Somos compatíveis: bora namorar?

Tenho para mim que essa coisa dos signos nasceu um dia da cabeça de uma sogra tão renitente em aceitar que os defeitos da filha podiam ser hereditários como os seus, que se lembrou de culpar os astros pela posição que ocupavam no céu à hora a que a dela era estar deitada no chão de costas a dar à luz uma menina que um dia haveria de enchê-la de orgulho.

Pela minha parte, não compreendo em que medida pode um mapa desenhado no céu, polvilhado de pontinhos minúsculos que representam estrelas e planetas, influenciar o destino de tanta gente na Terra que vive sem ter a coragem de levantar a cabeça. Além disso, não deixa de ser estranho que é quando uma mulher engravida e está mais sensível a tudo o que vem do exterior que seja a criança dentro dela a estar recetiva à influência dos astros.

Ao que dizem os estudiosos deste fenómeno que atrai a curiosidade de milhões de pessoas em todo o mundo, são estes corpos celestes, com o poder que têm de lançar raios cósmicos sobre a crosta terrestre, que determinam que venhamos ao longo da nossa vida a ser egoístas ou rudes, brutos ou prepotentes e nunca o contrário, porque até à 5ª geração é do conhecimento geral que dos nossos antepassados é que herdamos os genes responsáveis por virmos a ser generosos ou educados, meigos ou tolerantes, ou seres ardentes e apaixonados.

Para melhor determinarem as relações de compatibilidade entre as pessoas, os astrólogos, assim chamados porque se dedicam ao estudo dos astros, separam-nas à nascença, de acordo com o dia e o mês do ano de calendário em que elas pela primeira vez enxergam a luz do dia, e catalogam-nas num dos doze signos que supostamente reúnem personalidades compatíveis entre si e mais não representam do que as constelações que se localizam na faixa do zodíaco.

Cada signo tem a sua personalidade astral mas em função dos pontos em comum que há entre eles, estes podem agrupar-se desde que sejam regidos pelo mesmo elemento da natureza. E como sabemos, estes são quatro: terra, ar, fogo e água. Com esta divisão, pretendem distinguir-se os indivíduos que os integram pelo caráter realista dos primeiros; ousado e criativo dos segundos; ou fogoso e romântico dos restantes, respetivamente.

Acho, no entanto, que há pessoas com traços de personalidade retirados de vários signos.

Conheço bem o exemplo de uma pessoa que é nativa de Escorpião, e por isso, leal, mas também determinada como um Carneiro, atenta ao bem-estar dos amigos como um Caranguejo e intuitiva como um Pisciano.

Outro caso, é o de um Virgem com quem me relaciono no dia-a-dia e que é, além de racional e organizado, persistente como um nativo de Touro, egocêntrico como um típico Leão e fiel aos seus ideais como um Capricórnio. Todavia, embora reconheça que tem outras características comuns sobretudo a Gémeos e Carneiro, admito que tem muito pouco de Sagitário, com cujo otimismo e esperança num futuro melhor ele deixou de se identificar depois dos cortes infligidos pelo Governo na Pensão que passou a receber desde que se reformou e ficou em casa.

Mas então se cada nativo de um signo tem características com que se identificam os de outros, não poderá dar-se o caso de ter essa pessoa menos ponto em comum com as daquele a que dizem pertencer?

Ou seja, não poderá um Carneiro cruzar os braços diante de um problema e conformar-se com uma derrota ou um Touro tornar-se menos obsessivo para conseguir os seus intentos e chegar ao fim de uma jornada exausto e sem forças para resistir? Não veremos um dia um nativo de Gémeos colocar-se ao lado de alguém num conflito em vez de tentar a reconciliação entre as partes? Nem viremos a conhecer um Caranguejo que deixou de se preocupar com um amigo e deixou de cuidar para que nenhum mal lhe acontecesse? Não haverá um Leão que possa não ser egocêntrico, e mais certo do que ele tornar-se cada vez mais vaidoso chegue o dia em que ele perca a juba e fique careca? E não será mais improvável do que um virgem deixar de sê-lo, que todos os nativos deste signo sejam pessoas com um elevado discernimento e um fortíssimo pendor crítico da realidade que o rodeia? Arrepender-se-ão de continuar solteiros mas sentindo que estão vivos fazendo parte de algo muito maior, os pertencentes a Balança que sem ser numa relação onde sintam que existe amor preferem não casar? Custará assim tanto encontrar um Escorpião que possa ser orgulhoso e concentrado nas suas tarefas mas não ache injusta a fama que lhe atribuem de ser temperamental? E que Sagitariano, ante as dificuldades, nunca questionou a fé que embora o mantenha vivo pode não ser suficiente para acreditar num futuro risonho onde não tenha vontade de morrer de tédio como no presente? E tão certo é haver capricornianos a darem pouco valor à sua carreira e à família como aquarianos presos a convenções e de pés e mãos atados para correr atrás dos seus sonhos, sem saber como escapar às mudanças que a rebeldia dos outros provoca no mundo em que vivem. Já dos Peixes, talvez nunca venhamos a ter a certeza de algum ter uma visão da realidade comum à maioria dos mortais. São quase todos seres tão misteriosos de sensibilidade à flor da pele, que arrancar deles uma confissão podia ser um ato físico violento ao qual só resistiriam se tivessem a força de um Leão ou outro nativo de um signo cujo elemento natural fosse o fogo.

Também acho tendenciosa a ideia de que resulta melhor uma relação em que no casal, dos dois elementos se diz que são compatíveis por estarem regidos pelo mesmo elemento ou que têm entre si tantas ou mais afinidades do que se fossem almas gémeas.

Vendo as coisas pelo lado da astrologia, mas contrariando a lógica que ela tenta impor, prevejo mais hipóteses de sucesso no casamento de alguém de Leão com Virgem, que adora ter a uma pessoa do lado a quem possa servir, do que com um nativo de Carneiro, por causa do choque decorrente de uma das partes querer impor a sua vontade à outra sem aceitarque questionem a sua autoridade.

Também não me custa imaginar relação mais condenada ao fracasso do que aquela onde a geminianos e aquarianos, unidos por uma forte amizade, falta a perseverança dos capricornianos para atingir o objetivo a que se propõem, levando de vencida todos os obstáculos.

E na presença de um Escorpião, mais depressa noto insegurança num daqueles taurinos de personalidade vincada que nunca se deixa influenciar nas más decisões, do que num nativo de Peixes que diante de um ser tão fantástico e com tão grande carga erótica tem logo a perceção ao vê-lo de que é escusado abrirem a boca para se fazerem entender a todos os níveis. Situados num nível elevado de atração, a comunicação entre ambos faz-se extrassensorialmente e pela falta do cheiro um do outro notam que não pode passar muito tempo sem se verem.

Mas como até para a regra que defendo, segundo a qual não devemos dar mais ouvidos ao que dizem os signos do que as pessoas que estão ao nosso lado, deve haver uma exceção que a confirme, estou disposto a aceitar que nesta situação duas pessoas se possam apaixonar por influência direta dos planetas que as regem.

Nas outras, ainda que por coincidência haja pessoas felizes, dou menos importância ao contributo dos astros para tal desenlace. Muito menos do que aquela que dão às respetivas sogras a maior das pessoas que conheço, e que por acreditarem mais do que eu na astrologia acham que só com todos os ventos cósmicos a soprarem a seu favor é que existe a menor possibilidade de um dia se virem a entender com elas.