O “Finalmente” foi demasiado tarde

Há dias, na minha vida, em calmaria ou extenuada de barulho, que dou por mim a pensar em ti, pergunto a mim mesma: Será que ainda pensa em mim? O “Finalmente” foi demasiado tarde. Os anos passaram, o tempo passou, primeiro foram dias, depois meses, finalmente anos, talvez seja uma boa altura para escrever sobre nós, encerrar este capítulo de uma vez por todas, este capítulo inacabado da minha vida, que somente teve um começo, trouxe tantos fins, mas nenhuma despedida que fizesse desligar de vez o interruptor do talvez, sei por experiência própria que é melhor tentar e correr mal do que ficar eternamente sequiosa do talvez tivesse corrido bem mas eu não tentei para saber.

Ao longo da vida vamos conhecendo pessoas especiais, o problema é que não sabemos lidar com elas, não sabemos o que fazer com as pessoas especiais que nos estão destinadas e acabamos por cometer erros, acabamos por nos afastar porque o sentimento entre ambos é tão forte, a química esmaga-te por dentro e sentes-te tão fora da caixa que tens medo e te retrais e foges. Foi exatamente isso que eu fiz, uma, duas, demasiadas vezes até já não me ser permitido fugir mais porque já não valia a pena.

Quero que saibas que fui feliz contigo, aqueles momentos tão nossos e só nossos, eu fui feliz contigo, tenho saudades tuas, tenho saudades dos nossos momentos e tenho sobretudo saudades da pessoa que eu era quando estava contigo, genuína, verdadeira e estupidamente feliz. Nunca mais consegui ser dessa forma, posso ser muitas outras coisas, umas melhor, outras pior, mas nunca mais a mulher que eu era quando estava contigo. Não soube o que fazer com a boa sensação de estar apaixonada, não estava habituada a essa leveza de sentimentos e estraguei tudo. Enumerei os piores defeitos, até aqueles que não tinhas, deduzi problemas futuros que a nossa relação iria ter, como se eu percebesse alguma coisa do futuro, fui racional quando tinha de aproveitar o momento, temi que não mudasses o teu génio mulherengo, logo tu que sabias que eu era mulher de um homem só e que não suportaria viver nessa dualidade, queremos sempre aquilo que não podemos ter, lembras-te de quando eu te disse isso?

O tempo não volta atrás, os anos, os momentos, isso corroí-me, dilacera-me, entristece-me, destrói-me, porque hoje, aos olhos da minha maturidade eu teria feito tudo de forma diferente e não teria hesitado um minuto em ficar contigo, mas o tempo não volta atrás e não há absolutamente nada que eu possa fazer para mudar essa fatalidade. Viver com essa frustração interior é o maior ato de coragem que o homem pode ter.

Não imaginas a quantidade de noites que adormeci a chorar, desesperada, a desejar acordar sem pensar em ti, porque eu não estava contigo e isso criava em mim um antagonismo insuportável, não tens a noção das vezes que esperei uma mensagem tua, um telefonema, não fazes a mais pequena ideia das vezes que nos idealizei juntos, em idílicos locais construídos pela minha vontade e devaneio. E quando estou de espírito sossegado, quando tu és apenas uma miragem bem lá longe, vem aquela música, aquele filme, aquela frase, aquela personagem, aquele cheiro de perfume, o relógio, o olhar enigmático, as mãos macias e lá volto eu à minha fantasia, desenrolo repetidamente os momentos que ambos vivenciamos até a dura e insípida realidade me chamar.

Não sei se nos voltaremos a ver, se voltaremos a falar, se nos miraremos mais uma vez, não sei como estás, se tens alguém, se encontraste a mulher da tua vida, aquela que te iria fazer feliz no meio de tantas mulheres que conheceste ao longo dos teus quarenta e quatro anos, não sei como está a tua família, a tua mãe, o teu pai, perdi-te e perdi o teu rasto, o meu paradeiro também desconheces e é melhor para ambos que assim seja. Não sei se acreditas no destino ou preferes o acaso da vida, nós fomos mais silêncio do que longas conversas, mas deixa-me confessar algo que te disse uma vez ao ouvido enquanto dançávamos: Eu amo-te. O amor, percebo agora, pode existir de tantas formas. Não sei se era destino as nossas vidas se cruzarem mas tenho a certeza que não está destinado ficarmos juntos, talvez essa certeza traga a paz que eu preciso para continuar o meu caminho da melhor forma que sei. Há dias, na minha vida, que dou por mim a pensar em ti, pergunto a mim mesma: Será que ainda pensa em mim? O “Finalmente” é demasiado tarde.