Retrospetiva ou Balanço de 2014 aos factos que não ocorreram

Com o ano perto do fim, vulgarmente se ouve dizer que é hora de fazer um balanço ao que no decurso dele de bom e mau aconteceu…estejam à vontade, senhoras e senhores, demorem o tempo que vos apetecer, desde que no final vos reste algum para ler as linhas que escreverei em seguida.

Prefiro falar-vos, não desses factos que andaram à boca-cheia nos órgãos de informação enchendo páginas nos jornais que subsistem à custa das receitas obtidas da publicidade que fazem na edição online e marcaram a vida nos planos sociocultural, desportivo ou político-económico, mas dos que por um capricho do destino podiam ter tido lugar e se tivessem ocorrido ninguém hesitaria em classificá-los de mais interessantes, relegando aqueles para uma posição secundária.

Falo, por exemplo, da brilhante vitória obtida pelo Benfica na final da edição deste ano da Liga Europa, uma espécie de prova destinada a compensar pelo desaire os adeptos das esquipas que prematuramente foram afastadas da principal competição entre clubes do velho continente chamada Liga dos Campeões, conforme sabem. Na final, disputada na Arena de Amesterdão, num piso que estava em tão bom estado como um relvado onde se pudesse estender uma tolha e fazer um piquenique, a formação lusa, onde habitualmente pontificam menos jogadores portugueses do que nas equipas que defronta, derrotou a do Sevilha que fez alinhar de início alguns que já passaram no nosso campeonato. Um deles, e o que esteve em maior destaque pela negativa, foi o guarda-redes Beto, internacional A que já defendeu a baliza do F.C. Porto e foi por essa razão uma aposta do treinador que o contratou, lembrando-se dos bons elementos que por esse clube têm passado para jogar naquela posição. Tivesse ele a leveza de outros tempos e talvez voasse a tempo de impedir que resultasse em golo uma bola rematada do meio-campo adversário por um defesa que tentava aliviar as sobras de um contra-ataque. Também foi dele a culpa de uma má interceção a um cruzamento da esquerda que originou um pontapé de recarga em direção ao fundo da baliza. Abanaram as malhas e certamente sofreu um abalo a confiança que nele depositavam os adeptos em que fosse um bastião na defesa dos terrenos que pisava. No terceiro golo sofrido, no espaço de vinte e cinco minutos, calculou mal a trajetória de uma bola que passou rente ao pé e viu-a anichar-se nas redes onde quase não chegava de tão pouca força com que foi para si passada por um companheiro. Foi um bom jogo, e no final treinadores e jogadores de ambas as equipas concordaram em que bastou ao Benfica fazer quarenta a cinco minutos à F.C. Porto para arrecadar um troféu que faltava ao seu vastíssimo acervo museológico. Na segunda parte houve mais dois golos na baliza espanhola, mas Beto, que foi tomar banho mais cedo, ficou isento de culpa porque o treinador inteligentemente substituíra-o ao intervalo. Não pesa sobre esta predileção que tenho pelo jogador, o facto de ser benfiquista mas admito que do novo treinador da Seleção Nacional passei a gostar um bocadinho menos quando soube pelos jornais que tencionava continuar a convocá-lo para os jogos de apuramento com vista ao Europeu de França.

