Tutti-frutti? Só nos sumos.

Bi. Mais que um. Dois. Poli. Vários. Tutti-frutti. Todas estas palavras podem ser empregues na gíria futebolística, sobretudo quando nos referimos a quem apoia – ou assim o diz – mais do que um clube. Alguém que torce por mais do que uma equipa ou que gosta de vários clubes.  Ou como quem diz, um dos maiores problemas do futebol actual.

Problema como quem diz. Só gera tanta celeuma para quem ama efectivamente o desporto, para aqueles que sofrem pelo seu clube, que ajudam o seu clube e que não perdem um jogo seja de que modalidade for. Quer seja no estádio ou, no caso de quem se veja impossibilitado de comparecer, na televisão. Para esses, cada vez mais escassos, é um problema. Para todos eles que amam incomensuravelmente um símbolo e que o consideram parte de si, é, sem dúvida nenhuma, uma situação penosa e fustigante ver o seu estádio, na sua zona, a de sócios, recheado de adeptos do clube adversário. Seja porque foram com amigos, com familiares ou, a razão fulcral e o cerne do texto, porque têm mais que um clube.

Exactamente isso, bi-clubistas. Aqueles que torcem pelos “pequenos” durante vários jogos, mas quando jogam contra o “seu” clube, aí já querem é que eles sejam derrotados, gritando e festejando qualquer golo do “seu” clube. Ser tutti-frutti é apoiar verdes e vermelhos, vermelhos e azuis, amarelos e verdes, ou tantos outras cores  contrastantes não só na tonalidade como nos ideais, tradições e história que transportam naquilo que, para quem ama, é mais importante: o símbolo. Ter dois clubes ou mais é vender a alma ao diabo. É desrespeitar quem efectivamente se importa, luta e vibra com o clube e tudo o que o rodeia. Apoiar um quando convém e negligenciá-lo quando precisa, é de quem não sente as coisas da mesma maneira. É de quem não sabe o que quer e vai atrás de rebanhos, só porque sim. É de quem não respeita as convicções dos outros e se marimba para as vontades dos demais. É de quem não sente o desporto.

Tudo isto dói. Dói ver um estádio repleto de tuttis que ainda outro dia estavam ali, de outra cor, com o mesmo semblante e o mesmo suposto “entusiasmo”. A revolta surge porque o desporto desperta paixões,  faz vir ao cimo todas as emoções contidas durante um dia, uma semana, um ano, uma década. Estar ao lado de quem sente o mesmo amor e devoção que nós, não tem explicação. Sentimo-nos mais fortes, unos, gigantes. O sentimento de ter ao lado seguidores de um símbolo, o mesmo, é algo único. Por essa mesma razão, é que não faz sentido, é ultrajante e quase que agoniante, ter junto durante um jogo a nós alguém que não nutre o mesmo sentimento que nós, alguém que, quando sorrimos, nos sorri com outra cor, com um olhar de quem não se importa de perder porque o seu clube é outro e este é mais um passatempo, mais uma distração. Tudo isto custa. Ter 30 pessoas no estádio que amam o clube em todas as situações e ter 30 mil quando se ganha, devia valer pouco. O público que vem atrás das glórias e que se vai alimentando dos sucessos da equipa que lhe convém, semana sim, semana não, não é parte do clube. Não é parte da história.

Foi isso que se deu no Estádio do Restelo este sábado. 2/3 do estádio mais bonito do mundo repleto de benfiquistas e, aquela zona, a zona especial, impenetrável, fechada ao belo azul e às “cruzes que andavam, soltas nas velas”, essa mesmo, estava repleta de tuttis, bi-clubistas, bígamos. Esse é um dos problemas do futebol português, a falta de amor ao clube e a cultura de massas que se apodera de quem nasce. Por essa razão, a monopolização do nosso futebol será maior a cada minuto. Os adeptos que só se alimentam de mediatismo, não se deviam considerar adeptos. Quem se deixa alienar, é vazio. Nada me entristece mais do que ver o Estádio mais belo do universo pintado de outra cor. Sejam no desporto como querem ser na vida, íntegros e coerentes.