Vera

Invejavam-lhe os olhos em tons de avelã, mas sobretudo os cabelos, da cor que tinham as amendoeiras que estavam todo o ano em flor.

A puxar na semelhança física mais ao pai do que à mãe, que era loura e usava o cabelo à garçonne, Vera, retratada de feições serenas, seria ao jeito do que qualquer mestre do Renascimento gostaria que ficasse a sua obra-prima mais notável.

Por ser bela, podiam cantá-la os poetas, mas seja em verso ou em prosa, nas entrelinhas do texto é que vem o que a bom entendedor, para ficar a saber o que se passa, até meia palavra basta.

Tem duas bochechas salientes e do que menos precisa para evidenciá-las ainda mais, é de ouvir um piropo de um rapaz que a faça corar de vergonha.

Conhece todos os cheiros, como poucos, o seu nariz aquilino, que vai ao encontro do gosto de quem para louvá-lo é capaz de fazer um discurso com tantos predicados que faria roer-se de inveja o escritor com aquele nome se fosse vivo.

Os lábios, do tom carmesim que às papoilas enfeita, mais do que sugerir um beijo para selar um final feliz, são para onde se encaminha o nosso olhar na esperança de ouvi-la pronunciar o nosso nome.

Que olhos, em cujo movimento está implícito um apelo! Que olhos em cujo brilho está implícita a alegria que lhe percorre a alma!

São como um fruto de cuja polpa se extrai o néctar que adoça a vida, duas nectarinas amadurecidas ao sol, astro ao qual só falta, para se lhe poder comparar, que ganhe o estatuto de ser considerado uma estrela ainda maior.