The Conjuring 2 – A Evocação (Review)

À saída do cinema depois de uma sessão de The Conjuring 2 há duas coisas a reter: a qualidade do filme e a súbita fobia a freiras, que com sorte, assombrará a audiência apenas durante o resto da noite…

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Título Original: The Conjuring 2

Ano: 2016

Realizador: James Wan

Produção: Rob Cowan, Peter Safran, James Wan

Argumento: Carey Hayes, Chad Hayes, James Wan, David Leslie Johnson

Actores: Vera Farmiga, Patrick Wilson, Madison Wolfe

Musica: Joseph Bishara

Género: Terror

Ficha Técnica Completa

Em 2013, o cinema de terror parecia mais que visto, até que James Wan voltou a atacar com The Conjuring. O realizador de Saw (2004), Silêncio Mortal (2008) e Insidious (2010) ofereceu uma experiência digna de blockbuster com uma consciência bem assente na essência do horror clássico, que marcou filmes como o Exorcista (1973) ou Poltergeist (1982). A experiência catapultou Wan para o estrelato, sendo convidado para outras produções fora do cinema de terror como Velocidade Furiosa 7 (2015) e o ainda por estrear Aquaman, apontado para 2018.

Quando se trata de um qualquer filme de sucesso, a tendência é que se torne numa espada de dois gumes: por um lado traz fama ao género que representa, por outro, apela à repetição do conceito e à exaustão de uma ideia, por vezes pela mão de realizadores secundários ou uma produção mais fraca que tenta desesperadamente agarrar-se ao sucesso de um simples nome de franquia. O estigma da sequela acaba por trazer arrepios, e The Conjuring 2 poderia ter caído na espiral de má qualidade tão característica da atribuição de um “2” ou de um “3” a títulos que marcam de forma tão profunda. Felizmente, a sequela não só espelha o original como dá um passo em frente e afirma-se como um monstro singular. E quantas vezes é possível afirmar que a sequela é melhor que o original?

O casal Warren é conhecido do mundo paranormal devido à sua carreira na área. A franquia tenta explorar os seus casos, inspirados em factos verídicos, mas claramente embelezados e fantasiados para vender uma história, que certamente teria momentos bastante desinteressantes caso seguisse à letra as ocorrências verdadeiramente documentadas. O resultado são perto de duas horas de entretenimento, que podem arreliar quem está à espera de algo demasiado fidedigno. Há certamente uma diferença entre ser “inspirado” e ser “baseado”.

The Conjuring 2 começa com a investigação dos Warren do famoso caso de Amityville, de forma a tecer uma conexão e um paralelo, que nem sempre é claro, com o seu equivalente britânico, o caso Enfield, que aparenta os mesmos contornos demoníacos. A primeira quebra de ritmo é mesmo essa, a transição da acção dos Warren em Amityville para uma história em jeito de drama familiar que demora um pouco a “arrancar”. Esta não é no entanto uma critica negativa, a franquia de The Conjuring não é sobre o terror fácil e avidamente explorado, engloba os dramas paranormais que assolam as famílias e também o relacionamento entre Ed e Lorraine Warren, que acabam por se envolver pessoalmente com as situações caricatas dos lesados na sua busca pela verdade. Este foco prejudica o filme? Não, pelo contrário! Tece toda uma base que nos permite conhecer as personagens, intercalada com um crescendo de terror que, lado a lado, se vai intensificando.

MK1_5074.dngSe a história não é suficiente, ou para o leitor é uma questão secundária, nada há a temer pois The Conjuring 2 oferece uma abordagem original ao conceito de terror, com a ajuda de uma direcção sem medo de saltar para o desconhecido. Desde o susto inesperado que abalou toda a audiência até à originalidade da utilização do desfoque no background para criar uma certa ilusão, tudo é milimetricamente calculado e muitas destas abordagens não deixarão ninguém indiferente. Podemos agradecer tudo isto ao contributo da cinematografia de Don Burgess, reconhecido pelo seu trabalho em em vários filmes, com destaque para Forrest Gump (1994). Haverá certamente sustos previsíveis, mas são os imprevisíveis que dignificam o filme, e nem Wan nem Burgess parecem brincar em serviço!

Falando ainda de cinematografia, outra particularidade é a utilização da cor, com uma tonalidade muito mais fria e não acolhedora quando comparado com o primeiro filme. Será o tom frio relacionado com um cliché associado a terras inglesas? Alguma mensagem de que o terror foi para lá do Atlântico? Há algum contraste quando comparado com cenas passadas nos EUA, e o próprio The Conjuring oferece uma palete muito mais quente. Este pormenor da cor transmite, no entanto, a mensagem pretendida, algo horrível se passa naquela casa que afasta aquela família daquilo que seria esperado de uma habitação normal. E quando o problema se prende no ponto de abrigo de uma família, a utilização de cores frias acaba por transmitir a sensação desconcertante que que não há sitio para onde fugir, aliado à natureza sobrenatural e desconhecida da ameaça que se esconde naquela casa.   

Nas interpretações é necessário focar a química entre Patrick Wilson e Vera Farmiga, Ed e Lorraine Warren respectivamente, que brilhou no primeiro filme e volta a brilhar na sequela. É uma relação altamente credível, raramente experienciada no cinema moderno, sem qualquer cena sexual, que muitas vezes faz a ponte para justificar a existência de uma relação tipicamente hollywoodesca. Wilson e Farmiga parecem feitos um para o outro, e isso é uma maravilha de experienciar no grande ecrã. As interpretações excelentes passam também para o actores secundários com destaque para o cast infantil e para a natureza camaleónica de Simon McBurney como Maurice Grosse, uma personagem verdadeiramente peculiar mas também uma espécie de comic relief  visual num filme que respira apesar de tudo a anos 70.

A música é também papel importante numa fita de terror, e embora fiquem na memória alguns apontamentos de época como The Clash com London’s Calling como parte dos trechos não representativos do filme, é de reconhecer a banda sonora minimamente genérica do já conhecido aliado de longa data de Wan, Joseph Bishara. A música tem certamente os seus momentos e os seus silêncios, mas poucas são as peças que realmente sobressaem.

The Conjuring 2 é um exemplo para o terror moderno, com desenvolvimento de personagem e planos cuidados. Uma melhoria significativa ao seu antecessor e uma experiência à parte que não requer a visualização do primeiro titulo para brilhar. É necessário rezar para que James Wan não entregue este franchise a um qualquer realizador secundário, como aconteceu com o claramente inferior spin-off Annabelle (2014), mas também com outras franquias do mesmo género que colapsaram com a insistente repetição de conceitos por mãos pouco habilidosas. Já há ideias para The Conjuring 3, resta esperar que seja tão bom como os filmes que lhe antecederam…

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Volto brevemente com mais cinema…