O FMI é quem manda aqui – Nuno Araújo

O FMI é “quem manda aqui”, soubemos todos pela voz de Marques Mendes. Com isso, o risco de bancarrota disparou, um segundo resgate é mais do que certo e acertam-se estratégias para uma saída airosa de Portugal do Euro, em conjunto com outros países.

“O FMI é quem manda aqui”

A grande “bomba” veio de Marques Mendes, no sua participação semanal no programa da TVI, “Política Mesmo: “Quem vai assessorar tecnicamente o Governo na elaboração deste estudo para a reforma do Estado vão ser técnicos do FMI. De resto, já chegaram esta semana a Portugal, já cá estão, já reuniram com alguns ministérios, em particular com a Administração Interna e com a Defesa, e vão ser a assessoria técnica especializada no estudo e na definição do esqueleto e das medidas desta reforma”.

Pois é. Se dúvidas restassem, agora ficaram dissipadas. Afinal, o FMI é quem, de facto, manda aqui, em Portugal. Senão vejamos: António José Seguro, líder do PS, tinha sido convidado dias antes por Passos Coelho para se juntar a uma alegada “refundação” do programa de ajustamento. Pois, dias mais tarde, Marques Mendes diz que essa “refundação” já está em marcha há alguns dias.

Não me parece que Passos Coelho quisesse melindrar o PS. Seria sempre melhor para o PSD entender-se com o PS do que ostracizá-lo, como ficou patente, tanto na atitude do primeiro-ministro, convidando o PS a juntar-se a um “refundamento” do memorando, como no que foi dito por Marques Mendes, que basicamente relega o PS para fora do plano decisório.

Seguro nunca irá aceitar entrar numa negociata em que o FMI exija cortar mais de 4 mil milhões de euros em despesa. Seguro disse que “o ataque ao estado social ameaça a estabilidade do país”.

Será que Passos Coelho sabia que Vítor Gaspar tinha pedido ajuda técnica ao FMI, aquando do convite ao PS?

Será que Marques Mendes “tramou” uma possível estratégia de Passos Coelho, que poderia consistir em juntar o PS a uma revisão do memorando já em marcha e já com objectivos definidos à priori?

Será que vamos ter uma crise de regime?

Será que 50 mil funcionários públicos verão o seu salário ser ainda mais reduzido?

Seja como foi, o FMI é quem decide onde se corta, como se corta e quanto se corta. Tantos pedaços de soberania nacional espalhados, e naturalmente na posse de interesses privados, às vezes sem rosto, mas claramente motivados para uma “desmantelação” do estado social português

O risco de bancarrota disparou

Desde 18 de Outubro, altura em que Paulo Portas e Pedro Passos Coelho tiveram alguns “desaguisados”, o risco de bancarrota portuguesa aumentou sete pontos percentuais. O ranking elaborado diariamente pela CMA Datavision, que analisa e agrupa dados recolhidos em diversas bolsas de valores pelo mundo fora, destaca que Portugal está com probabilidade de incumprimento de 37,68%, situando-se num delicado 6º lugar. Essa tabela é liderada pela Grécia, que é seguida pela Argentina e Chipre.

Portugal já ocupou a 9ª posição. Esteve quase a sair dessa famigerada tabela. No entanto, os ventos sopram contra este governo PSD-CDS, e o desentendimento entre os parceiros de coligação deixará mossas evidentes na saúde financeira do país.

Não é a miserável descida de 0,1% na taxa de desemprego que poderá dar alento a este governo em decadência. Essa décima percentual que caiu deve-se aos milhares de professores que retomaram funções e cujos contratos, ou prestações de serviços, cessam nas férias escolares, logo quando o ano lectivo tem início, eles também deixam de estar “desempregados” para voltarem à sua eterna condição de “precários”. O que é melhor do que estar desempregado, sem dúvida alguma.

Portugal: segundo resgate?

O orçamento foi aprovado pela maioria PSD-CDS, com uma excepção honrosa e digna de menção. O deputado do CDS eleito pela Madeira votou contra o documento, juntando-se ao uníssono da esquerda, desde o PS, PCP, Verdes e Bloco de Esquerda, que votou contra.

Nesse debate, falou-se da iminência de um segundo resgate a Portugal. Sim, porque Passos Coelho admitiu a existência de um plano B, que será posto em marcha caso o execrável orçamento de estado não sirva os intentos do governo. Perto de 800 milhões de euros em cortes é a medida que o governo implementará caso a conjuntura para Portugal piore.

Se as coisas piorarem, Passos Coelho terá um dilema: demitir-se-à, caso seja forçado a pedir segundo resgate? Ou manter-se-à em funções, até que Rui Rio, por exemplo, encabeçe um governo de iniciativa presidencial, como Mario Monti em Itália?

