Rogue One: Uma História de Star Wars (Review)

É arriscado mexer no universo Star Wars, há sempre alguém que não gosta e que esperneia todo o seu ódio nas redes sociais. Rogue One veio mexer com os momentos mais sagrados da trilogia original, através de uma história alternativa, mas mesmo assim, através de grande habilidade escrita e visual consegue conectar-se com 1977 de uma forma alucinante. Vamos já descobrir porquê mas para já um pequeno apontamento: Haverá spoilers mínimos que não estragarão com certeza o prazer de ver o filme!

Título Original: Rogue One: A Star Wars Story

Ano: 2016

Realizador: Gareth Edwards

Cinematografia: Greig Fraser

Produção: Simon Emanuel, Kathleen Kennedy, Allison Shearmur

Argumento: Chris Weitz, Tony Gilroy, John Knoll, Gary Whitta

Actores: Felicity Jones, Diego Luna, Alan Tudyk, Donnie Yen, Mads Mikkelsen

Música: Michael Giacchino

Género: Acção, Aventura, Ficção Cientifica

 

Rogue One é, logo de início, um filme que se tenta distanciar da natureza episódica da saga de Lucas. Para grande espanto da audiência não há qualquer opening crawl e, pela primeira vez na história da saga o flashback explica e introduz as personagens mais importantes. A única aparição de um titulo surge 5 minutos depois, e as palavras “Star” e “Wars” estão completamente ausentes, assim como a música do veterano John Williams. O único momento em que a música pareceu deslocada foi com este título, que surge e desvanece com um apontamento musical que não se enquadra facilmente nas emoções desses primeiros minutos de filme. Com todos estes elementos e particularidades iníciais poderá existir o sentimento de que isto já não é Star Wars mas, passadas duas horas, e embora seja impossível uma opinião unânime, Rogue One é tão digno da saga de Lucas como os sete episódios que conhecemos.

A história gira a volta de Jyn Erso (Felicity Jones), filha de Galen Erso (Mads Mikkelsen), o cientista responsável pelo planeamento da Estrela da Morte. Procurado pelo Império e sem escapatória Galen é obrigado a abandonar a sua filha e a cooperar com o Império, o mesmo que lhe matou a mulher.  Jyn acaba por viver uma vida de constante revolta, acabando por ser resgatada e recrutada pela Aliança Rebelde no intuito de contactar Saw Guerrera (Forest Whitaker), antigo mentor e figura chave para encontrar Galen Erso.

O filme tem claramente duas partes distintas que são acentuadas no cinema através de um intervalo, que pela primeira vez, e talvez por bom senso, não se tornou intrusivo. A primeira parte é episódica, com a introdução das personagens principais, que não se encontram em qualquer outro filme e que por isso necessitam de algum tempo para cimentar a sua presença. Nem sempre as personagens têm o tempo que necessitavam, mas haverá com certeza inúmeros livros nas particularidades crossmedia de Star Wars de forma a colmatar algumas destas faltas. A segunda parte é todo um terceiro acto alucinante, que leva a história para um novo nível, e vê o regresso de uma das personagens mais icónicas da saga, que com apenas quatro minutos de tempo de antena protagoniza um momento de horror que ficará sem dúvida na história como uma das cenas mais espectaculares de todo o universo. É fabuloso constatar como Rogue One se liga de maneira tão perfeita com A Nova Esperança, respondendo a questões que estavam em aberto desde 1977 e levantando outras sobre as quais ninguém tinha propriamente reflectido.

A narrativa é bastante terrena, bastante adulta e com bastantes riscos numa saga normalmente para um público miúdo e graúdo. Rogue One não é um filme para a criançada, em muitos aspectos e acentua o verdadeiros significado do titulo da própria saga. Se há “guerra” nas estrelas, o grande exemplo é Rogue One. É Disney, mas não se preocupem os fãs que esperavam a completa destruição da saga. Este é um filme “gamotronesco” e bastante real na maneira como retrata a guerra e a luta diária entre Rebeldes e Império, com claras analogias que reflectem o nosso mundo.

