Uma reflexão sobre o desporto rei: Futebol – A Paixão do Povo

Perante a vitória de Portugal no campeonato da Europa de Futebol de 2016, este domingo que passou, e perante as alegrias espalhadas pelo povo, um pouco por todo o mundo, e também via mundo virtual, não posso deixar de escrever umas breves linhas que façam uma reflexão acerca deste tema: O Futebol.
O futebol é provavelmente a atividade desportiva que mais gente reúne à sua volta, gerador de emoções fortes, que ora apelam, lamentavelmente, à violência física e verbal, ora apelam (e ainda bem que existe este outro pólo bem mais positivo) à alegria e expansão dos afetos (como lhes chamo), tecendo uma verdadeira aproximação das pessoas, e tornando-se motivo de verdadeira apoteose das massas.
Em alguns países, donde se salientam, por motivos óbvios para quem acompanha o futebol mundial ao longo dos tempos, os países europeus e os países da América do Sul, destacando-se dentre estes, Portugal, Espanha, Brasil, Argentina, Inglaterra, França, Alemanha, Holanda, Itália, o futebol é verdadeiramente o desporto rei, o desporto que se constitui como uma intensa paixão dos povos…
Uma paixão popular que expande as suas raízes para os continente africano e asiático, sem dúvida, com muitos países amantes do futebol, e, na verdade, onde muitos dos seus povos se emocionam e expressam verdadeiro afeto sempre que um dos seus países “irmãos” ganha um grande campeonato.
Exemplos disto mesmo, são os povos de Angola, Moçambique, Cabo Verde e Timor, que se juntaram em verdade, e de coração, à festa portuguesa, no passado domingo, onde as alegrias expressas numa só língua, mostram o que de melhor o futebol nos traz, a aproximação entre os povos…a energia positiva que se espalha por toda a parte e que renova laços de paz e de união.
Um desporto rei, considerado por muitos a grande paixão popular, considerado ainda um dos maiores fenómenos sociais dos últimos anos…
Quando olhamos as massas que se unem em nome deste desporto, rejeitando separações por política ou religião, recusando divisões que se mostram inferiores à causa única que os une nesse momento, o futebol, percebemos com uma imensa clareza que algo de muito forte existe neste desporto, algo para além do que se vê, diria eu, que une gentes de todo o mundo, cantando a uma só voz…

Observem-se os adeptos de clubes, e analisemos o verdadeiro amor que têm ao seu clube de adoção…
Observem-se os povos que se unem em torno de uma final de uma copa do Mundo, ou de um campeonato como o da Europa…
Não há dúvida alguma de que o Futebol é um fenómeno grandioso…algo com uma capacidade suprema de juntar pessoas, em imensos e poderosos sentimentos e afetos.
Claro que me preocupa enquanto “estudiosa” destas coisas sociais e psicológicas, e não nego que me inquieta muito, a violência que por vezes se associa ao futebol, às claques, aos fanatismos que roçam a mediocridade humana naquilo que ela tem de pior – porque também existe o pior…
Incomoda-me naturalmente ações de violência gratuita, de humilhação, e mesmo a mera ofensa ou insulto entre pessoas, adeptos, povos, e mesmo em campo…
Considero inqualificável a ação escabrosa e degradante de alguns jogadores que se prestam ao que designo por vandalismo em campo – aqueles que lesionam outros jogadores, com dolo e intenção, seja por razões obscuras e que prefiro nem sequer mencionar neste texto, seja devido ao obscuro que têm na verdade dentro de si mesmos, apenas isso, como a inveja mal resolvida, a frustração, o medo do adversário, e outras coisas afins que fazem parte das trevas, dos sentimentos humanos negativos, que lamentavelmente também podem estar presentes nas pessoas – jogadores, adeptos, e na verdade qualquer pessoa…

