Ruído. ruído e mais ruído! – João Cerveira

Está cada vez mais provado que a comunicação social é o quarto poder.  E como grande parte da opinião pública tem memória de peixinho de aquário, aquilo que a comunicação social diz torna-se verdade, independentemente de tudo o que possa ter acontecido ou que tenha sido dito anteriormente. E os políticos sabem disso. E usam isso.
Reparem que, se não fossem as redes sociais, ninguém se lembrava do que o actual chefe de Governo, na altura líder do maior partido da oposição, criticava e de como o faz agora, de forma agravada. Porquê? Porque isso não vende jornais, não cria audiência. Então não é noticia. No momento, só é noticia o que cria audiências.
Reparem como toda a gente esqueceu do que Cavaco fez (o dinheiro que gastou, como contribui com os seus amigos e ex colegas de governo para a criação do BPN, a maior fraude bancária de sempre, como fez a privatização da PT, empresa que hoje gera milhões, etc) e elegeram-no por dois mandatos como Presidente da República. Mas se perguntarem, ninguém vai dizer que votou nele.  Reparem como toda a gente se esqueceu de que Guterres criou o rendimento mínimo garantido, que ainda hoje sustenta muitas famílias  mas com uma total ausência de controle, que qualquer um o pedia e recebia e lesaram o Estado em milhões. Hoje só lembram o Guterres como Alto Comissário para os Refugiados da ONU. Ninguém se lembra que Durão Barroso, com Manuela Ferreira Leite como Ministra das Finanças, iniciou cortes cegos no Ensino Superior. Só recordam Barroso, o presidente da Comissão Europeia. Ninguém se lembra que os jornais noticiaram, na altura, que Pedro Santana Lopes nomeou quase tanta gente em 6 meses como Primeiro Ministro do que Durão em cerca de 2 anos. Neste momento, só se lembram de Santana Lopes o provedor da SCML e comentador de TV.
Mas toda a gente lembra o que o anterior Governo fez. Mas só o que fez mal. Porquê? Interessa ao actual e vende jornais. Conhecem o E-fatura? Aquele sistema online de registarmos facturas directamente nas finanças? Conhecem o Segurança Social Directa, o site da segurança social que evita deslocações aos serviços para coisa tão simples como a prova escolar ou verificar os descontos? Conhecem o portal das finanças, onde podem registar o IRS, entre outros documentos que, antes, tinham de estar horas numa fila? Conhecem crianças de famílias carenciadas que, se não fosse o e-escolas, nunca teriam computador para os trabalhos da escola? Tudo isto não seria possível, se o governo anterior não tivesse modernizado a administração pública. Se isso custa dinheiro? Claro que custa. Se foi bem aplicado? A meu ver foi. Então o que falhou? O que falhou foi terem escolhido nacionalizar o banco fraudulento dos ex governantes sociais democratas. O que falhou foi terem tido parte do mandato de grande coragem, de modernização do Estado, de legislação para limitar o poder daqueles que se aproveitavam dos cargos públicos para seu proveito próprio (aqueles que acumulavam ordenados e pensões, que acumulavam vencimentos em vários cargos públicos – exemplos de vereadores que também eram administradores executivos e não executivos de empresas municipais -, etc), para uma segunda parte em que sucumbiu às sondagens.
Mas perguntaram agora: o que é que isso interessa se deixou o défice que deixou? Pois bem, mas todos recordam que ele deixou défice – porque é recordado constantemente – mas, se perguntarem, ninguém sabe porquê. Se vasculharem bem em noticias antigas, vão ler o Passos Coelho, líder da oposição, a dar uma série de razões para culpar o governo de então da situação do país, negando responsabilidade a factores externos.  E agora? O que é que ele faz? Justifica-se com as mesmas razões que anteriormente negou serem verdade em relação ao anterior.
E o que a faz a comunicação social? Corrobora com esta situação.  Já vos perguntaram porque é que a comunicação social mostrou só parte das declarações de Belmiro de Azevedo sobre os salários nos noticiários da manhã e só as declarações completas no noticiários da noite,  deixando a opinião pública em alvoroço até ser esclarecida no final da noite sobre o porquê daquelas declarações? Já vos perguntaram porque é que há tanto alvoroço em relação a Sócrates comentador de TV e não houve em relação a Manuela Ferreira Leite, Paulo Rangel, Pedro Santana Lopes, António Vitorino, Lobo Xavier, Marques Mendes, João Galambas, entre outros políticos e alguns ex-governantes quando se tornaram comentadores de TV? Já se perguntaram, porque é que se fala tanto de tanta coisa e nunca mais ninguém questionou a licenciatura de José Sócrates?  Porque se o fizessem, teriam de questionar a de Miguel Relvas também e, apesar de terem anunciado um inquérito, nunca ficámos a saber as verdadeiras conclusões, sequer se foi terminado. E se há tantas dúvidas em relação ao anterior governo, porque é que a Procuradoria Geral da República só investiga o Governo Regional da Madeira e não investiga também o Governo – este e os anteriores – da República? Porque Alberto João Jardim se tornou incómodo para este os sociais democratas, é a minha convicção.
A todos aqueles que me lêem peço que, depois de pensarem bem no que leram, façam a vossa própria introspecção. Pensem no que leram e viram há uns anos e/ou meses atrás e comparem com o que se passa agora. Podem não concordar com tudo o que escrevi, mas decerto vão concluir de que somos levados pela comunicação social (intencionalmente ou não) a acreditar naquilo que há meses era pura ficção (ou vice versa) por puro calculismo político. Temos de começar a pensar mais pela nossa cabeça e menos pela dos directores e editores dos meios de comunicação social.

 

 

Crónica de João Cerveira

Diz que…