Spleen – o sofrimento de Helena

A depressão e o suicídio

Spleen – estado de tristeza ou melancolia, profundo sentimento de desânimo, isolamento, angústia e tédio existencial.

Helena é uma mulher feliz. Esposa prazerosa, mãe de dois rapazes, um emprego que gosta, um grupo de amigas que convive, família unida. Helena tem trinta e cinco anos, um rosto bonito equiparado a um corpo em forma, faz exercício físico duas vezes por semana, de vez em quando pratica ioga, é saudável, não fuma nem bebe, tem uma boa alimentação. Helena é uma mulher realizada.

Helena sempre achou que a depressão era birra de gente grande. Que a depressão era uma palavra demasiado feia para descrever um estado de desânimo que passa ao fim de dois, três dias, uma palavra demasiado obscura para justificar baixa médica e uma quantidade interminável de medicação, Helena não levava a sério todos estes termos, aliás, ela não se levava muito a sério. O que Helena não sabia é que a depressão é uma doença do foro mental e biológico, que não se cura com uma ida à praia, nem com um jantar de amigas, que, não poucas vezes, não se cura totalmente com medicação, nem com várias visitas ao psicólogo.

Um dia Helena acordou triste. Desvalorizou…cansaço, noites mal dormidas, demasiadas tarefas, emprego numa fase mais exigente, dores de cabeça, problemas pontuais aqui e ali na sua vida. No dia a seguir Helena acordou novamente triste, desvalorizou “isto passa, de vez em quando ando assim meia triste, mas daqui a uns dias passa”, os dias passaram e Helena continuou triste, não só acordava com uma tristeza incontrolável como se deitava à noite sempre a chorar. Helena olhava para a sua vida e não encontrava um motivo francamente válido para estar deprimida, filhos felizes, tecto para dormir, comida na mesa ( o blá blá blá social que determina o que temos de ter e o que temos de ser para nos sentirmos felizes e sobretudo gratos ). Os meses passaram, a sua doença não…o filho de Helena perguntava porque é que a mãe estava sempre a chorar, a mãe respondia que estava cansada. Helena não contou a ninguém o quão desesperada estava por não conseguir controlar mais o seu sofrimento, era uma dor tão sufocante que lhe provocava dores físicas, os seus pensamentos acerca do mundo e de si própria eram tão atrozes que ela sentia-se a desfalecer de dentro para fora. Helena foi ao médico, quando a médica lhe questionou acerca da urgência da consulta, Helena respondeu que tinha dores de cabeça, Helena não conseguiu pedir ajuda porque se sentiu ridícula “tantos problemas graves e eu a queixar-me que não ando bem, palermice…”.

Helena já não praticava exercício físico, não ia trabalhar com vontade, afastou-se das suas amigas e colegas, ninguém a questionou por isso, Helena sentia-se debilitada interiormente, enquanto chorava Helena olhava para um quadro que tinha em casa que dizia HOPE e ainda chorava mais. Helena pesquisou na internet sobre depressão, o único site que lhe despertou interesse foi sobre as formas de suicídio possíveis, Helena não queria morrer, ela só queria acabar com a angústia ensurdecedora que sentia. Um dia Helena saiu de casa com o objectivo de não voltar…viu na rua uma tuna a atuar e teve um aperto no coração “se eu morrer não vou ver o meu filho trajado um dia”, Helena voltou para casa. Helena pensava que o amor pelos filhos era o suficiente para suprimir qualquer dor, mas percebeu que às vezes é exactamente o contrário. Os dias passavam rapidamente, a dor de Helena não. Helena já não conseguia ouvir os filhos, Helena já não conseguia ter sexo com o marido, Helena já não se olhava ao espelho, as suas enormes olheiras, os seus olhos inchados, os quilos a acumular, Helena tinha pena de si mesma – o passado que a atormentava, o futuro que a amedrontava, o presente que já não era especial – Helena tinha perdido toda a vontade de viver.

No dia 23 de Março de 2017, pelas 23 horas, Helena suicidou-se por via medicamentosa, foi o filho mais novo que ao acordar de manhã encontrou a mãe no chão da cozinha. Helena deixou duas cartas, uma para cada um dos seus filhos, a primeira linha escrita em ambas as cartas dizia: “Perdoa-me, a mãe vai estar sempre a olhar para ti do céu, amor da minha vida”. Em Portugal, de 8 em 8 horas morre uma pessoa por suicídio, em 70 % dos casos o motivo foi a depressão. Olha, mas olha bem…vês a Helena que está ao teu lado? Não deixes que a tua Helena faça parte da estatística.