Certo é que existe a real possibilidade de unidades de saúde familiar e até algumas escolas passarem a ser geridas por entidades privadas. O ensino tendencialmente gratuito também terá os seus dias contados, tal como a segurança social quanto às reformas, pois a idade de reforma terá um aumento com toda a certeza.

Daí que surjam declarações incendiárias do capitão de Abril Vasco Lourenço, que até fala numa guerra na Europa como sendo inevitável.

Portugal: saída do Euro?

Os “amigos da coesão”, Bulgária, Espanha, Estónia, Grécia, Hungria, Lituânia, Letónia, Malta, Polónia, Portugal, República Checa, Roménia, Eslovénia, Eslováquia e Croácia,juntar-se-ão para uma reunião de trabalho, no dia 13 de Novembro, em Bruxelas. Um dia antes da vinda de Merkel a Lisboa, onde permanecerá durante seis horas (tal como fez em Atenas), Passos Coelho juntará mais de 15 líderes de países da UE, por forma a acertar estratégias comuns de combate à crise europeia.

Mais: o quadro financeiro europeu para o período 2014-2020 está a ser revisto, e sofrerá um corte de 3,7 por cento, no mínimo. Os “amigos da coesão” pretendem fazer com que o quadro financeiro plurianual não seja elaborado de acordo com as pretensões alemãs, finlandesas, britânicas e suecas. Estes países, Alemanha, Finlândia, Grã-Bretanha e Suécia, a par de França, Holanda e Aústria são os grandes “endorssers” (contribuintes) do orçamento comunitário. Esse apoio financeiro tem um preço: as quotas de mercado e produção desses países são também maiores do que as quotas dos países que, como Portugal, recebem apoio financeiro directamento desse quadro comunitário.

Com efeito, esta é a grande batalha em vigor nos bastidores da política europeia. Obviamente que por isto se explica a sugestão do governo sueco em que a Grécia saia do Euro (e porque não da UE, já agora?), pois assim os fundos comparticipados poderiam ser ainda mais escassos, mas os outros países poderiam não ficar a perder assim tanto.

Se o orçamento comunitário não for emagrecido como esses países “ricos” do norte da Europa pretendem, teremos UE por mais alguns anos. Porém, se juntarmos cortes significativos no orçamento desse quadro financeiro plurianual à crise que assola a Europa, teremos desintegração e não integração europeia. Sem integração europeia dos países mais pobres não há União Europeia.

Para reflexão

Robert Jan Smits, director-geral da Research and Innovation da Comissão Europeia, perguntou a 25 analistas, entre os quais se inclui o português João Caraça, acerca dos cenários políticos, económicos e sociais para 2050.

Os estudos elaborados pelos analistas tiveram em conta e hipóteses, quanto a cenários possíveis: 1) um cenário “nobody cares”, em que a Europa está num “muddling through process”; 2) a Europa sobre a ameaça de uma decadência económica e reacções proteccionistas; 3) o renascimento da Europa, em que a UE se alarga ainda mais e se torna mais forte e com mais sistemas e estruturas eficientes.

Dentre inúmeros factores dignos de interesse, salinte-se que em todos os cenários a noção de média-idade muda para os 55 anos, em que a esperança média de vida europeia chegará aos 97 anos (nalguns países, chega mesmo aos 108 anos).

Os três cenários afirmam que as telemóveis suplantarão o uso dos computadores portáteis, tanto no acesso à internet, como na elaboração de outras tarefas.

Mais: aponta um “wild card” para uma revolução democrática na China (o melhor cenário para o país) que será feita de forma pacífica e em 2033.

O médio-oriente terá paz lá para 2040.

Em 2050, uma aliança mediterrânica tomará forma, assim como uma união pan-árabe. A Rússia e a Turquia farão parte da UE.

Enfim, apenas alguns apontamentos para reflexão.

Notas

Os EUA saberão dia 6 quem será o presidente da república norte-americana. Barack Obama lidou extremamente bem com o furacão Sandy, que causou mais de 50 mil milhões de dólares em prejuízos materiais, e em que as baixas humanas não serão menos que 60 baixas. Mitt Romney pode mesmo ter perdido as eleições após estes acontecimentos.

A China terá no 18º congresso do Partido Comunista Chinês (PCC) um dos mais importantes momentos políticos da história mais recente do país. Com início a 8 de Novembro, pode seguir a par e passo essa importante reunião através deste link: http://www.scmp.com/topics/18th-party-congress

Crónica de Nuno Araújo
Da Ocidental Praia Lusitana