Segurança alimentar da UE – Nuno Araújo

Inicio esta semana a análise às eleições autárquicas deste ano, incluída sempre na parte final da minha crónica semanal.


Segurança alimentar da UE: a política do medo

Se a segurança alimentar na UE deve orgulhar os europeus, essa mesma fiscalização europeia pode ter instalado alguma desconfiança nos consumidores do “velho continente”. Na senda de obter o preço mais baixo do mercado, vulgo dumping, redes de transacção de carne, nomeadamente de cavalo, só puseram “a nu” o quão elaboradas são essas “malhas de negócio”, e que até os distribuidores raramente conhecem os produtores e a proveniência do material com que trabalham. Daí que se tenha vendido carne de cavalo, tida como sendo muito mais barata do que a carne de vaca, logo oferecendo preços de lasanhas, por exemplo, mais baixos.

As sucessivas notícias que nos têm chegado de produtos alimentares contendo substâncias nocivas para os consumidores são já mais que muitas, e podem bem ser um caso prático da teoria filosófica de Thomas Hobbes acerca da política do medo, como sendo instrínseca à natureza humana. Senão, então como devem os consumidores reagir à notícia do regresso das farinhas de origem animal (banidas desde 1997), para alimentar peixes de aquacultura?

Mantendo o foco no essencial, lembremo-nos da situação das tartes de chocolate contendo vestígios coliformes e das almôndegas confeccionadas com carne de cavalo pelo IKEA; a tão “badalada” crise da carne de cavalo, presente em produtos que garantiam ter 100% de carne de vaca; na zona dos Balcãs foi detectado leite de vaca contaminado com aflatoxina, uma substância cancerígena; e agora, mais recentemente, o escândalo das alfaces italianas que foram contaminadas por veneno de ratos, e vendidas na Alemanha – no entanto, e felizmente, todos os lotes de alfaces foram destruídos prontamente.

Refira-se, ainda, a situação que pôs em “cheque” os talhos portugueses: o estudo da DECO, que identificou quase todos os talhos analisados como utilizando determinados produtos químicos e nocivos à saúde humana, por forma a conferirem melhor aspecto à chamada “carne vendida a granel”.

Todas estas situações têm, evidentemente, consequências sociais, económicas, financeiras e políticas. Uma primeira consequência social prende-se, naturalmente, com a falta de confiança que o sector alimentar merecerá doravante. Não será difícil imaginar que para a maior parte dos consumidores, mais vale evitar comer lasanhas congeladas do que arriscar levar “gato por lebre”. As consequências económicas e financeiras são lógicas: menos consumo leva a prejuízo das empresas transformadoras de carne, aquelas que produzem lasanhas congeladas. No entanto, a macroeconomia não deve sair “beliscada” sequer, pois se o consumidor pode optar por poupar dinheiro não gasto em lasanhas, também o pode gastar noutro produto alimentar.

Se assim fôr, os estados-membros e respectivos governos podem estar descansados, pois a economia no seu todo não é abalada, sobretudo devido à segurança alimentar europeia, que não permite que a batalha pela obtenção do custo de produção alimentar mais baixo do mercado único livre europeu possa pôr em causa a saúde dos consumidores, assim como a qualidade de produção exigida pelos padrões comunitários vigentes.

Eleições autárquicas 2013

As eleições autárquicas deste ano “já mexem”. As “máquinas” já estão “no terreno”, em muitos casos, e os nomes dos candidatos às principais edilidades do país são já conhecidos. Em quase todos os concelhos do país, há verdadeiras “máquinas” a trabalhar em prol da vitória, até porque o poder local é o mais pequeno, mas é decerto o mais influente junto das populações onde faixas etárias mais elevadas, por exemplo, se concentram. Estas eleições terão já em conta a reformulação do mapa administrativo do território português, que conta com menos 2500 freguesias, e com isso também se subtrai a proximidade do poder local com a população, ou seja, é uma forma discreta de o governo conseguir centralizar o poder.

