O Jogo do Copo!

“UuuuuUuuuUuuuUuuuu!” Não, isto não sou eu a imitar um comboio. Isto sou eu a tentar ultrapassar um trauma de criança, mas de uma forma bastante infantil. E de que trauma estou a falar, pergunta o leitor. Ó leitor, pelo amor da santa, olhe para o título, ó fáchavôr! Sim, isso mesmo: estou a referir-me ao famoso e aterrador “Jogo do Copo”!

Quem nunca se atreveu a passar por esta experiência de adolescência, que atire a primeira pedra. (Se, porventura, o leitor até trabalhe numa pedreira, considere-se excluído do grupo que pessoas que podem “atirar a primeira pedra”. Até, porque, com a experiência que tem em manusear pedregulhos do tamanho de um avião, isso pode ser uma coisa bastante perigosa aqui para os meus lados.)

O “Jogo do Copo” era um jogo macabro que consistia em falar com espíritos que andam, perdidamente, a pairar pelo nosso mundo – malta preguiçosa que não quis seguir a “Luz”. Colocava-se numa mesa, tabuleiro ou chão, todas as letras do abecedário separadamente, e um “SIM” e um “NÃO” no centro. Depois, colocava-se um copo virado para baixo e, após todos os “jogadores” colocarem o seu dedo indicador no topo do copo, chamava-se então pela alma perdida que andasse, eventualmente, a passar por ali, naquele preciso momento. Provavelmente, porque não tinha mais nada para fazer, e estava ali sentado algures a ler um livro e tal, como quem não quer a coisa – diz que os espíritos fazem essas coisas… Existiam algumas regras que se tinha de seguir à risca, para que coisas más não nos acontecessem (Sim, porque os espíritos são malta que tem cá um mau-feitio do camandro! Será por andarem a vaguear por aí à toa, há imenso tempo? Eu cá, se fosse espírito, fartava-me rapidamente de andar por aí sem fazer nada. Provavelmente, teria de optar por me suicidar. Que, não fazer nada, é coisa para um espírito ficar depressivo num instantinho.).

Numa tentativa de relembrar velhos tempos de adolescência, decidi voltar a jogar o “Jogo do Copo”, só para tentar descobrir quem é a malta que, todas as noites, dorme comigo sem eu saber. E, caro leitor, o que eu descobri foi mais surpreendente do que estava realmente à espera. Tomei a liberdade de registar a conversa que tive com dois espíritos, e que vou apresentar de seguida, para que o leitor entenda o porquê de ter sido uma experiência surpreendente.

(Comecei por sentar-me em frente às letras e ao copo e, após colocar o dedo no topo do copo, disse: “Está aí alguém?!”)

Espírito: S-i-m.

Eu: Ah, e vindes em paz…? (Por favor, diz que sim…)

Espírito: N-ã-o. T-a-l-v-e-z. S-i-m.

Eu: (Olha agora… Tinha de me calhar logo um espírito bipolar…) Bom, eu vou assumir que vieste em paz… Olha, já agora, como é mesmo o teu nome?

Espírito: B-e-t-t-y G-r-a-f-s-t-e-i-n.

Eu: Hã?! A Betty Grafstein do José Castelo Branco?! Não pode ser! Ó espírito, vai lá gozar com outro! A Betty ainda está viva!

Espírito: E-u e-s-t-o-u m-o-r-t-a h-á m-u-i-t-o t-e-m-p-o, m-a-s n-i-n-g-u-é-m s-a-b-e.

Eu: Mas como?! Mas você aparece na televisão e tudo. A sorrir e, basicamente, a mexer-se! Isso não pode ser!

Espírito: S-ã-o a-s p-l-á-s-t-i-c-a-s q-u-e m-e m-a-n-t-ê-m e-m p-é. E-u e-s-t-o-u m-o-r-t-a h-á m-u-i-to t-e-m-p-o.

Eu: Jasus! E o José Castelo Branco está a par disso?

Espírito: S-i-m. E-l-e g-o-s-t-a a-s-s-i-m… À n-o-i-t-e, a-m-a-r-r-a-m-e d-e-n-t-r-o d-o a-r-m-á-r-i-o e v-a-i b-r-i-n-c-a-r a-o-s m-é-d-i-c-o-s e-m h-o-t-é-i-s c-o-m c-a-s-a-i-s e-m-p-r-e-s-á-r-i-o-s.

Eu: Que medo… Bom, vai lá indo para o armário, que eu queria falar com outro espírito.

Espírito: A-d-e-u-s.

Eu: Adeus, pá.

(Segundo espírito:)

Eu: Está aí alguém?

Espírito: S-i-m.

Eu: Viestes em paz, ou viestes para abandalhar isto tudo?

Espírito: E-m p-a-z.

Eu: Ah, assim está bem. Então diz lá: como é que te chamas?

Espírito: A-n-í-b-a-l C-a-v-a-c-o S-i-l-v-a.

Eu: Oi?! O Presidente da República?! Mas tu estás vivinho da silva, pá! Estás maluco, ou quê?!

Espírito: O-l-h-a p-a-r-a a t-e-l-e-v-i-s-ã-o.

Eu: Sim, estou a olhar. Estou a ver o Presidente da República a discursar no 10 de Junho… Espera… Ups, parece que se sentiu mal… e… ui, desmaiou…

Espírito: M-o-r-r-i.

Eu: Morreste nada, pá! Tu só desmaiaste!

Espírito: F-a-l-e-c-i.

Eu: Ai, o catano. Deixa-te de tretas e volta mas é para o teu corpo, e acaba o raio do discurso de 10 de Junho, pá! Isto só visto…

Espírito: O-h, q-u-e t-r-e-t-a! P-e-n-s-e-i q-u-e t-i-n-h-a f-a-l-e-c-i-d-o. I-s-t-o q-u-e-r d-i-z-e-r q-u-e t-e-n-h-o d-e v-o-l-t-a-r a a-t-u-r-a-r o-s p-r-e-s-é-p-i-o-s d-a m-i-n-h-a M-a-r-i-a?

Eu: Pois, parece que sim…

Espírito: B-o-l-a-s. P-r-e-f-e-r-i-a t-e-r m-e-s-m-o f-a-l-e-c-i-d-o!

Foi uma experiência do camandro! Principalmente, por ter tomado conhecimento de que a Betty Grafstein dorme comigo todas as noites… Ui, que até se me arrepia os pêlos do… do… cú? Medo…

Até para a semana, malta catita…