Porto de riscas verdes e brancas

Mesmo que o Porto ganhe o campeonato, não o ganhará à Porto.

Mesmo que o Sporting perca o campeonato, não o perderá à Sporting.

Isto, porque as equipas também têm uma marca registada, o exemplo mais paradigmático disso mesmo, é a facilidade com que o estilo de jogo mais em posse de bola, que uma equipa possa ter, ser logo rotulado de “jogar à Barça”. A marca portista, é mais do que ganhar, é ganhar à André, à João Pinto, à Jorge Costa e a outros tantos que estiveram na génese do famoso, jogar à Porto.

Enquanto crescia, vi diversas equipas portistas com menor talento que os seus rivais, reflexo dos menores meios financeiros que os seus rivais, ganharem aos… seus rivais.

E sim, isto acontecia porque o Porto era desafiador, era provocador, no fundo, era bélico. E então? O futebol não é mais do que uma pequena simulação de guerra, só que com muita maior técnica envolvida e sem aquela coisa chata dos falecimentos em massa.

Lembro-me dum jogo que perdemos, numa época em que também perdemos, mas que foi uma das maiores demonstrações do que é a marca registada portista. Citando de memória, desculpem se tiver alguma incorreção, mas recuso-me a beliscá-la com a realidade: o Porto perdia por 3-0 em Belém, uma derrota que nos afastaria, como afastou, da hipótese de lutar pelo campeonato. Pois bem, Jorge Costa foi para cima, com a cara do meu desespero de adepto, galvanizando os seus colegas, e de ressalto em ressalto, colocou a bola dentro da baliza do Belenenses. Sem festejos, quase a chorar, ele sabia que não havia tempo para mais nada, pegou na bola e trouxe-a para o meio campo. De todas as vitórias que testemunhei, das Antas ao Dragão, da TV a outros estádios, esse momento foi único. A expressão do jogador, a garra com que ele lutou, até as picardias que arranjou durante o jogo, eram Porto dos pés à cabeça.

Como é óbvio, não existe portismo que sobressaia na incompetência, e ao contrário do nervosismo da nobreza decadente apresentado pelos rivais, o Porto tomava as melhores decisões sem precisar de atirar dinheiro aos problemas. Por isso, contratavam-se os treinadores sem nome, vindos de clubes menores, mas que tinham classe mundial na sua liderança. A direção sabia que a escolha do treinador era o momento-chave da época.

E assim cresceu o Porto, e assim ganhou o Porto, e assim não agiu, nos últimos anos, o Porto.

A atitude desafiante deu lugar ao comportamento sobranceiro, a racionalidade na gestão deu lugar ao atirar de dinheiro para cima dos problemas, a atitude bélica deu lugar ao sentimento que a vitória pertencia ao clube por um qualquer direito divino.

E tudo isto é um ciclo, sem gestão desportiva à Porto, não existem jogadores à Porto, sem eles, não existe jogar à Porto.

Este Porto faz lembrar alguns daqueles Benficas e Sportings que desafiou há 30 anos atrás, que utilizaram todos os seus meios financeiros, com muita sobranceria pelo meio, para evitar a subida dos azuis e brancos.

E é isso que o Porto tem feito nos últimos anos, atirado dinheiro aos problemas, deixando a arena vazia e perdendo por falta de comparência para aqueles que arregaçam as mangas.

Do outro lado, surge um clube que desafia com uma atitude bélica, que se expressa em campo, num processo que tenta copiar a marca registada portista, visto que o registo parece ter caducado de validade.

Um clube que contratou os três melhores treinadores do mundo disponíveis para treinar em Portugal, usufruindo da passividade de quem preferiu o provincianismo do treinador estrangeiro, um clube que não tem medo do ridículo e que vai à luta, um clube com um discurso forte e bélico.

É certo que nos tempos áureos da competência azul, não se demitiram treinadores com a classe de Marco Silva, nem tão pouco, se criaram condições para os Jardins desta vida se quererem ir embora à primeira oportunidade, não, nessa altura, aos Silvas e aos Jardins eram dadas as melhores condições, para eles poderem brilhar o máximo que as suas grandes capacidades conseguissem. No entanto, alguém viu algum Silva ou algum Jardim nestes últimos três anos no Porto?

E aí está o problema, talvez seja uma inevitabilidade inerente à humanidade, todos os grandes impérios na história perderam capacidades, deixaram-se ultrapassar, sucumbiram aos vícios e ao aburguesamento.

O certo, é que eu olho para este plantel do Sporting, e vejo um plantel com menor talento que o seu rival, mas quando olho para a classificação, vejo-o à frente do rival. Onde é que eu já vi este filme?