Um destes gestos que designo como inqualificável, aconteceu contra o capitão da equipa portuguesa, no domingo passado…felizmente sem consequências de maior para um dos melhores jogadores do mundos, Cristiano Ronaldo, mas com uma consequência evidente de mancha e mácula, numa final que teria tudo para ser um jogo lindo, disputado com classe e bem jogado.
As faltas sucessivas da seleção francesa mancharam levemente a final, faltas marcadas e não marcadas (mas para bem do jogo diria eu, que até gostei do senhor do apito, de nacionalidade inglesa, pertencente a uma das ligas que mais apreciava quando via e acompanhava assiduamente o desporto rei, na verdade, e onde as faltas não são marcadas só porque o são, porque o jogo corrido, veloz e bem jogado, muitas vezes necessita que certas pequenas faltas não sejam marcadas…é honestamente a minha opinião…quando gostava e acompanhava futebol, a Premier League era uma das minhas de eleição, em muitos aspetos pela velocidade e ausência de paragens sucessivas por coisas menores; a par desta seguia sempre os campeonatos português, espanhol alemão e italiano. Também gostava de acompanhar as copas além-mar…e o campeonato de excelência do Brasil, a jogar sempre em grande estilo, com aqueles clubes que fizeram as delícias da minha infância, quando lia a banda desenhada do grande Zé Carioca…).
Mas, faltas à parte, a honra e glória da Alma Lusitana iluminou esta grande final, e ficou bem expressa no jogo, dentro do campo, fora das quatro linhas, e pelos seus adeptos e simpatizantes um pouco por toda a parte.
Os representantes de Estado não ficaram atrás, e a sua presença e as suas palavras, sobretudo as de Marcelo e as de Costa, fizeram justiça à seleção e ao povo que a ama.
Sim…é de amor que se trata…não tenhamos disso dúvidas…

Desiluda-se o intelectual ou “pseudo-intelectual” que despreza o futebol sem sequer o perceber, e que despreza o tema desta crónica, em si mesmo, só porque fala deste desporto rei e das massas que o seguem; desiluda-se aquela ou aquele que não quer dar relevo ao que de relevante o futebol tem: este deporto é um verdadeiro fenómeno social de massas – capaz de gerar violência e ódio, e de ser palco daquilo que de pior existe no ser humano, o racismo, a xenofobia, a homofobia, e outras tantas coisas nada positivas, e capaz de gerar e impulsionar afetos dos mais fortes que existem, alegrias partilhadas, aproximação das gentes e desses povos, num verdadeiro hino de amor fraterno que os une, em nome não de uma causa, mas a uma só voz…
Apesar de se poder classificar o futebol como um desporto com algum grau de violência verbal e física, sobretudo por permitir muitos momentos de palavreado menos adequado entre jogadores, muito contacto físico, corpo a corpo, e uma forte dose de liberdade de movimentos e ações em campo, ausência de regras demasiado rígidas (comuns noutro tipo de desportos mais rigidificados no “modelo” e posicionamentos em campo ou no terreno), e ainda porque não utiliza proteção física através de equipamentos ou acessórios que existem noutros desportos, não há dúvida de que o futebol possibilita e potencia o outro pólo de afetos positivos, como a camaradagem, a cumplicidade, o espírito de equipa, e a troca de afeto genuíno entre jogadores, adeptos e técnicos.
Este pólo positivo de uma mesma força de ação é aquilo que realmente importa salientar neste artigo de opinião, o trabalho do conjunto, a humildade na postura, a segurança e confiança apesar da humildade…Este foi um trabalho desta seleção e do povo português durante este campeonato.
Noutros artigos importa logicamente averiguar e perceber aquilo que de menos bom existe associado a este e outros desportos. Não só do ponto de vista social, mas também numa perspetiva económica, e até numa outra análise mais detalhada perceber os meandros e as teias de corrupção ligadas lamentavelmente ao desporto rei, como a outros, o uso e abuso das substâncias e o dopping, a ausência do fair-play, e uma panóplia de coisas lamentáveis que vão estando associadas ao desporto, para tristeza de quem ama honestamente o desporto, como se tratando do culto de um corpo são numa mente sã, do trabalho criador, e do esforço e dedicação do ser humano, o treino, a competição, que leva até ao limite a enorme potencialidade dessa máquina maravilhosa que é o corpo humano…o seu poder regenerador, o seu poder criador, e dessa potência divina que é a mente e aquilo a que chamo “alma” do ser humano – aquilo que o faz mover, a sua força de vontade, o seu espírito de sacrifício.

