O esqueleto escondido no armário de Israel

No passado dia 15 de Maio celebrou-se o 66º aniversário da Nakba – que significa ‘Catástrofe’ em Árabe-, período que coincide com a fundação do Estado de Israel, mas que se refere à expulsão e desapropriação dos Palestinianos da sua terra, o que incluiu a destruição de aldeias e vilas e uma das mais bem sucedidas limpezas étnicas alguma vez levadas a cabo.

Ainda assim, esta marcante data para o povo Palestino foi esquecida pela grande maioria dos meios de comunicação social ocidentais, ao contrário do que havia sucedido com as celebrações do Dia da Independência de Israel, devidamente assinaladas pelos media de maior destaque na semana imediatamente anterior. Os dois aniversários apenas não se aproximam ainda mais porque a fundação de Israel é definida de acordo com o calendário hebreu, que no ano de 1948 correspondeu a 14 de Maio, dia no qual David Ben-Gurion declarou o fim do Mandato Britânico da Palestina e a fundação do Estado de Israel.

Este esquecimento geral da efeméride Palestina por parte dos principais media ocidentais, deve-se  em grande parte à  estratégia Israelita de fazer esquecer o sucedido. Desde a sua fundação que Israel tem mitificado os eventos que rodearam a sua criação, tentando reescrever a história e transmitindo-a a futuras gerações através de manuais escolares que escondem este terrível segredo ou, através de uma máquina de propaganda ideológica que tem no seu seu Exército (por onde passam quase todos os Israelitas) um pilar moral venerado cegamente. Existiram mesmo leis que retiravam financiamento a organizações israelitas que incluíssem no seu plano de actividades a celebração da Nakba.

No entanto, esta foi desde muito cedo uma batalha impossível de vencer, já que, mesmo entre as fileiras Israelitas, existiram sempre historiadores que expuseram a verdade da Nakba, e que apesar de por vezes não terem o destaque merecido, fizeram ainda assim ouvir a sua voz.

Tudo isto se agravou com a chegada da era digital, e hoje em dia, só poderá alegar ignorância quem não frequentar o mundo da internet. O esqueleto escondido no armário de Israel voltou para assombrar. Aqueles que durante tanto tempo simplesmente negaram a História, são agora confrontados com a dura realidade. Seja nas redes sociais ou em sítios noticiosos online, muita informação pode ser encontrada sobre o ainda vigente conflito entre Palestina e Israel. Este fluxo de informação é impossível de ser completamente controlado por Israel  e permitiu, por exemplo, que fossem divulgadas imagens da encenação de uma marcha de regresso a Lubya, uma aldeia destruída e enterrada por Israel numa floresta perto de uma das suas principais auto-estradas. De notar que esta procissão – que simbolizou o ‘Direito ao Regresso’ invocado pelos Palestinianos para os 750.000 refugiados em consequência da Nakba- contou com mais de 20.000 Palestinianos, número que ultrapassou largamente o de protestantes de uma contra-manifestação de nacionalistas Judeus e forças militares Israelitas em conjunto.

Mas existem outros exemplos de como o mundo virtual trouxe de volta os fantasmas do passado. Zochrot, uma organização israelita gerida conjuntamente por judeus e Palestinianos, criou uma aplicação que localiza no mapa as mais de 400 aldeias palestinianas destruídas por Israel. A mesma organização tentou também inserir um módulo sobre a Nakba no ensino público israelita, mas viu o seu objectivo barrado.

A disputa no mundo virtual reveste-se de ainda maior interesse com o término de um processo de paz, que teve muito mais de processo do que de paz. O Primeiro-Ministro Benjamin Netanyahu, ainda persiste na tentativa de reescrever a história, agora através da legislação de Israel como um Estado Judeu, mas a margem de manobra diminuiu consideravelmente pois a opinião pública internacional já não nutre por Israel a mesma simpatia que outrora nutriu, e os principais aliados começam a ficar de pé atrás.

Deste modo, é absolutamente necessário que futuras negociações de paz partam de um pressuposto mais honesto do que o que tem sido hábito até aqui, e que as culpas que cada parte (incluindo o Ocidente) tem no cartório sejam finalmente assumidas. A Shoah, termo hebraico referente ao Holocausto, serviu de alavanca para a simpatia da opinião pública internacional relativamente à causa Judaica, e o mesmo parece estar a acontecer agora com a Nakba. Não vale a pena continuar a tapar o sol com a peneira, Nações que conseguem aprender com os seus erros tendem a ser mais felizes.

A actual estratégia de Israel não se compadece com o objectivo de uma paz justa e duradoura e a aproximação dos dois maiores partidos Palestinianos (Fatah e Hamas) acentua a necessidade de mudança. A formação de um novo governo da Autoridade Palestina (que até aqui havia sido uma Tecnocracia instalada pelo Ocidente) que integra também membros de um partido (Hamas) considerado por Israel como terrorista irá com certeza levar a um endurecimento de posições. Mas a realidade é que  Israel tem um iminente problema geo-estratégico para resolver (o crescimento acentuado das populações Árabes à sua volta) e a ocupação ilegal da Palestina através do estabelecimento de colonatos Judeus, deixou de jogar a seu favor. Cada vez mais, o tempo corre contra Israel.

henrique_dores_logoCrónica de Henrique Dores
Teoria do Caos