Uma viagem à Alemanha – Bárbara Borralho

Fui à Alemanha há duas semanas. Foi a  primeira vez que andei de avião e, como é óbvio, não estava nervosa. Não me agarrei a todos os sítios possíveis e imaginários assim que o avião levantou voo. Não fiquei enjoada. Não fechei os olhos para evitar ver a distância a que estava do chão. Nada disso. Tive um comportamento adulto como, aliás, tenho sempre. E tudo o que disse atrás é mentira.

Na Alemanha recebem-nos bem. A língua é estranha, arranha até quem não a fala. Deve existir um estudo qualquer a comprovar que na Alemanha as pessoas têm mais saliva que noutros países. As frases são longas e quando as traduzimos só usamos meia dúzia das nossas palavras, se tanto. Parece que falam demasiado rápido ou acho isso porque não entendo nada de alemão. Mas eles devem achar o mesmo de quem fala português ou outra língua qualquer que eles não entendam. Está ela por ela.

Naquele país até o acto de fumar um cigarro tem sotaque. E lá demora-se mais a morrer de complicações devido ao tabaco. Em Portugal “fumar prejudica o fumador e as pessoas à volta”, mas na Alemanha “Rauchen fügt ihnen und den Menschen in ihrer umgebung erheblichen schaden zu”. Mas também mata a carteira de quem tem o hábito. Têm a estranha forma de pensar que é preferível ter a comida mais barata do que os vícios. Que ridículo.

Em Portugal as roulottes vendem cachorros, hamburguers e kebabs. As roulottes da Alemanha vendem sexo. Enfeitam-se as carripanas com frases como “sexy girl” e lá estão elas ao telefone a marcar o próximo encontro. Ficam à beira da estrada como as nossas, mas não vão para carros alheios nem esperam sentadas numa pedra. Mas pagam impostos. Têm luzes que nos fazem pensar que o Natal chegou mais cedo. Uma verde para quando estão livres e uma vermelha para quando têm clientes.

Na Alemanha comem-se salsichas e bebe-se cerveja. É um estereótipo, mas surgiu por alguma razão. Também têm o fino traçado mas não sabem fazer uma Cuba e desconhecem o segredo do Tango. Como boa turista também gosto de ensinar. Para a próxima levo uma garrafa de Licor Beirão, uma garrafinha de Licor de Singeverga e uma caixa de Jesuítas e Limonetes só para verem como venho de uma terra com coisas boas.

Apesar de tudo, a Alemanha soube-me a saudades. É quando estamos sem algo que percebemos o quanto isso pode fazer-nos falta. Tive saudades de Portugal. Da minha língua, das minhas pessoas, da minha casa a tantos quilómetros de distância. Senti-me mais perto quando entrei no avião e ouvi a língua de Camões desdobrada em palavrões e pedidos de vinho às assistentes de bordo. “Esta sandes não valem nada, não há presunto?”. Também nós temos sotaque em tudo, também nós sabemos receber.

Ao sobrevoar o Porto à noite espreitei pela janela já sem medos. Vi nascer as ruas que conheço de cor, o porto de Leixões e finalmente o aeroporto. Quando saí do avião apeteceu-me beijar o chão qual Papa D. João Paulo II. Não por ter chegado bem mas por ter chegado a casa. Li todas as placas e mais algumas só para voltar a ver palavras portuguesas. Até a do “WC” que é igual e universal. No fim de contas, nada me fez sentir mais em casa do que estar no meu Polo (que por acaso é alemão) e começar a discutir no meio do trânsito.

(Aproveito para pedir desculpa por esta ausência prolongada sem aviso prévio. É que a vida dá muitas voltas e de um momento para o outro temos o dia tão preenchido que não há espaço para mais nada).

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Riso sem siso