Sistema Nacional de Saúde: Realidade vs Irrealidade…

Se o caro leitor prestou atenção à minha crónica da passada semana, por certo apercebeu-se imediatamente de que estou coxo. É isso, mesmo. Pareço o Mantorras, mas mais bonito e menos rico – o que, convenhamos, está mal feito: eu podia muito bem possuir a fuça do monstro da famosa série americana A Bela e o Monstro, mas ser muito rico ou milionário até, mas não, tinha de ser um rapazote bem aprumado, mas sem um tostão furado no bolso. O cosmos está todo trocado, é o que é. Isto está muito mal distribuído, e a culpa é do “Gajo das Barbas Brancas”…

Bom, visto que me encontro de baixa médica, pois que tive de ir a uma  consulta com o meu médico de família, para ver como estava a correr a recuperação do meu “Síndrome de Mantorras”. Até aqui, tudo normal e sem percalços. Mas, existe uma certa preocupação quando nos encontramos na sala de espera do Centro de Saúde, à espera que de sermos chamados pelo médico. Porque, vamos lá a ver: se estamos ali, naquele local onde emana o cheiro e o sentimento a doença, é porque não estamos em perfeitas condições de saúde, e existe sempre uma pequena dúvida pessoal sobre a nossa recuperação – mesmo que estejamos completamente recuperados. E porquê? Porque, se tivermos a sorte de o nosso médico de família se encontrar num daqueles dias em que o mundo é um verdadeiro mar de rosas, em que o amor é lindo e os seus pacientes são uns verdadeiros cachorrinhos amorosos que merecem carinho do bom, então tudo porreiro, mas se acontece o contrário, em que o médico está a passar por uma fase de pré-depressão, em que a vida é uma verdadeira bosta, e que os seus pacientes são uns pequenos ratos de laboratório que vão às suas consultas apenas com o intuito de o deixar ainda mais aborrecido, então é oficial de que estamos puramente tramados…

Pessoalmente acredito que, a melhor forma de ultrapassar este pequeno “trauma”, é ficar particularmente atento à expressão facial das pessoas que são chamadas primeiro que eu, quando abandonam o consultório – se aparentam um ar jovial, ou um semblante negro e pesado… Porque é a melhor forma de me preparar para o duro teste que se adivinha: enfrentar um médico bem-disposto, ou pelo contrário, um médico com vontade de me estropiar!

Como abordo os dois lados da situação, sinto-me no dever de elaborar dois pequenos diálogos “paciente-médico”. Um dos diálogos será o mais aproximado da realidade, ao invés que, o outro diálogo, será aproximadamente o mais possível da irrealidade. Incumbo ao caro leitor, a árdua tarefa de escolher qual dos dois diálogos mais lhe convém. É só para o leitor também agir um pouco, porque ler não custa nada, e cansa a vista. Considere, esta tarefa, como um pequeno estímulo ao seu cérebro – inconscientemente, estará a retardar uma doença que, provavelmente, o atingirá quando chegar à idade em que terá de usar fraldas: refiro-me, obviamente, ao Alzheimer. (Não é preciso agradecer! Eu aprecio muito os meus leitores, porque, obviamente não são pessoas no pleno das suas capacidades mentais, senão não perdiam tempo a ler as minhas crónicas.)

Diálogo 1 – Realidade.

(O paciente entra no consultório médico, depois de ouvir – através do altifalante – o seu nome…)

 

Paciente (batendo à porta): Posso, doutor?

Médico: Pode, pode… Faça o favor de entrar…

Paciente (sentando-se): Obrigado, doutor. Perdoe-me a demora mas, como pode observar, continuo coxo…

Médico: Não tem problema. Bom, então, obviamente, precisará de mais uns dias de baixa médica, certo?

Paciente: Pois… Quer dizer, o que é o que o doutor acha? Acha que devo ficar mais uns dias em casa de baixa médica e, por esse mesmo motivo, este mês não pagar a luz, nem a água?

Médico: Eu compreendo que é complicado ficar de baixa médica, porque se recebe muito pouco, mas é o melhor para si… Isso ainda está muito fresco e voltar ao trabalho só vai agravar ainda mais o seu caso…

Paciente: Mas… Doutor… Então, pode passar-me mais 2 dias… se faz favor…?