Por hoje não me importam, para esta crónica, (embora sejam aspetos sempre presentes para além da euforia e da alegria das massas e dos atletas porque são realidades incontornáveis, claro está), os aspetos políticos e económicos onde se tecem malhas tenebrosas em torno do desporto rei, e de outros, as apostas legais, as menos legais e as clandestinas, a parte que não se prende com qualquer sentimento humano que valha a pena falar aqui e agora, nem com desporto, e apenas se prende com o negócio em si mesmo.
Hoje importa, aqui, por um lado, enaltecer a força motriz que este desporto rei parece potenciar e a capacidade que ele tem, pela positiva, de elevar até ao limite o que é o afeto humano, fraterno, a uma só voz, quase sem explicação, sem olhar à razão, a voz do coração de um povo.
Por outro lado, detenho-me brevemente no outro lado da polaridade dos afetos humanos, tomando a consciência de que, fora do campo, e muito devido ao facto de que o futebol é um meio de expressão de identidades nacionais ou regionais/locais, por vezes canalizam-se através dele algumas formas de agressividade, muito negativas.
Alguns autores defendem que quando uma pessoa participa como adepta, num jogo organizado, ela permite-se frequentemente expandir várias emoções, muitas vezes reprimidas e oprimidas pelo meio social onde pertence na sua vida quotidiana (Ver trabalhos publicados de análise por Paim e Strez, por exemplo)
Nesta perspetiva, parece acontecer ao sujeito – adepto – perante o jogo, e junto de outras adeptas, e de outros adeptos, o ímpeto para demonstrar ou manifestar a sua identidade/personalidade, agindo de uma forma que apenas no coletivo lhe é permitida, sendo que isoladamente jamais se expressaria de igual forma. Assim, de acordo com estes autores, e a mim faz-me algum sentido, o eventual sentimento de impotência e frustração pessoal decorrente da opressão ou repressão do meio onde se insere o sujeito no quotidiano, parece encontrar uma forma de expressão direta nas bancadas do campo de futebol, diluindo-se o sentimento menos bom neste coletivo, no grupo.
Nesta linha de pensamento, Filho, um outro autor que aborda esta temática de forma muito ineressante, defende que o futebol apresenta uma dimensão muito positiva, associada ao espectáculo em campo, e à motivação e alegria das pessoas em torno do desporto rei. No entanto o autor salienta que a violência que traz consigo o futebol é um facto incontestável, e por exemplo na América do Sul, particularmente no Brasil onde estes e outros auores desenvolveram estudos, a violência associada ao futebol é noticiada frequentemente, e mostra que tanto em campo, entre jogadores, como nas bancadas dos estádios, entre os adeptos, muitas vezes a violência toma lugar e foi aumentando progressivamente ao longo das últimas décadas do século XX.
Isto é uma realidade também na Europa e nos restantes continentes, onde as formas mais destrutivas de racismo e xenofobia tomam lugar por exemplo, gratuitamente, e de forma inadmissível em contextos associados ao Futebol.
Neste campeonato da Europa de Futebol, a xenofobia e tentativa de humilhação das gentes lusitanas, em particular as que são ou foram emigrantes em França, foi noticiada e levada a cabo lamentavelmente até por quem dá voz a alguma comunicação social…Os franceses perderam, e humilharam-se nada mais nada menos do que a si mesmos.
Por outro lado muitas francesas e muitos franceses não se identificam com estes comentários e portanto, e porque desprezo a xenofobia, apenas critico as e os que o fizeram, não me interessando propriamente a sua nacionalidade…
Nunca se confunda patriotismo com nacionalismo: O primeiro é um sentimento elevado, que honra uma nação, que a defende e com ela se idenifica. O segundo liga-se a uma ideologia política purista, que deu nome ao partido de Hitler, por exemplo, e dá nome a vários partidos da atualidade, ligados à extrema direita, e muitos em ascenção pela Europa fora.

