Assim vai a esquerda

Sou de esquerda por convicção e ideais. Não por filiação politica. Mas não sou simpatizante da esquerda radical. Gosto da esquerda moderada.
Mas feita a declaração de interesses, desagrada-me bastante ver que CDU e BE decidiram que o seu grande opositor na campanha é o PS. Se não o decidiram oficialmente, pelo menos parece.

Todos os dias vemos Jerónimo de Sousa e Catarina Martins apontar o dedo ao PS de Sócrates. Mas esperem: Sócrates é outra vez secretário geral do PS? Pode ser secretário geral e candidato a primeiro ministro, estando em prisão domiciliária? Não, não é, é António Costa.

Reparem que é 2011 a acontecer novamente. Recordemos: Portugal tinha défice abaixo dos 3% pela primeira vez na história em muitas décadas (até o Eurostat mudar as regras do cálculo do mesmo e obrigar a calcular todas as despesas, inclusive BPN, o banco governado pelos ex-secretários de estado e ministros de Cavaco Silva) e crescimento económico. Vem a crise económica e financeira internacional de 2008 que aumenta exponencialmente os juros do financiamento e PSD inicialmente auxilia o PS a viabilizar os PEC (planos de economia e crescimento), apesar de afirmar sempre que em Portugal o problema era o governo e não a crise internacional (mas justificou várias com a dita crise depois de estar no governo). Os PEC’s sofrem actualizações periódicas, o que dá origem aos PEC’s I, II e II e, chegados ao IV, Passos Coelho diz que não dá mais, que os portugueses não merecem nem aguentam mais austeridade. Sem o apoio do PSD, Sócrates diz que se demite se o PEC IV, já apreciado e aprovado tacitamente pelos maiores lideres europeus (como Merkel, por exemplo), não passar na Assembleia da República. A este ponto e, conhecendo a bipolarização partidária que existe (infelizmente) no nosso país, era certo e sabido que se o governo do PS caísse, a seguir vinha um governo de direita. E o que é que a esquerda faz? Juntou-se à direita para fazer cair o governo. E o previsível aconteceu: Sócrates cumpre e demite-se, direita (com ajuda do ministro demissionário das finanças e Mário Soares, segundo declarações do mesmo) pressionam o primeiro ministro demissionário a pedir ajuda financeira (isto é, a troika), há eleições, direita ganha, forma maioria coligada e executa um plano de austeridade duas vezes (pelo menos) pior que aquele que tinham vetado (o PEC IV).

Quem chamou a troika? Parece ser a pergunta do momento. Quem a chamou oficialmente foi quem legalmente o podia fazer: o governo demissionário socialista de José Sócrates. Mas Sócrates queria chamar a troika? Segundo todos os intervenientes, não. Teixeira dos Santos, ministro das finanças na altura, e Mário Soares disseram depois que foi muito difícil convencer o primeiro ministro demissionário – que preferira sempre um PEC previamente acordado com os lideres de Bruxelas do que a troika – a pedir auxilio financeiro. O ex-presidente até se vangloriou (como se fosse algo merecedor de tal distinção) de ter sido ele a convencer Sócrates que o FMI novamente em Portugal não era assim tão mau. Paulo Portas, líder do CDS, declarou na altura que governar com o FMI não seria um quebra cabeças, Passos Coelho, líder do PSD disse não recear governar com a troika no nosso país. Passos Coelho, poucas horas depois de vetar o PEC IV, voou para Bruxelas, para garantir a Merkel que iria cumprir tudo o que estava naquele plano. BE, PCP e Verdes nem sequer foram às reuniões com a troika para debater com eles porque não queriam a presença deles ou das suas medidas no nosso país.
Em suma, e a meu ver – ou não fosse este um artigo de opinião – enquanto Sócrates queria PEC IV e resolver o assunto recorrendo apenas à UE, Teixeira dos Santos e a direita forçaram activamente a vinda da troika. E BE, PCP e Verdes, indirectamente, acabaram por contribuir também para a sua vinda e para colocar a direita no poder, ao não ponderar os prós e contras dos seus votos. Vi num programa da SIC Francisco Louça responder a Miguel Sousa Tavares que votava por valores. A esquerda, ao votar “por valores” e não pelo que era melhor para o país e para os portugueses, votou, nas suas palavras, contra a austeridade e plano de privatizações do governo socialista, tendo, indirectamente, ajudado a colocar no poder uma maioria de direita que levou a cabo muito mais austeridade e foi muito mais além daquele plano de privatizações que haviam chumbado. E a esquerda, impossibilitada de vetar o que quer que fosse (sem ser as revisões constitucionais, porque carecem de aprovação por uma maioria qualificada de 2/3 dos deputados em efectividade de funções e não de uma maioria simples), viram a direita passar quase tudo na Assembleia. Até mesmo medidas inconstitucionais que, ainda bem, esbarraram no Tribunal Constitucional.

Na campanha actual vejo a esquerda contra a direita, mas vejo a esquerda “mais à esquerda” a “bater” bastante no PS. Parece-me uma táctica estudada, porque verificando-se a tal bipolarização partidária que acima falei, o mais provável é o PS ser eleito. Então a ideia parece ser “roubar” eleitores ao PS, repetindo vezes sem conta que o PS não é esquerda, não executa politicas de esquerda, seja qual for o programa que os socialistas apresentam.
Tendo ouvido Catarina Martins dizer que o BE, mediante algumas condições, está disponível para se aliar ao PS para executar um programa de esquerda, deixou-me surpreendido mas agradado naquele momento. Pensei “então a estratégia do Bloco é retirar a maioria ao PS, para os obrigar a coligar-se, a unir a esquerda no governo”. Mas, logo a seguir, continua a “bater” no PS e a descredibilizar o programa dos socialistas, mesmo naqueles pontos em que, no debate, disse estar de acordo. O PCP, por sua vez, sempre negou qualquer possibilidade de coligação com o PS.

A meu ver, não existindo maioria do PS (provavelmente não existirá, se as sondagens estiverem certas), gostaria de ver uma coligação de esquerda no poder. PS e PCP, por exemplo, já governaram coligados os destinos da capital, não vejo porquê não o poderiam governar o país. E, porque não, com o BE também. Parece uma opção demasiado radical até para mim, mas acho que BE e PCP no governo, para além de terem a oportunidade fazer em vez só de criticar quem faz (enquanto governantes), ficariam mais moderados enquanto membros do governo e o PS encostaria mais à esquerda. Para mim, antes isso que a reeleição de governo de direita ou bloco central. É a minha convicção.