para além disso, o regicídio de 1908 aconteceu na presença de D. Maria Amélia de Orleães, na Praça do Comércio.

Este acontecimento fatídico acontece derivado à progressiva tensão política em que pauteavam os partidos desde a Regeneração: o Progressista e o Regenerador. Mas hoje, vou relatar o que está por detrás de uma Rainha: uma mulher. A Rainha em destaque é D. Maria Amélia de Orleães, casada com Rei D. Carlos I e mãe dos herdeiros, D. Luís Filipe e D. Manuel.

O rígido protocolo monárquico não é imune à vertente emocional. A Rainha D. Amélia perdeu o marido e o filho mais velho no mesmo dia. Inconsolável, teve que velar os corpos na capela do Palácio das Necessidades.

 “A dor cobriu tudo. Esvaziou-me o Espírito. As recordações desapareceram, estou incapaz de chorar. Inerte.” (Notas Intimas, Cidadania Monárquica)

Depois dos dias de amargura teve que enfrentar a realidade política instável que pairava na época, sendo que, após a morte do Rei de Portugal piorou a cada instante. A Rainha teve que se apoiar no seu filho mais novo, D. Manuel.

A Monarquia estava, de momento, bastante fragilizada. D. Manuel era rei, mas não estava minimamente preparado para o cenário tenso da situação política portuguesa, apesar das suas tentativas em liberalizar um regime que estava muito fechado: a demissão do Primeiro-ministro João Franco, foi exemplo disso. Contudo, medidas como estas não tiveram o efeito esperado e, consequentemente, os republicanos ganhavam cada vez mais terreno e a Monarquia Portuguesa estava a definhar-se.

Passados dois anos do Regicídio, a 5 de Outubro de 1910, é implantada a República. Consequentemente, a Família Real procurou o exílio, primeiro em Inglaterra e depois em França. Durante a Primeira Grande Guerra Mundial (1914 -1918) esta rainha invulgar prestava auxílio aos que mais necessitavam.

Rainha Dona Amélia de Portugal, no exílio, em 1920, no Château de Bellevue, Chernay, França, Cortesia da Plataforma de Cidadania Monárquica

O seu espírito de bondade influênciou a corte portuguesa. Recuando tempos antes da 1ª República, em 17 de Agosto de 1889 convoca uma reunião na Câmara dos Deputados para constituir as bases formais para a criação da Assistência Nacional aos Tuberculosos, tendo em vista a erradicação da doença que afectava a sociedade da época. Das suas acções mais conhecidas, para além da já referida, estão a criação do Instituto de Socorros a Naúfragos (1892) e do Museu dos Coches Reais (1905).

Como bem disse Eça de Queirós: a Rainha era de uma ‘grácil e natural beleza que se debruça, espalha perfume, dispersa frescura, e logo, formosamente, retoma a sua elevação natural. A rainha tem esta expressão sentimental e anti-doutrinária da caridade portuguesa. É uma senhora de grande e dedicada esmola. E a sua esmola não baixa majestosamente do trono, numa salva, de alabardeiros. Ela própria a leva, sob um véu espesso, a todos os recantos, onde pressinta uma lareira apagada, farrapos tão rotos que já nem se remendam, a enxerga pisada pelo lento sofrer. (Eça de Queirós em Coleção Eça de Queirós Vol. XVIII).

De seguida entra o cenário da 2ª Guerra Mundial, sempre activa com o seu espírito de caridade na sua casa estabelecida em Chesney, França. Durante este período, durante o Estado Novo, António de Oliveira Salazar concedeu-lhe asilo político, no entanto, apesar de ter imunidade diplomática em território nacional, permanece em França. Nascida em parto prematuro, perde a sua filha, infanta D. Mariana Ana de Bragança em 1920. Mais tarde, em 1932, falece o seu único filho. D. Manuel II, em circunstâncias desconhecida. Em 1945, voltou a Portugal para visitar os túmulos dos seus entes queridos e da herança do seu filho mais novo.

Visita ao Panteão Real da Dinastia de Bragança na Igreja de São Vicente de Fora a 19 de Maio de 1945

A Rainha D. Maria Amélia de Orleães passou pelo Regicídio de 1908, passou pela queda da Monarquia Portuguesa e pela consequente Implantação da República, pelas Guerras Mundiais, mas nunca deixou se afectar pelas perdas. Marcada pelo espírito de caridade nesse mesmo ano, visitou a Assistência Nacional aos Tuberculosos, instituição criada em 1899.

Faleceu a 25 de Outubro de 1951 em França. Ficou sepultada no Panteão Nacional de S. Vicente de Fora, tal como sempre foi o seu desejo. Apesar de longe do país que a viu ser Rainha e Mãe, desejou sempre que depois da sua morte, o seu corpo viesse para junto da sua família, do povo que tanto amava e do País que tanto lhe custou deixar, tal como a própria Rainha fez questão de afirmar, nos momentos que antecederam a sua morte: “Quero bem a todos os portugueses, mesmo aqueles que me fizeram mal (…) Deus está comigo. Levem-me para Portugal”.

Em Portugal, o funeral da última Rainha de Portugal teve uma grande adesão do povo português. Reviu-se o carinho do povo. Para mais informações acerca do funeral, aconselho o visionamento deste vídeo, sem políticas à parte, revê-se o respeito pleno do povo português. Na sua arca tumular tem uma inscrição gravada que sintetiza a vida desta sublime Senhora, que falece aos 86 anos, incompreendida pela sociedade do seu tempo e quase “esquecida pela sociedade actual.”

“Aqui descansa em Deus D. Amélia de Orleães.

Rainha no trono, na caridade e na dor.”

É pena que não se destaque uma Senhora tão irreverente, à frente do seu tempo e tão elogiada pela sua caridade. Como bem disse, a última Rainha de Portugal no seu comboio na estação de Santa Apolónia: “Viva a Portugal!”

Termino com uma citação do sublime escritor Eça de Queirós, autor das grandes obras literárias do Romantismo português como Os Maias e O Crime do Padre Amaro, destacado por Miguel Villas-Boas da Plataforma da Cidadania Monárquica, que preconiza o seguinte sobre a Rainha D. Amélia:

“O que logo surpreende e cativa na Rainha é a sua completa e carinhosa nacionalização portuguesa; e, no entanto, bem sabemos, nós todos que lidamos com a história, quanto a flor-de-lis é flor difícil de enxertar! Mas aqui o lírio de França mergulhos tão profundamente a raiz no torrão português e tão gratamente absorveu a sua substância que, hoje, na forma, na cor, no aroma, já se não diferença de qualquer fresca e genuína rosa de Portugal. A Rainha ama a nossa terra como se dela houvesse brotado.”

Para saber mais sobre a Rainha D. Amélia, podem visitar a página da Plataforma da Cidadania Monárquica. Têm excelentes textos de opinião e elucidativos da Rainha D. Amélia, entre outras personalidades e momentos da História e da Monarquia de Portugal.