O primeiro – o patriotismo – eleva os povos que defendem o seu país de pertença e é compatível com abraçar todas e todos os que chegam a esse país, de passagem ou para nele permanecerem como cidadãs e cidadãos livres e repsonsáveis, com direitos e deveres. Esse sentimento permite a solidariedade entre povos, de forma genuína, e jamais oprime ou exclui, muito menos humilha quem veio de fora.
As palavras em tons de francês, embora sejam apenas as palavras de quem nelas se revê, e não de todo um povo (era o que faltava!), nada têm a ver com patriotismo…nada mesmo…
Foi um acontecimento em torno do desporto rei que deixou mácula…Mas que esta mácula não seja motivo para retirar o mérito justo da organização francesa, que foi excelente, de um imenso rigor e dádiva.
Falamos de uma nação sacrificada nos últimos tempos pelo terrorismo, e que não deixou de ser uma organizadora brilhante de um tão grande evento, onde nada falhou, nem a segurança, nem as condições. Mostraram a nação que são, onde a Liberdade, Igualdade e Fraternidade defendidas na sua bandeira e lembradas no seu hino, são o que mais ordena, e a pequenez de atos menores de um ou de outro coletivo ou de um ou outro dos seus membros, quer da organização, quer da seleção, são precisamente pequenos demais para o grande país que esteve por trás deste grande evento, como outrora Portugal também esteve, e bem organizou o campeonato da Europa de 2004.
Relativamente à xenofobia e racismo associados tragicamente ao Futebol, em vários momentos da história desta modalidade, e até agora lamentavelmente, diga-se que ela existe desde sempre, e é uma das formas mais cruéis de violência que a ele está associada.
Historicamente, ela tem estado presente no campo, tal como entre adeptos, e explica-se um pouco pela origem da modalidade, quando a mesma era jogada apenas por homens brancos e ricos, aristocratas, os únicos que a podiam praticar (como tantas outras o foram e algumas, infelizmente, assim permanecessem em alguns locais e zonas do mundo). O machismo associado ao meio também tem eventualmente as suas raízes aí, mas hoje existe a modalidade no feminino, com grandes jogadoras a serem destacadas, e a modalidade no masculino, sem dúvida a mais vista e a que se dá maior relevo em todo o mundo, “abriu” as portas ao público feminino, como se pode constatar em qualquer destes grandes eventos.

A “história” de que o “futebol não é para mulheres”, já “era” e é passado, seguramente. Necessitam no entanto de ser dados mais passos neste sentido obviamente, ao nível d comunicação social sobretudo, relatos, comentadores, etc, etc…Mas não vou por aí…não nesta crónica, nem agora. Fica a sinalização no entanto, também desta vertente, e do trabalho que necessita de ser feito a este nível.
Voltando às raízes do Futebol, lembremos o que diz Figueiredo, outro autor que aconselho a ler nestas matérias, quando relata que na década de 20, 1920, o futebol era um desporto de elites, considerado como sendo adequado apenas a uma elite que o podia praticar. A classe dominante era a dos brancos ricos, e portanto só a estes era permitida livremente a prática da modalidade.
Aqueles a quem chamavam de “negros” ou “mestiços”, e os designados por pobres e de classes tidas como “inferiores”, “oprimidos” pela classe dominante da época, não podiam praticar futebol profissional nos grandes clubes, nem sequer pertencer aos quadros dos mesmos.
Mesmo no Brasil, e este é um país de eleição e paragem obrigatória quando se fala do desporto rei e se estuda socialmente o fenómeno, onde o povo descende de muitos povos, em “tons” ricos de diferença e de várias culturas, os atletas “negros” e “mestiços” só podiam jogar em alguns clubes menores, dos subúrbios, nesta época…Diz-nos Figueiredo que um destes clubes era o Vasco da Gama, e que o clube nessa altura de subúrbio, tinha em mãos a preparação da equipa para destabilizar e destronar a hegemonia das classes dominantes e dos clubes de elite.
A preparação deu os seus frutos, e foi uma brilhante equipa do Vasco da Gama, onde homens pobres e humildes, “brancos” e “negros” e “mestiços”, (felizmente nada preocupados com a melanina contida na pele de cada um deles, nem com o dinheiro que cada um não tinha), jogavam em uníssono, com vista a um objetivo comum, que acabou por conquistar em 1923 o campeonato carioca da Primeira Divisão. Foi a primeira vez que o Vasco da Gama disputou o campeonato carioca da Primeira Divisão, e sagrou-se campeão. Um feito que daria um novo ímpeto popular ao desporto rei.