Mas falemos de efeitos especiais. Sem dúvida que Rogue One eleva a fasquia em vários aspectos, mas há um que me deixou espantado pela positiva. Peter Cushing foi Grand Moff Tarkin em 1977 e volta a “representar”o seu papel em 2016. O grande problema é que morreu em 1994. Estranho? Confuso? Sem dúvida! Mas o actor regressa não para fazer um pequeno cameo, mas para representar durante vários minutos em todo o seu esplendor, ressuscitado no CGI mais técnico e fiel que alguma vez vi em cinema. O resultado é fenomenal, e o actor que o interpreta, Guy Henry, com uma voz muito semelhante e emprestando o seu corpo de forma a auxiliar a tecnologia de captura de ecrã, faz um trabalho fenomenal. Só tinha ficado espantado com este tipo de tecnologia uma vez e já este ano, com Anthony Hopkins em Westworld. Outra personagem aparece também durante breves instantes, mas sobre ela quero manter o factor surpresa. Não tão bem executada em termos técnicos não deixa de causar a emoção pretendida na audiência. Não compreendo, no entanto, o ódio a esta técnica. Está a poucos passos de se tornar perfeita e usada em exagero pode destruir muitas experiências cinematográficas nos próximos anos, mas neste filme mostrou que é uma opção e se bem feito uma forma de homenagear os que já partiram.

Mas falando de actores reais, Felicity Jones é mais uma heroína para uma galáxia muito distante e foi sem dúvida uma boa aposta. Embora Jyn Erso seja sem dúvida uma óptima personagem, os que vão certamente ficar mais tempo com a audiência serão K-2SO (Alan Tudyk) e Chirrut Îmwe (Donnie Yen). Tudyk era o “droid que procurávamos” e funciona como comic relief, por vezes na sua vertente mais negra. Já Donnie Yen, é um monge cego que no seu handicap encontrou uma maneira de se tornar mais forte, com a Força como aliada. São as duas personagem mais memoráveis neste novo leque que preenche o universo. Ben Mendelsohn, no papel de Orson Krennic, é vilão da trama mas nalguns momentos senti que era também a vitima das forças que representa, e isso trouxe alguma simpatia, especialmente no acto final. Mads Mikkelsen como Galen Erso é de certa forma bem concretizado, mas não tem grande espaço para brilhar.

A música de Michael Giacchino mostra que o compositor é um bom descendente de Williams, mas também lembra que é impossível igualar o mestre. Algumas alusões a temas anteriores tornam a sua banda sonora completa e alguma liberdade criativa transforma-se também numa maneira de se destacar. Giacchino dá-nos um pouco de tudo, desde uma Imperial March original,  The Imperial Suite a um lado sentimental muito próximo de Williams com Jyn Erso & Hope Suite.

Rogue One é um dos grandes filmes da saga, tem uma boa dose de tudo e completa toda a história de uma forma surpreendente, ao ponto de mudar a nossa perspectiva de tudo ao revisitar Uma Nova Esperança. Para alguns aproxima-se de O Império Contra-Ataca, noutros está apenas um pouco acima das prequelas, mas uma coisa é certa, é Star Wars(!), e tem tudo a ganhar pela sensibilidade de Gareth Edwards, que agarrou todas as cartas, de todos os filmes sem dispensar as prequelas, e os introduziu em doses iguais numa aventura épica que se destaca sozinha numa narrativa com início, meio e fim, sem questões por resolver, numa narrativa coerente e fácil de seguir. Rogue One é a prequela que necessitávamos!

8.5

R.I.P. Carrie Fisher – “Charming to the Last.”

Esta análise tem, no entanto, de acabar com uma nota trágica, que de certo modo também atrasou todo o processo de escrita da mesma. É difícil escrever como fã de Star Wars, tornar tudo neutral e bem analisado quando é a saga da nossa vida. No entanto, é ainda mais difícil com a morte inesperada de Carrie Fisher. É difícil e injusto isolar a actriz que nos deixa apenas num papel, mas sem dúvida que a escritora e argumentista teve a personagem da sua vida como Princesa Leia, com todo o seu contributo para a história do cinema e, pela representação que contribuiu para a queda do estereótipo de que “princesa” significa”donzela indefesa”. Como representante da luta contra os transtornos mentais, assumiu os seus problemas e deu força a quem passa pelo mesmo, com o auxilio do seu sentido de humor acutilante, que não parece ter deixado ninguém que a conheceu indiferente. O mundo do cinema fica mais pobre, e todos os fãs da saga ficam sem a “sua” princesa.

Era sem dúvida demasiado cedo para a actriz, mas 2016 não foi um ano que se importasse com isso. Resta apenas dizer que Carrie Fisher pode ter morrido de ataque cardíaco, mas vamos pensar, como era desejo da mesma, que morreu “afogada de luar, estrangulada pelo seu próprio sutien“. Este é o verdadeiro testemunho do sentido de humor de Fisher e é aquele que devemos recordar.

Volto para o ano, com mais cinema!