Sou Ateu Mas Acredito em Messi

Durante muitos anos a esmagadora maioria dos adeptos argentinos de futebol chamaram Dios (Deus) a um mero mortal. O seu nome era Diego Armando Maradona. O astro do futebol viu a sua mítica camisola número 10, usada na seleção albiceleste, substituir o “io” da palavra Dios para originar a alcunha D10s. Tendo em conta o que fazia nos relvados com recurso ao seu mágico pé esquerdo e os jogos que ganhava sozinho num desporto colectivo, nem se pode considerar exagerada tal alcunha.

Uns anos mais tarde e com muita ousadia, um leque mais restrito de argentinos (os adeptos do Boca Juniores) adoptou a mesma alcunha para Juan Roman Riquelme. Apesar de ter sido um grande jogador e de ser um dos meus predilectos a nível pessoal, é manifestamente exagerado compará-lo a Maradona e dar-lhe a honra de ter sido chamado pela mesma alcunha, mesmo tendo alcançado grandes feitos na Argentina.

Grandes feitos na Argentina ou pela Argentina, não fez o novo detentor de tal alcunha, o único jogador de futebol (argentino e não só) digno de ser considerado o herdeiro de Maradona. Como bom ateu que se preze não acredito em Deus mas abro uma exepção para pessoas excecionalmente boas na sua área. É o caso de Maradona, Pelé e Cryuff no futebol. É o caso de Michael Jordan no basquetebol. Muhammad Ali no pugilismo ou Michael Schumacher na F1. Se eu fosse da nacionalidade de qualquer um deles ou das suas equipas/clubes, colocaria uma fé imensurável nas suas capacidades.

No futebol, os supracitados terão de arranjar um espaço no monte Olímpo para o novo D10s. Falo obviamente de Lionel Messi. Estarei a ser exagerado? Não creio. Com um metro e setenta de altura já alcançou feitos apenas ao alcance dos “maiores”. Com 28 anos já venceu mais a nível individual do que qualquer outro futebolista e a nível coletivo apenas lhe falta um Mundial pelo seu país. Os argentinos podem exigir-lhe isso? Podem. É necessário vencer o Mundial para estar na elite? Quando se joga o que Messi joga e se ganha o que Messi já ganhou, não.

Quando se fala em Messi, o nome de Cristiano Ronaldo é sempre chamado ao barulho e vice-versa. Este texto não pretende fazer comparações entre os dois craques porque crónicas desse tipo já existem aos milhares pela imprensa e internet fora. Não pretende ser uma comparação porque eu tenho um jogador favorito e não o escondo. Prefiro Messi a Ronaldo e acho que o jogador português só tem de estar orgulhoso por tudo aquilo que tem feito na sua carreira, nomeadamente, por ser o único que se aproximou do nível de Messi, conseguindo por vezes, superá-lo.

É totalmente legítimo que outras pessoas prefiram Ronaldo a Messi, tal como há uns anos os portugueses defendiam que Figo era melhor do que Zidane. A espaços, o português até foi melhor, mas no fundo todos sabemos (ou deveríamos saber) que o francês era um jogador superior. Creio que quando Messi e Ronaldo terminarem as suas carreiras (aproveitemos enquanto esse final não chega) muitos chegarão a essa conclusão. No entanto, a sua opinião é tão legítima como a do português que prefere o argentino. As comparações ficam-se por aqui.

Cristiano Ronaldo

Duas vezes eleito o melhor futebolista da Europa, sete vezes campeão espanhol, seis supertaças de Espanha, três Taças do Rei, três mundiais de clubes, um campeonato do mundo de sub-20, medalha de ouro olímpica, quatro Ligas dos Campeões Europeus e agora, cinco Bolas de Ouro são alguns dos títulos que Messi venceu. Fora isto, é o jogador com mais golos num dos melhores clubes do mundo, o Barcelona, o melhor marcador da história da Liga Espanhola e disputa ainda o pódio para melhor marcador da Liga dos Campeões com Cristiano Ronaldo (o português vai à frente).

Já nem falo de outros tantos records individuais que me cansaria de escrever aqui e você de os ler, dada a sua enorme extensão. Se a nível colectivo sempre saiu beneficiado por estar num clube como o Barcelona, o mesmo se pode dizer do clube, que sempre beneficiou de ter nas suas fileiras um jogador acima de todos os outros. As últimas quatro Ligas dos Campeões conquistadas pelos blaugrana são prova disso mesmo: Qualidade coletiva aliada a grandes individualidades, sobretudo Messi. Daqui a uns anos, mais do que ser recordado como o “Barcelona de Guardiola” ou o “Barcelona de Xavi ou Iniesta”, o Barcelona do início do séc.XXI será lembrado como aquele clube que teve a sorte de ter um jogador como Leo, o “Barcelona de Messi”.

Messi é não só o melhor jogador da sua geração como um dos melhores de sempre. Aquele que bateu recordes por marcar muitos golos, aquele que bateu recordes por dar a marcar outros tantos, aquele que tornou o Barcelona na maior potência do futebol espanhol, europeu e mundial e por ser aquele que fez o que seria impensável: Fazer os adeptos de futebol questionarem-se se Maradona ou Pelé terão sido os melhores de sempre dentro das quatro linhas.

Terão sido? É difícil avaliar jogadores de épocas diferentes, em contextos diferentes, com metodologias de treino ou conhecimentos tácticos diferentes. Já para não falar das bolas e dos materiais que compõem os equipamentos. É não só difícil como também injusto. No entanto, creio que não será descabido colocar Messi no grupo os cinco melhores de sempre e quiçá no pódio dos três melhores futebolistas de sempre, isto mesmo nunca tendo vencido o Mundial como Pelé ou Maradona. Se é verdade que estes dois nunca venceram a Bola de Ouro porque na altura em que jogavam só era atribuída a jogadores europeus, também é verdade que Cruyff ou Beckenbauer são considerados dos melhores jogadores de sempre tendo vencido menos trofeus que Messi. Cada um é como cada qual e todos foram grandes à sua maneira. Todos eles têm um espaço na elite e o argentino ainda mais.

É legítimo considerar Messi um Deus do futebol e, por isso, os argentinos podem muito bem apelida-lo de “D10s”. A herança de Maradona foi bem entregue, El Pibe tem de estar orgulhoso. Ganhar 5 Bolas de Ouro é um feito único e o argentino pode vangloriar-se por isso. É um record que reconhece um futebolista ímpar e mais que isso, um desportista único. É um record que vai demorar a ser ultrapassado e que até pode ser aumentado. Afinal de contas, estamos perante um Deus muito jovem, só tem 28 anos…