Seleção Nacional: E tudo um Cigano mudou

Favas contadas. Foi desta forma que os 10 milhões de portugueses, e sobretudo, os 11 que iniciaram o jogo, encararam o desafio da passa sexta-feira, no Estádio do Algarve, contra a Arménia. Tudo ao lado. Os acontecimentos não correram de feição aos das quinas que contaram com um Ronaldo desinspirado, mesmo com mais um recorde batido, com um “pino” na frente e com uma anarquia táctica bem presente em campo. Para tudo isto, foi preciso um cigano inspirado saído do banco para colocar em sentido a equipa da Arménia e levar Portugal a uma vitória vital que relança o primeiro lugar do grupo.

Fernando Santos, em tom de brincadeira, atirou antes do jogo que a estratégia de Portugal seria, “3 gajos na área e um a cruzar”, não errou por muito. Com a tentativa de apresentar um 4-3-3 com Danny à direita, Ronaldo à esquerda, Nani atrás do ponta-de-lança e Post(e)iga no meio, ou o 4-4-2 dinâmico com Danny ou Ronaldo a aparecerem ao lado do avançado, o que, no fim de contas, acabaria por sair seria um nó cego nas próprias opções. Apesar da posse de bola esmagadora, a verdade é que durante a 1ª Parte a seleção das quinas não apresentou verdadeiro perigo, concedendo espaço aos arménios, que mesmo com um porta aviões em frente à baliza ainda conseguiram criar algum perigo a um atento Rui Patrício. Um selecionador que afirma que a posse de bola é essencial e que privilegia o dinamismo no ataque, não pode por uma seleção a assentar o seu jogo no cruzamento para área e esperar que esteja lá alguém para a encostar. Não pode. A lateralização do jogo português foi por demais acentuada, tanto que as iniciativas atacantes já só se tornavam previsíveis e monótonas.

A 2ª parte seguiu a mesma toada. Uma Arménia fechada lá atrás, à procura de um erro português, um Postiga que só serviu para cantar o hino e um Mkhitaryan endiabrado que sacou amarelos atrás de amarelos para Portugal. Fernando Santos percebe que tem de mudar, aos 56 minutos troca Postiga por Éder, ou como quem diz, um pino por um poste, tendo em conta a produção que Postiga estava a ter e a que Éder teve, para mudar qualquer coisa no jogo, claramente uma escolha não acertada. Não que Postiga estivesse a ser mais que um estorvo, mas Éderzito pouco ou nada faria de melhor. Quem continuava em noite não era Ronaldo. O melhor do mundo falhou, falhou e voltou a falhar. Simplesmente não era a sua noite, o Algarve foi o palco da desinspiração de Ronaldo e a Arménia agradecia. O jogo pouco derivava para o meio, Tiago e Moutinho não assumiam as hostes de organizadores de jogo e impulsionadores capazes de catapultar a equipa para outra dimensão. O único que sobressaiu no meio-campo português foi Nani, que perante tal marasmo, ainda foi capaz de ir tentanto qualquer coisa. Até que chegaria, finalmente, o momento do jogo.  70 minutos de jogo decorridos e Fernando Santos, com um atraso de, pelo menos, 25 minutos, faz entrar o talismã português, Ricardo Quaresma. Passados dois minutos da sua entrada, o “cigano”, acabaria por criar uma jogada que, após insistência de Cristiano Ronaldo, morreria no fundo das redes. Alívio, era o sentimento que reinava por terras algarvias.

Assim se selava uma vitória justa, sofrida, mas justa. O selecionador nacional voltou a apresentar alguns erros, uns quantos repetidos do passado, mas no geral, passa com positiva no teste arménio. Os pontos positivos do jogo de sexta-feira são, sem dúvida nenhuma, a aposta nos laterais. Depois dos problemas que teve nos últimos jogos, sobretudo na estreia, com os laterais, Fernando Santos decidiu arriscar em Raphael Guerreiro, o miúdo lateral-esquerdo do Lorient, e José Bosingwa, o experiente lateral-direito que actua agora no Trabzonspor, da Túrquia. Neste ponto há que lhe tirar o chapéu. Se do lado-direito a boa exibição de Bosingwa não é unânime, mais por ódios pessoais que outra coisa, por outro, a estrondosa estreia de Raphael já não merece discussão. Aos 20 anos, o luso-francês mostrou a Fábio Coentrão que não pode descansar à sombra da bananeira e que terá, sem margens para dúvidas, de batalhar pelo seu lugar. O talismã português também tem de ser referido, Ricardo Quaresma. O extremo do Porto tem dado tudo de si e, nos últimos dois jogos, tem sido o jogador mais importante e decisivo. A provar claramente que merece uma oportunidade a titular, afinal de contas, se temos 6 pontos, a ele o devemos. Também a aposta firme na “nova” dupla de centrais merece realce, Ricardo Carvalho é incrível, a  cada ano melhor. Todavia, nem tudo é bom. Não falando da forma como Portugal se apresentou em campo, com um estilo de jogo pouco eficaz e apelativo, o problema principal foi a aposta em certos jogadores, bem como o esquema táctico escolhido, que está tudo menos bem preparado pelos executantes. Tiago, Moutinho e Nani não funcionaram, o que deu aso a inúmeras fragilidades sentidas na zona intermédia do terreno. Com um adversário mais forte, as coisas teriam sido diferentes. Postiga está terrível, não serve nem para suplente, quanto mais para titular de uma seleção que é top10 do mundo. Éder precisa de rever o seu futebol, isso e de confiança, o avançado português está um caco na seleção. Por último, fazer só uma referência à postura de Cristiano Ronaldo no último jogo. Sendo o capitão tem de dar o exemplo e não jogar, actuar e agir como o fez no Estádio do Algarve. Aqui Fernando Santos também tem de ter mão na sua equipa.

Infelizmente, atravessamos uma fase na qual “tudo o que vier à rede, é peixe”, ou como quem diz, uma vitória mais do que suada frente ao adversário muito inferior, como é a Arménia, tem de servir, melhor, tem de ser encarada com leviandade. Como tal, valeu-nos um cigano que vestiu a pele de salvador e que levou a equipa a um sossego nada usual nos últimos tempos, uns laterais que provaram que podem levar a equipa a bom porto e um batedor de recordes, que terá de dar mais de si, mas que estava no sítio certo à hora certa. Assim se resume um jogo com uma equipa matreira que arranjou todas as desculpas para tentar vincar um ponto que Portugal podia ter desfeito mais cedo se se aplicasse mais. Agora, espera-nos um Portugal vs Argentina, que, quer se queira quer não, só vai servir para aumentar egos. Quanto ao apuramento, até para o ano!