Nestas eleições, onde o PSD deverá ser “punido exemplarmente” pela sua responsabilidade na hecatombe provocada ao país, subsistem dúvidas quanto à possibilidade, ou não, de autarcas que já tenham cumprido o máximo de mandatos possam recandidatar-se, ainda que a outra autarquia. Creio que os tribunais seguirão o caminho argumentativo da Comissão Nacional de Eleições, que afirma que esses autarcas poderão candidatar-se de novo, desde que seja a outra autarquia. No entanto, eu discordo dessa leitura da lei e acho que os “dinossauros políticos” não deveriam poder candidar-se a novos mandatos, mesmo que noutra autarquia.

Lisboa

Em Lisboa, o socialista António Costa terá a oposição do “dinossauro” Fernando Seara, que apenas tem de viajar pelo IC 19 para sair de Sintra e tentar ganhar Lisboa. Como os tempos não são “de abundância”, qual será o trunfo de Seara em Lisboa? Será o “seu” Benfica? Os lisboetas certamente que apostarão na continuidade daquilo que tem vindo a ser um trabalho notável de gestão autárquica efectuado por António Costa e restante staff.

Porto

Rui Rio sai da Câmara Municipal do Porto, no fim dos mandatos possíveis de cumprir, e deixa uma cidade relativamente bem gerida nalguns pontos, embora noutros tenha pecado por tardiamente aceder a pedidos sensatos dos portuenses. À presidência da câmara concorrem Luís Filipe Menezes, do PSD, e Manuel Pizarro, ex-secretário de estado da saúde do PS. Rui Moreira é também candidato, mas poderá não ser um mero outsider, pois colherá votos ao centro e à direita. Menezes, um “dinossauro”, poderá escolher uma das várias pontes que ligam as duas margens do rio Douro, e tentar mudar de residência. Porém, penso que a “cidade invicta” dará a vitória nas eleições a alguém com projecto e ambição política, algo só possível com Pizarro.

Oeiras

Em Oeiras diz-se “adeus” a Isaltino Morais. O “dinossauro” presidente da edilidade oeirense sai do cargo que ocupou mais de vinte anos, e dá o seu apoio ao seu vice, Paulo Vistas, o que significa que Isaltino Morais não diz “adeus”, mas sim “não me vou embora”. Já o PS escolheu o antigo deputado Marcos Sá, habitante em Oeiras, por forma a ganhar a câmara muinicipal local. Já o PSD escolheu Francisco Moita Flores, habitante em Santarém, de onde resignou à presidência da Câmara Municipal local, o que teoricamente (face a alguma legislação em vigor) o poderia afastar da corrida à presidência.

Gaia

José Guilherme Aguiar, comentador de futebol na TV, é o candidato PSD-CDS à autarquia de Gaia, onde foi vereador nos últimos anos. O candidato do PS será Eduardo Vítor Rodrigues, líder da concelhia local, que apresenta um renovado conceito de campanha em que, segundo o próprio, “vamos depender menos de outdoors e mais de passa-palavra”. A verdadeira questão que se põe é: como será gerida a crise da maior dívida contraída por um município em Portugal, a de Gaia?

Sintra

Em Sintra, pedem-se eleições rapidamente, por forma a eleger quanto antes o candidato do PS, Basílio Horta. Talvez por isso também hajam “aplausos” na hora do “adeus” de Fernando Seara da presidência da câmara local, mas também há muitas vítimas do “fogo amigo” lançado pelo PSD e CDS. Pedro Pinto é o escolhido pelo PSD, que deverá ter apoio do CDS (mais lugar, menos lugar na lista para a vereação…), mas não se livrou de ter sido uma escolha muito polémica, pois havia a intenção de Marco Almeida, actual secretário de estado, de se candidatar, e tinha o apoio de bases partidárias em Sintra. No meio de todas estas tricas habituais no seio do PSD a nível local em concelhos da Grande Lisboa, surge o experiente Basílio Horta a encabeçar a lista do PS para ganhar a Câmara Municipal de Sintra, numa candidatura que é a antítese da outra apoiada pela mesma maioria que está no governo de Portugal, a dupla infame PSD-CDS.

Crónica de Nuno Araújo
Da Ocidental Praia Lusitana