Por todo o mundo o desporto tornou-se rei porque precisamente deixou de ser um desporto de eleites privilegiadas e passou a ser um desporto do povo, jogado por gente humilde ou não, por gene de qualquer “cor de pele”, e visto e amado por todos.
Infelizmente os traços marcantes das suas origens e das suas raízes ainda aparecem de quando em vez, e têm de ser combatidos ao longo do tempo, com inteligência e amor entre iguais.
A pressão tem de ser imensa, e a comunicação social pode e deve ter um papel pedagógico extraordinário nesta mudança que se vai fazendo, a custo e morosamente.
Vitórias como a que Portugal conseguiu este Domingo, depois dos comentários xenófobos de que as gentes lusitanas foram alvo em Paris, silenciam com elegância e muito nível as “elites” que se julgam mais gente do que outras e do que outros.
Silenciam e bem.
O Futebol é muito superior a estas coisas pequenas, quer como Desporto em si mesmo, quer como fenómeno social de elevado poder de influência e de aproximação dos povos e das culturas, e, mais ainda, pode até ser interpretado num sentido bem mais profundo ao nível psicológico e das emoções.
Alguns trabalhos vão buscar a Psicologia simbólica Junguiana, da qual sou fortemente “adepta”, e interpretam o fenómeno psicológico do Futebol como se tratando de um poderoso sistema simbólico, de elevado valor pedagógico para etsruturar as consciências, a individual e a coletiva, com o Arquétipo da Alteridade, ou seja o arquétipo da Democracia.

Desta vez não se fala só do ponto de vista das massas, e sociologicamente mas também do sujeito psicológico, que encontra no futebol um ritual coletivo capz de fazer elaborar no conjunto a agressividade, a competição, a ambição da vitória, enquanto em simultâneo serve de função coordenadora da ética, capaz de absorver frustrações, sobretudo quando das derrotas.
Deste ponto de vista, com o qual estou de acordo, o Futebol pode ser, (e é-o segundo alguns autores dentre os quais destaco o psiquiatra brasileiro Carlos Byington, que tem um trabalho publicado fantástico sobre Arquétipos e Futebol, e que aconselho a quem estiver mais dentro desta área), um ritual pedagógico da alma coletiva, se permitem o termo junguiano.
Uma paixão do Povo, mas também de cada pessoa, uma verdadeira pedagogia das Emoções, onde através dos jogadores, da bola (esfera perfeita), da vitória e da derrota, cada adepta e cada adepto vivenciam simbolicamente, e com forte carga emocional, formas criativas de cultivar, educar e conduzir as próprias emoções, conferindo-lhes novas e diferentes orientações, absolutamente sublimadas, se tudo correr bem.
O poder do Futebol é de tal ordem que ultrapassa todas as fronteiras, une homens e mulheres, e aproxima os povos.
A história que vos deixo para finalizar esta crónica de reflexão que hoje vos trago, e que já vai extensa, remonta a 1969, durante a guerra civil do então designado por Congo Belga, e é real.
Relata-se pois que as duas fações inimigas em guerra decidiram parar as hostilidades, e fizeram tréguas durante um jogo importante onde Pelé, o rei Pelé como lhe chamavam, iria jogar. Assim foi.
Naquele momento, fez-se Paz entre os homens…E esta é mais uma importante glória, imensa, deste desporto rei.
Outra glória é precisamente a de um desporto que se impôs às elites que o praticavam quase em exclusividade, como rei dos pobres, dos oprimidos, e rei dos ricos e das classes dominantes. Uniu classes porque a elas se impôs, porque nas quatro linhas o mérito dos jogadores não olha à sua cor de pele, nem ao seu estrato sócio-económico, porque alimentou os sonhos de muito menino pobre, e a alguns elevou-os a um lado da sociedade que de outra forma nunca os reconheceria, e que pelo futebol, os admira…