O segundo acontecimento de que venho falar-vos, é da irrevogabilidade do ministro Paulo Portas dezasseis meses após ter sido anunciada causou estragos, ao provocar a demissão de funções do Executivo do qual fazia parte, como líder da fação minoritária. Mal se soube da notícia pelos órgãos de comunicação social, que aventavam datas para a realização de novo sufrágio, o povo, que embora inicialmente não tenha reagido bem às medidas de austeridade que visavam dotar o Estado de dinheiro para fazer face à crise acabou por compreender que era essa a única via para vir a recuperar a credibilidade externa, acorreu aos magotes à escadaria do majestoso edifício da Assembleia da República onde um conjunto de leões de pedra deitados montando sentinela, escutava pacientemente os cânticos de apoio à coligação encabeçada por Passos Coelho e eram audíveis a mais de cento e cinquenta metros. Ouvia-se o nome do Primeiro-ministro como o de quem governa e vê reconhecido o esforço do seu trabalho, tanto pela classe trabalhadora como por aqueles que os empregavam. De fora da capital, vinha certamente um contingente de homens trajados com as vestes de sair para o mar nos dias de faina. Eram pescadores munidos de diversos acessórios como redes de pesca e boias, tendo ao lado deles as varinas mais jovens que empunhavam a canasta vazia à cabeça distribuindo sorrisos aos rapazes que olhavam embevecidos para elas não desdenhando o prazer que lhes daria baloiçar nas ondas das suas sete saias. Perto delas, as mulheres mais velhas, vestidas de negro pela morte de algum familiar, davam as mãos formando um cordão humano que terminava em u, e choravam de semblante carregado como no dia em que por algum daqueles homens já tinha chorado com medo de que num dia de mar alterado o mar os levasse e não fizesse regressar com as redes cheias do peixe que depois de venderem na lota é que permitia o seu sustento. Mais abaixo, avançava um grupo de militares empunhando a bandeira nacional e noutra de gente vestida à civil era exibida uma tarja com palavras de ordem favoráveis ao Governo, mas as que mais alto e mais vezes eram repetidas em uníssono por essa fação de apoiantes eram as que resultavam do seu desejo de que o presidente do CDS-PP reconsiderasse no que anunciara e aceitasse prolongar o vínculo com o PSD, concorrendo coligado com aquele Partido às eleições de 2015, justificando recuar na sua decisão para agradar ao povo de cuja vontade se considerava, desde o tempo em que era somente deputado, um dos mais legítimos representantes. No lado oposto da Praça, mas não no sentido em que tinham saltado a barricada para o lado contrário, havia um grupo de cidadãos que se mantinha calado, como se fossem espetadores atentos ao desenrolar dos acontecimentos num filme com contornos de telenovela porque eram imprevisíveis e impossíveis de prever quando iriam terminar. Compunham-no maioritariamente idosos de ambos os sexos deleitando-se ao som da música pimba que emanava de um carro que circulava de vidros abertos. Este, era a versão melhorada, com eficácia comprovada na melhoria do sistema áudio, de um modelo com mais de trinta anos de uma marca alemã que há outros tantos satisfazia pessoas de todas as idades em mais de mais de quarenta países. Levava ao volante um rapaz dos seus vinte anos, de braço tatuado que acenava a toda a gente como se fosse por ele que tantas pessoas se tivessem decidido manifestar em sinal de apoio. Tão depressa acelerava como desacelerava o carro que nem por efetuar curvas a uma velocidade que andando em linha reta podia oferecer perigo, a polícia mandou parar. E foi só quando o sol, que entrava na curva descendente quando vieram os primeiros discursos a valer, se estendeu para lá da linha do horizonte, devolvendo ao dia em tons cinza a solenidade das festas em que eram os parlamentares que se reuniam para as comemorações oficiais dos feriados que assinalavam a liberdade, que as pessoas começaram a desmobilizar, retornando às suas casas onde ficariam a saber em primeira mão pela televisão que o resultado da gigantesca onda se solidariedade que percorreu o país unindo-o de norte a sul pelo mesmo ideal, fora a permanência em funções do Governo, com o voto de confiança do Presidente da República de quem raramente se conseguia perceber se estava do seu lado.

Por último, gostaria de recordar os números de 2014 relativos à corrupção em Portugal, que nos colocam na invejável situação do conjunto de países desenvolvidos onde ela menos se faz sentir à escala mundial. Efetivamente, tivemos zero indiciados em outros tantos Processos instaurados pelo Ministério Público; o que deu em zero condenações, zero infrações puníveis, zero detenções, zero tentativas de branqueamento de capital, zero suspeitas de extorsão, sero lavagens de dinheiro, zero fraudes na insolvência de empresas, etc.

Apresentei-vos resumidamente, alguns factos que importaria realçar se viessem a ser noticiados em qualquer país do mundo, sobretudo naqueles onde chegou a diáspora portuguesa. Gostaria de ouvi-los pela voz de uma jornalista simpática que apresentasse o primeiro bloco noticioso que não começasse e acabasse abordando o mesmo tema. Mas não me ficaria por aqui. Para me sentir realizado, também de todas as pessoas em geral gostaria de ouvir dizer que eram mais felizes por terem concretizado os seus sonhos. Eis a razão pela qual a todas elas, sem exceção, desejo um Feliz Ano Novo, com carradas de saúde e sorte, além de muito talento, a quem achar que este basta para com o esforço do seu trabalho ser bem-sucedido, sem necessitar de tê-la, uma vez por outra, do seu lado.

UM FELIZ 2015 PARA TODOS!