Passeio Alegre, 1870

Turismo no Porto Oitocentista – Jardins e Parques Urbanos

 

O século XIX foi uma verdadeira consequência da Revolução Industrial, em que os meios urbanos começaram a manifestar os primeiros vestígios do próprio pulsar da industrialização. Era uma industrialização europeia urbana desenfreada e que crescia sem qualquer organização, a par de um acentuado crescimento demográfico. Os bairros e as novas formas de habitação (lotes de pequenas dimensões, com pequenos jardins que conferiam um espaço verdejante e familiar) para albergar a classe operária multiplicam-se, assim como a emergência hoteleira para albergar os viajantes e homens de negócio que utilizavam o caminho-de-ferro como meio de deslocação.

A cidade do Porto também bebeu desta influência, surgindo duas realidades sociais distintas: a Oriente, a comunidade brasileira (portugueses que emigraram para a antiga colónia e regressaram com algum capital e disposição para investir) conquistava nos sectores industrial, comercial e da banca, enquanto a Ocidente, a comunidade inglesa desfrutava do ócio dos passeios românticos e actividades balneares, muito motivados pela indústria do Port Wine e das boas relações comerciais entre Portugal e Inglaterra, permitindo o desenvolvimento de faustosas decorações arquitectónicas visíveis nos seus palacetes. Sem dúvida, esta comunidade privilegiava da sua excelente localização de frente marítima, dando início (oficial) ao turismo na cidade do Porto. Curiosamente, tais relações comerciais já advinham desde a forte aliança luso-britânica que se acentuou bastante com o Tratado de Methuen (1703), firmando esta ligação. Esta forte “Ocidentalização” manifesta-se mais com o crescimento da Foz enquanto espaço de lazer, sendo embelezada pelo Jardim do Passeio Alegre, em 1888. Após a construção do Palácio de Cristal e dos seus espaços ajardinados (1865), o Porto testemunhou uma forte deslocação britânica para este núcleo a Ocidente da cidade.

Esta comunidade começou por procurar novos espaços, formas de lazer e qualidade de vida, confluindo numa actividade balnear na Foz ou em Leça da Palmeira, sobretudo nos meses mais quentes de veraneio. Os jardins, as áreas de lazer e os parques urbanos desempenham uma capital importância nas cidades urbanas como factores de atractividade turística. Estes espaços verdes têm sido alvo de sucessivas requalificações urbanas e até mesmo de destruição ao longo dos tempos. É só no século XVI, com influência italiana, que chega ao Reino a moda dos jardins e espaços ajardinados nas habitações privadas. O bispado começa a realizar obras de ordenamento e decoração nos seus espaços, como por exemplo o frei Marcos de Lisboa, nos finais do século XVI, tenta decorar e embelezar a Quinta do Prado do Repouso. Infelizmente, não foram concluídas e só no século XIX foi implementado um cemitério.

Devido à forte influência da arquitectura barroca italiana, é no século XVIII que se dá o ajardinamento de alguns espaços da cidade. Com a chegada de Nicolau Nasoni, arquitecto italiano, a cidade sofre uma grande remodelação urbana e os jardins dos palacetes também sofrem com esta remodelação, tornando-se autênticos labirintos setecentistas com figuras de estatuária e fontes barrocas (Quinta da Prelada). No findar do século XVIII e início do século XIX, a comunidade britânica tira partido destes espaços ajardinados, abrindo alguns ao público, continuando com a requalificação destas áreas. Não obstante, com a chegada de Emílio David, arquitecto paisagista alemão de renome, é introduzido no Porto a fama dos passeios públicos, tais como o da Cordoaria e as alamedas verdes do Palácio de Cristal.

Encontramos duas comunidades que inspiraram o turismo na cidade do Porto ao longo do século XIX. Desconhecemos, cientificamente, se podemos afirmar com exactidão que estamos perante uma indústria “proto-turística”, visto o conceito de viagem ainda estar numa fase embrionária e as acessibilidades não terem comparação às dos dias que correm. O que defendemos com clarividência é que estas sociedades moldaram a geografia urbana do Porto, permitindo, pela segunda vez, cidade de eleição para melhor destino europeu.