– Minha senhora, a senhora é do povo e o povo é cascalho!

Por causa de qualquer coisa que não correu bem na China, apareceu o Covid-19. Por causa da falta de transparência ao princípio, ele espalhou-se nos outros países. Por causa de causar tantos mortos por contágio, os Governos decretaram confinamento. Por causa dos confinamentos, passou a haver restrições à circulação. Por causa das restrições, fecharam-se as fronteiras. E por causa do fecho de fronteiras em Portugal, mais de meia centena de barrosões, passaram a ter de percorrer diariamente cerca de duzentos quilómetros para ir trabalhar.

Não, ao contrário da ideia que possa dar, não se deslocam do concelho de Montalegre (Vila Real) para trabalhar na zona fronteiriça de Vilar Formoso. Só precisam de se deslocar até à Galiza, num trajeto de carro que anteriormente durava alguns minutos e agora acarreta uma tão grande perda de tempo como de dinheiro sempre que tiverem de encher o depósito.

Os encartados há menos tempo, vão em pouco tempo ter tanta experiência de condução que, se algum dia forem despedidos por chegar atrasados, sempre podem arranjar emprego no longo curso, a conduzir camiões de mercadorias por essa Europa afora.

E depois à volta, para não regressarem de mãos vazias, tragam de lá uns decisores políticos, mas que não sejam de pior qualidade do que os nossos. E porque não podem juntá-los nestes tempos de pandemia, comecem por trazer um para o lugar do desgastado ministro da Administração Interna, que talvez queira ir convosco se souber que param nalgum lugar com esplanada junto à praia.

O autarca de Montalegre aguarda sentado, resposta à missiva que remeteu com carácter de urgência ao ministério, declarando inadmissível que, num concelho com 800 quilómetros quadrados não haja um único ponto de circulação com passagem controlada, contrapondo os encerramentos de Montalegre/Baltar e Tourém/Calvos de Randim.

Em nome dos barrosões afetados, uma senhora queixava-se, e não espantava que do conforto dum gabinete aquecido em Lisboa, ouvisse dizer: “Minha senhora, a senhora é do povo e o povo é cascalho!”.

Impunha-se deslocar Guarda para pelo menos um destes postos fronteiriços, de forma a minimizar os prejuízos decorrentes dum aumento desnecessário de custos na vida destas pessoas. Ou estarão também os Agentes da Autoridade a escassear na região?

Não mandem tantos para Lisboa, que nos acessos à ponte 25 de abril, é onde eles gostam de estar a mandar parar o trânsito ao fim-de-semana.