Todo o elenco de luxo do filme reunido

Ruben Alves e «A gaiola dourada» – Rogério Medeiros

Todo o elenco de luxo do filme reunido
Todo o elenco de luxo do filme reunido

Ruben Alves foi o entrevistado do programa «Bairro alto» de 28 de setembro, a propósito de «A gaiola dourada», a sua primeira longa-metragem que é um sucesso de bilheteira, o filme mais visto em Portugal até ao momento em 2013, acumulando já desde a sua estreia mais de 720.000 espetadores. As pessoas estão a acorrer aos cinemas para verem o casal Maria e José Ribeiro, emigrados há mais de trinta anos em França. Ele é maçon, ela é concièrge, dando ambos prova de uma fidelidade extrema aos patrões. A segunda geração, aqui representada pelos filhos Pedro Henrique e Paula, está bem integrada mas ainda assim manifesta o receio de como pode ser vista ou recebida em certos meios tendo em conta que são filhos de emigrantes. Paula namora o filho do patrão do pai e sente-se insegura quanto a isso. O filho tem uma namorada mas mente quanto à verdadeira ocupação do pai, pois tem vergonha do estatuto social da sua família.

Em França o filme foi visto por 1,2 milhões, portugueses ou luso-descendentes com certeza na sua maioria. Mas não faria mal a muitos franceses vê-lo, para ficarem a conhecer o nosso modo de vida lá, a nossa humildade e lealdade. O desconhecimento dos franceses relativamente a Portugal e ao nosso povo será comparável ao da personagem espanhola, que confunde o nome «Salazar» com o de «Alcazar», imagine-se, o nome do General das histórias de Tintin. Mas na realidade é assim, como o facto de achar-se que o fado é flamenco.

O filme não poderia deixar de ser autobiográfico até certo ponto, pois Ruben Alves é ele próprio descendente de emigrantes há três décadas em França. Nasceu em Paris em 1980. Nos pais, como na generalidade dos emigrantes portugueses, observou uma dedicação excessiva ao trabalho, o intento de amealhar sempre mais, sem aproveitar a vida. Mas é-se feliz assim, pois é este o estilo de vida que se conhece. Da emigração dos anos 70, para longe da ditadura que vigorava entre portas, considera que ficou uma marca. Esta ideia de que «vamos ser discretos, não fazer barulho, para não sermos expulsos». Os outros povos reivindicavam muito mais, embora os nossos também tivessem razão de queixa, a viverem sem água e sem luz, nos conhecidos «bidonvilles».

Esta resignação, aceitação do bom e do mau, mas ao mesmo tempo este amor à pátria, ficam bem expressos no verso «Das mãos de Deus tudo aceito / mas que morra em Portugal», que Catarina Wallenstein tão bem canta no filme a partir de «Prece» de Amália Rodrigues.

Ruben Alves e o seu amigo de infância Hugo Gélin – produtor de «A gaiola dourada» – em jovens já faziam filmes a brincar. Escreviam o guião, representavam, «realizavam». Ruben Alves também é ator profissional. Frequentou a escola para atores e tem trabalhado sobretudo em TV. Em França não há tantas telenovelas como em Portugal, a tendência é para fazer séries com grandes guiões. Mas balançado entre um amor e o outro, a realização preenche-o mais. A sua primeira curta-metragem data de 2000-2001 e é sobre o primeiro dia do euro.

«A gaiola dourada» nasceu em Portugal. Ele estava em Lisboa. Nessa altura tinha em mente um outro guião: a história de um expatriado francês em Portugal, que vive um choque cultural ao constatar quão o modo de vida português é diferente do francês, sobretudo se atentarmos no desprendimento familiar francês. Foi Hugo Gélin que o incentivou a «mudar a agulha».

Ainda bem. O filme resulta numa fotografia interessante de nós, portugueses, a viver em França. O sentido do trabalho, o instinto de poupança, a simpatia, o companheirismo, a união familiar, uma certa subserviência, a mistura das duas línguas, o omnipresente bacalhau, os palavrões, o futebol, as férias em Portugal…

Tudo isto Ruben Alves viveu e terá observado entre os seus, o pai oriundo de Guimarães e a mãe com origem em Trás-os-Montes. Só não é autobiográfica a herança de uma quinta no Douro, aspeto que é o elemento motor da história. A partir daí, a família portuguesa radicada em França desde o final dos anos 70 deverá partir ou ficar? O filme tira partido deste jogo de expetativas junto do público, mas nunca chega a ser um filme de excelência.

Rogério MedeirosLogoCrónica de Rogério Medeiros
O Pequeno e o Grande ecrã
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