Médico: Dois dias? Isso não fica bom em 2 dias, homem! Passo-lhe 10 dias!

Paciente: Tantos…? Ok, pronto… se tem de ser… senão nunca mais curo isto… Bom, doutor, posso pedir-lhe um pequeno favor…? Pode telefonar ao meu patrão, que eu dou-lhe o número, e dizer que eu tenho MESMO de ficar mais 10 dias em casa? É que senão ele fica furioso comigo, e ainda me despede…

Médico: Está bom, homem… Dê cá o número que trato disso. Não se apoquente!

Paciente: Obrigadinho! Você é um verdadeiro anjo! É o meu anjo da guarda!

Diálogo 2 – Irrealidade.

(O paciente entra no consultório médico, depois de ouvir – através do altifalante – o seu nome…)

Paciente (batendo à porta): Doutor, posso…?

Médico (gritando): NÃO! É PARA FICAR À PORTA, SE CALHAR… EU DOU A CONSULTA ASSIM, AOS GRITOS… QUEREM AGORA VER…

Paciente (assustado): Mas… pronto… O Doutor é que sabe… É como o doutor preferir… Se quiser que eu fique aqui à porta, não tem problema nenhum… Eu só não quero é apoquentar o doutor…

Médico (gritando): VÁ, HOMEM: ENTRE LÁ, PÁ! NÃO ME FAÇA PERDER TEMPO!

Paciente (entrando vagarosamente): Ok… Ok, pronto… pronto… Posso sentar-me?

Médico: Não, essa cadeira não é para se sentar em cima. É apenas para enfeitar, querem ver…

Paciente: Ah, pronto… Então, eu fico aqui encostadinho à parede, e prometo não o incomodar…

Médico: Ó homem, por favor: sente-se!

Paciente: Obrigado, doutor… Bom, doutor, eu queria perguntar-lhe se eu deveria ficar mais uns dias de baixa médica, porque sinto que ainda não estou preparado para ter alta…

Médico: Vamos lá esclarecer aqui umas coisinhas… Primeiro, o médico sou eu, portanto, sou eu que faço as perguntas, e não o senhor! Depois, NÃO!, não vou passar-lhe mais baixa médica. Você está pronto para voltar à labuta!

Paciente: Mas… Mas… Mas… Doutor, eu estou coxo! Eu não consigo quase andar, como é que vou trabalhar para as obras a carregar baldes de massa?!

Médico: Quantas pernas tem o senhor?

Paciente: Eu? Tenho duas pernas, doutor…

Médico: Então, pronto: está apto para trabalhar. Se tem duas pernas e só uma perna aleijada, então ainda sobra uma perna boa. E para mais, você tem duas mãos sãs, e os baldes de massa carregam-se com as mãos, e não com as pernas. Tem Alta. Pode ir andando…

Paciente: Mas… Mas…

Médico: O que foi agora?! Hã?!

Paciente: O doutor enganou-se…

Médico: Não me enganei, não senhora! Tem Alta! Pode ir andando…

Paciente: O doutor não quererá dizer antes: “Pode ir coxeando…?”

Médico: Engraçadinho… Ponha-se na alheta!

Paciente: Com certeza, doutor… Um resto de bom dia para o doutor… Aproveite, e vá dar uma volta a PÉ ao parque, que está um excelente dia de sol… Vá, e dê uma volta aqui pelo coxo, visto que eu não posso andar…

Médico (irritado, querendo despachar o paciente): Olhe, terei todo o prazer em dar uma volta extra pelo parque, por si. E, para o homenagear, farei essa volta a fazer o pino! Porque, sabe, eu tenho duas mãos sãs, tal e qual o senhor! Ponha-se a ANDAR!

Paciente: A coxear, doutor… A coxear…

E pronto. Espero que o leitor não necessite de muito tempo para escolher um dos diálogos, porque a acontecer, parece-me que ainda estará pior do que eu imaginava, e deverá IMEDIATAMENTE ser consultado por um psiquiatra…

Até para a semana, malta catita!


RicardoEspadaLogoCrónica de Ricardo Espada
Graças a Dois
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