O Futebol é rei e é feito de gente de verdade, muitas vezes de origens pobres e que no futebol viram a sua vida transformar-se em absoluto, contra todas as marés que pareciam conduzir os seus destinos…
A glória deste desporto de todos e de todas, passa por grandes nomes, de homens de origens humildes, muitos dos quais, se me permitem o reparo patriótico, que falaram ou falam em língua portuguesa:
O Rei, Pelé, que dispensa apresentações, brilhante atleta que deu voz ao Futebol no mundo, e sempre pelo Brasil, e Garrincha (e desculpem mas jamais poderia deixar de fazer referência a este grande jogador que teve a sua glória durante dez anos de competição, associado sobretudo ao Bota Fogo. Proveniente do meio operário, e nem sempre estimado pelos seus…vida árdua, de fim também difícil…tenho de lhe prestar a justa homenagem. As suas pernas, absolutamente “tortas”, fizeram história pelo uso que Garrincha lhes deu – absolutamente brilhante. Diz-se mesmo que algumas das suas técnicas em campo seriam impossíveis, do ponto de vista da física, salvo pela particularidade física das suas pernas – curioso o que podemos fazer com aquilo que temos…).
Eusébio, alma “afro-lusa”, símbolo do futebol de alto nível desde 1966, razão de união de povos, dispensa apresentações, comentários, e a vitória deste Euro seguramente o deixaria numa imensa felicidade…
Pelé, Eusébio, Maradona, Figo, Zidane, Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho, Cristiano Ronaldo, estarão sempre entre os melhores do mundo, dentre outros, seguramente, que o foram e que não nomeio aqui…
Todos eles com vidas nada fáceis…com o Futebol a elevá-los mais além…Promoveram o Futebol do Povo e a alegria entre milhões no Mundo…
O nosso capitão, campeão pela Liga espanhola também este ano, Cristiano Ronaldo, que fez chorar milhões no passado Domingo, teve uma atitude louvável em campo e fora dele, no tempo de jogo.
Muitos outros nomes, imensos…e muitos anónimos para o mundo, mas com o coração e a alma sempre ligadas ao futebol…
A glória do Futebol é esta…perdoem-me os que acham que o futebol não presta…ou que é só para os homens, ou que é para quem não lê…
O futebol dos tais portugueses discriminados e humilhados por alguns franceses nos últimos dias – as empregadas de andares, os homens de bigodes farfalhudos, os padeiros…
Fez-se justiça. O Futebol é uma festa do Povo, onde me incluo, honrosamente.
Sou mulher, por acaso sou psicóloga, mas podia ser empregada de andares, ou podia ser um homem de bigodes farfalhudos ou padeiro…Por acaso não sou…por acaso escrevo…e leio…Escrevo poesia até…
Mas os meus iguais são todas e todos estes que alguns “pseudo-intelectuais” decidiram ostracizar…
Por acaso ouço música clássica…mas não me revejo nos comentários nocivos de quem reprime ou oprime aqueles que ouvem música popular…portuguesa neste caso…Era o que faltava. Cada pessoa é livre de ser e gostar do que quiser.

Somos iguais entre iguais, com diferentes gostos e caminhos, e vidas…umas mais sofridas do que outras…
Sou uma cidadã do mundo…considero…mas sou também portuguesa, de alma lusitana…tal como as empregadas que emigraram para França outrora, os homens de bigodes farfalhudos, os padeiros…Como o povo que saiu à rua…que encheu as praças das cidades.
Somos gente de verdade, de alma e de coração cheio…
Posso até não concordar com os maus modos ou costumes que por vezes aparecem associados a estas coisas, e não gosto mesmo, é verdade. O que jamais posso permitir sem contestar é que diminuam ou humilhem as pessoas…e estarei sempre ao lado das pessoas que representam o seu país, que também é meu, no meio dessa “pseudo-elite” francesa que os tratou de forma reprovável e inqualificável.Tratou-nos a todas e a todos de forma errada.
O Futebol é do Povo…Essa é a sua maior glória.
Domingo e mesmo ontem cantou-se em tons de português e de alma lusitana, entre etnias e cores, apenas a Alma e o coração cheio…A única padeira de que me lembrei foi a de Aljubarrota…
Desculpem a extensão do texto… e grata, muito grata, a quem o leu! Tenham uma boa semana!