Se lhe disser que sou assistente social, o que me dirá a seguir?

Em Portugal, a profissionalização do Serviço Social dá-se no período ditatorial, em que havia uma ligação entre o Estado e a Igreja, por causa da influência da conjuntura europeia marcada pela guerra civil de Espanha, pela ascensão do fascismo e do nazismo. Contudo, foi com a 2ª Guerra Mundial que o Estado Novo reconheceu o estatuto da profissão de assistente social, considerando-a indispensável ao ponto de a integrar nos serviços públicos. Isto foi o resultado de uma centralização nos Direitos Humanos e que, em paralelo, levou à construção de sistemas de proteção social. O Estado passou a assumir a responsabilidade e o compromisso de promover o bem-estar da sociedade, legislando e criando serviços de proteção para indivíduos, famílias e grupos de risco.

Mas, caro leitor, permita-me a ousadia: assim que leu o título, o que pensou? “Sim, não são aqueles que ajudam as pessoas carenciadas ou verificam as condições em que vivem as pessoas?”

A sociedade está cansada e, verdadeiramente, formatada nessa ideia porque também é a única imagem que passa nos meios de comunicação social. A questão é que temos uma profissão digna e deveras ampla, (tanto quanto possível) mas cingida a um pensamento diminuto.

Há que entender o serviço social, que dá a expressão à profissão do assistente social, numa visão holística, ou seja, compreender, integralmente, os fenómenos e não a análise isolada dos seus constituintes.

Segundo a definição da International Association of Schools of Social Work (IASSW), “A profissão de Serviço Social promove a mudança social, a resolução de problemas nas relações humanas e o reforço da emancipação das pessoas para promoção do bem-estar. Ao utilizar teorias do comportamento humano e dos sistemas sociais, o Serviço Social intervém nas situações em que as pessoas interagem com o seu meio. Os princípios dos direitos humanos e da justiça social são fundamentais para o Serviço Social.” (IFSW, 2003).

Utilizando alguns conceitos da definição acima citada, arriscamo-nos a entrar num clichê e num campo um pouco frágil para a condição geral de estar do ser humano.

Falar em mudança (social), em relações humanas, em direitos humanos, transpõe-nos para uma realidade com a qual não somos confrontados diariamente. Ou, se formos confrontados, é de forma indireta sem sequer pensar que são conceitos básicos de uma vivência em sociedade, não é verdade? Mas são! E para o assistente social são objetivos ou conceitos-base que delineam um diagnóstico concebido para uma intervenção.

Agora reflitamos, caro leitor: Uma pessoa que age, profissionalmente, segundo os princípios dos direitos humanos, é uma pessoa com a tão polémica imagem, passada nos meios de comunicação, daqueles que “retiram filhos a mães”? O problema é que a comunicação social está demasiado focada em vender as histórias, ao invés de as reportar, tendo em consideração as motivações, os contornos de cada situação. Isto, porque a zona cinzenta é muito mais real do que a simplificação idiótica do preto e branco.

“O Serviço Social tem como princípios fundamentais os direitos humanos a defesa da liberdade, da igualdade, da justiça social, do  pluralismo e da cidadania, tendo em vista a superação da opressão,  da fome, da pobreza, do desemprego, das desigualdades e das discriminações sociais.”

Há uma necessidade de transformação social, de fortalecimento de autonomias, de participação e exercício da cidadania, defesa e conquista de direitos humanos e justiça social. Tudo isto é operacionalizado num compromisso mútuo entre o assistente social e o sujeito de atenção (designação académica dada ao sujeito com quem se intervém, ou seja, a pessoa a quem temos que prestar atenção). Contudo, muitas vezes, para uma perceção clara e uma intervenção operacionável e resoluta, há que conhecer também as redes primárias ou secundárias do sujeito. As redes primárias são entendidas como as pessoas mais próximas e com alguma relevância para o sujeito de atenção. De outro modo, as redes secundárias são as instituições que estão em contacto direto com o sujeito, e que assim podem ajudar na articulação de medidas sociais ou no fortalecimento de alguma medida.

O assistente social é entendido como “ (…) o vértice de uma relação triangular: ele não tem o problema e não tem a solução, mas articula o problema e a solução, pois tem a vontade e a disposição para colocar-se ao serviço dos outros de acordo com o que a doutrina estipula” (Bertran e Muscolo; 2008:18).

Mesmo que uma parte populacional da intervenção de um assistente social sejam os mais necessitados, não iria deixar um filho seu seguir essa opção profissional, se essa fosse a sua vontade?

Tudo na vida faz falta. Estamos perante uma profissão desenhada para “o outro”. O que pedir mais? A sociedade existe e o assistente social interage nela, mas mais importante: interage com quem está em torno de si e necessita.

Neste sentido, o assistente social existe!